Movimento Sem Terra recebe apoio do Exército Zapatista

Pedro Carrano,
de Brasília (DF)

O Subcomandante Insurgente Marcos, porta-voz do Exército Zapatista de Liberação Nacional (EZLN), enviou uma saudação ao 5º Congresso do MST. Na voz de Marcos, os indígenas do sudeste mexicano se reconhecem na luta dos trabalhadores do MST, na defesa pela terra e contra os cultivos impostos pelas transnacionais.

“Aqui, nas montanhas do sudeste mexicano há gente que os quer, que os admira e que aprende com vocês; há gente que sabe que não se renderam, há quem sabe que as nossas lutas têm o mesmo destino: o de liberdade e da justiça para nossa terra”, dizem os zapatistas no documento ao MST (veja a íntegra do texto abaixo).

Em 2005, os zapatistas lançaram a idéia da chamada “Outra Campanha”, articulando no México e no mundo as forças sociais que se reconheçam contra o neoliberalismo e à esquerda (que, segundo os zapatistas, é onde bate o coração). A construção da Outra Campanha se dá à margem dos partidos institucionais. Na leitura dos zapatistas, os partidos políticos fazem o jogo da burguesia e são nada mais que marionetes de uma elite econômica mundial.

Passados dois anos do lançamento da Sexta Declaração da Selva Lacandona, documento que desencadeou a Outra Campanha, agora delegados zapatistas se espalharam por todo o México para construir a resistência com os “de baixo”, como dizem. A conjuntura mexicana, com o governo ilegítimo de Felipe Calderón, segue apontando para a repressão contra qualquer forma de organização.

Íntegra da saudação

Queremos enviar uma saudação para o Movimento Sem Terra do Brasil, vou ler uma carta do comando do Exército Zapatista de Libertação Nacional para os companheiros e companheiras do movimento sem terra, em nome do sub-comandante Marcos

Exército Zapatista de Libertação Nacional
11 de junho de 2007

Ao 5º congresso nacional do Movimento Sem terra
Brasília-DF, América Latina
Companheiros e companheiras:
Por minha voz fala a voz do Exército Zapatista de Libertação Nacional.

Em nome das mulheres, homens, crianças e idosos do Exercito Zapatista de libertação Nacional recebam todos e todas, companheiros e companheiras do MST do Brasil, nossa saudação zapatista
Sabemos que nestes dias estão celebrando o seu quinto congresso nacional nas dignas terras brasileiras e gostaríamos de ter um pequeno espaço para a nossa palavra no ouvido generoso dos seus corações.

Nós, homens e mulheres, as e os zapatistas do México, sentimos irmandade por todas aquelas organizações e pessoas que lutam pela terra, carinho por aqueles que a vêem como a Mãe e respeito por aqueles que enfrentam tudo para fazer realidade o que Emiliano Zapata disse: A terra é de quem a trabalha.

O movimento Sem terra do Brasil tem em nosso moreno coração tudo isso: tem nossa mão irmã, nosso carinho e respeito, mas também tem nossa admiração, ainda que de longe são várias as pontes pelas que sabemos de vocês, de seus sofrimentos e de seus empenhos.

A sabedoria, decisão e firmeza que mostraram nas duras jornadas de luta pela terra são para nós ensinamentos e alivio. Ensinamento porque procuramos aprender com vocês. Alivio porque ao conhecê-los sabemos que a terra tem ainda alguém que luta por defendê-la e trabalhá-la com dignidade.

Com vocês vimos e padecemos da guerra de conquista, e não nos referimos às que há quinhentos anos levaram à cabo as monarquias portuguesa e espanhola, senão as que hoje em dia executam os impérios do dinheiro, eles, os de cima nos expulsam da terra impondo seus modelos de cultivo que não são os nossos . Envenenam a terra com seus produtos transgênicos e exploram em condições de escravidão aos trabalhadores agrícolas, ao mesmo tempo, que atiram à morte do desemprego a milhões, fortalecem o latifúndio que como nos tempos coloniais humilham a terra, a quem a trabalha e a quem a vive.

Sabemos como vocês que isso não acontece apenas no Brasil e em nosso México, ao longo da grande ferida que sangra e que é nossa América Latina e em todo o mundo o capitalismo adotou a sua face mais brutal e assassina a das guerras com balas e bombas e da guerra com leis e autoridades.

Pensam eles, os do dinheiro e da soberba que nos venceram, que quinhentos anos foram suficientes para nos dobrar, para nos comprar, para nos render, e que agora seus governos de despojos e violência não vão ter nenhuma oposição, mas as suas ocupações com centenas de pessoas estão respondendo que o Brasil digno não vive na casa dos seus governantes e dos grandes proprietários, mas sim no coração dos seus camponeses e assalariados rurais que sabem que a terra, como a dignidade não se vende, não se trai nem se mata.

Não só no Brasil e no México cresce a resistência, a América Latina não só volta a despertar, como agora no seu caminhar há mais experiência, mais decisão, mais futuro.

O Movimento Sem Terra tem a admiração de muitas pessoas, grupos e organizações em todo o mundo, vocês o sabem, nós o sabemos, ninguém lhes ofereceu nada, vocês conquistaram tudo minuto a minuto desde o momento em que levantaram o olhar, o caminhar organizado para ser quem são, um dos movimentos mais brilhantes que viram nascer no seu seio as terras do continente americano.

Mas ainda que ninguém os volte a ver, ainda que todos lhes fechem as portas e ouvidos, ainda que encontrem apenas incompreensão e desprezo, têm e teriam em nosso coração moreno um ouvido atento um lugar especial no nosso olhar, uma porta sempre aberta em nosso coração, um ouvido atento e respeitoso em nosso caminhar. Uma admiração sincera em nossa voz e a compreensão que apenas se dá entre quem tem na terra uma mãe, uma história, uma luta e uma bandeira.

Disse nosso general Emiliano Zapata que a terra é de quem a trabalha. Em breve serão 100 anos desde que seu grito de terra e liberdade sacudiu os campos e cidades do México. Assim voltará a ser. E voltaremos a fazer a terra nossa, não só porque somos nós quem a trabalhamos e a podemos produzir, também porque nós cuidamos e fazemos crescer, porque ela crescendo, crescemos nós.

Soubemos que seu quinto Congresso têm como lema: reforma agrária por justiça social e soberania popular – quanta verdade há nestas palavras! Porque nenhuma nação pode se chamar verdadeiramente livre e soberana se a terra não é de quem a trabalha, e não pode haver justiça social enquanto se continue produzindo para o estrangeiro ladrão e não para o povo trabalhador,
Companheiros e companheiras:

Não sei se já o sabem, mas se já o sabem, repito: aqui, nas montanhas do sudeste mexicano há gente que os quer, que os admira e que aprende com vocês; há gente que sabe que não se renderão, há quem sabe que nossas lutas têm o mesmo destino: o da liberdade e da Justiça para nossa terra.

Saudações companheiros e companheiras,

que viva o vento de rebeldia que desde o Brasil aviva a resistência indígena no México
que viva o Movimento dos Sem Terra do Brasil

Desde a mesma América Latina em que Brasil e México reescrevem a palavra dignidade
Pelo Comitê Clandestino Revolucionário Indígena – comandância geral do Exército Zapatista de Libertação Nacional.

Subcomandante insurgente Marcus