Sua salada pode estar contaminada!

Uma análise realizada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em parceria com as secretarias estaduais de saúde indica que o tomate, o morango e o alface são os alimentos com maior índice de resíduos de agrotóxicos.

De nove produtos avaliados (alface, batata, morango, tomate, maça, banana, mamão, cenoura e laranja), o índice de amostras colhidas em 2007 e consideradas insatisfatórias ficou em 17,28%.

Os dois problemas detectados na análise das amostras foram teores de resíduos acima do permitido e o uso de agrotóxicos não autorizados para essas culturas.

Os dados são do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), coordenado pela Anvisa. As amostras foram recolhidas em pontos de venda pelas vigilâncias sanitárias de estados e municípios.

Agrotóxico na mesa

O caso que mais chamou a atenção foi o do tomate. Das 123 amostras analisadas, 55 apresentaram resultados insatisfatórios, o equivalente a 44,72%. Nessa cultura, os técnicos encontraram a substância monocrotofós, ingrediente ativo que teve o uso proibido em novembro de 2006, em razão de sua alta toxicidade.

Também foi detectada a presença de metamidofós no tomate de mesa, ainda que em teores que não ultrapassaram os limites aceitáveis para a alimentação. Esse agrotóxico é autorizado apenas para a cultura de tomate industrial (plantio rasteiro), que permite aplicação por via área, trator ou pivô central, evitando assim a possibilidade de intoxicação do trabalhador rural.

O metamidofós também foi encontrado no morango e na alface, culturas para as quais não é permitido o uso deste agrotóxico.

A batata, que em 2002, primeiro ano de monitoramento do Programa, apresentava índice de 22,2% de uso indevido de agrotóxicos, teve o nível reduzido para 1,36%. A maçã, que chegou a apresentar índice de 5,33% neste período, fechou 2007 com incidência de 2,9%.

“O aumento nos resíduos de agrotóxicos encontrados em tomate, alface e morango em 2007 pode ser correlacionável com o súbito acréscimo observado na importação de agrotóxicos por países da América do Sul, incluindo o Brasil”, segundo o documento.

Na avaliação do pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Nozomu Makshima, o aumento da contaminação do tomate, que cresceu 42% em relação a 2006, se deve ao “uso pouco criterioso” dos agrotóxicos pelos produtores. “Eles aplicam [agrotóxicos] sem muito critério. Os resíduos permanecem por causa da freqüência com que o produtor aplica, ele não obedece o período de carência”, aponta.

De acordo com Makshima, o alto índice de amostras de alface com resíduos de agrotóxicos merece atenção redobrada por se tratar de uma cultura “muito sensível” ao uso de defensivos, além do alimento ser consumido sem preparo, cru. “Normalmente o que a gente nota no caso de folhosas é contaminação por microorganismos, não por resíduos químicos”, pondera o pesquisador da Embrapa Hortaliças.

A Anvisa irá encaminhar todos os resultados ao Ministério da Agricultura, órgão responsável pela fiscalização das lavouras e ao qual cabe desencadear ações dirigidas aos produtores.

O uso da substância monocrotofós, que está proibida, foi denunciado à Polícia Federal e ao Ministério da Agricultura, para que procedam à investigação.

A Anvisa também informou que será formado um grupo de trabalho (GT) para elaboração de material educativo direcionado a produtores, distribuidores, profissionais de extensão rural e consumidores. O grupo contará com representantes do Mapa, da Associação Brasileira de Supermercados e do Ministério da Saúde.

O Para passará a acompanhar oito novas culturas a partir deste ano. Os produtos selecionados são: abacaxi, arroz, cebola, feijão, manga, pimentão, repolho e uva.
(Com informações da Agência Brasil)

Perigo omitido

Os agrotóxicos mais usados no Brasil são todos da chamada Classe I, os mais tóxicos que existem: Gramoxone, Paraquat, Mancozeb, Monocrotofos, Folidol, Malation e Decis. Os produtos à base de monocrotofós são encontráveis no Brasil sob várias denominações comerciais.

Um estudo elaborado pelos pesquisadores Dario Prires e Eloísa Caldas, da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) aponta os riscos do uso de agrotóxicos compostos com monocrotofós e metamidofós.

Entre o período de 1992 e 2002, os pesquisadores se dedicaram a analisar as notificações de intoxicações e tentativas de suicídio provocadas pelo uso de agrotóxicos na região de Dourados, no Mato Grosso do Sul.

A pesquisa aponta que foram notificadas 475 ocorrências no período, sendo 261 intoxicações (acidental ou ocupacional), 203 tentativas de suicídio e 11 eventos de causa indeterminada. O município de Dourados apresentou a maior prevalência de intoxicações, por 100 mil habitantes, considerando a população rural, e Fátima do Sul a segunda maior prevalência de suicídios na microrregião. Os eventos ocorreram principalmente entre outubro e março, e os inseticidas organofosforados monocrotofós e metamidofós foram os principais agrotóxicos envolvidos.

Para além das intoxicações pela exposição involuntária, constatou-se também o uso predominante de tais inseticidas na tentativa de suicídio, o que reflete um conhecimento real da toxicidade aguda destes compostos pela população da região. A pesquisa relata que os sintomas da intoxicação aguda incluem suor, salivação, lacrimejamento, fraqueza, tontura, dores e cólicas abdominais, seguidos de vômitos, dificuldade respiratória, colapso, tremores musculares, convulsões e morte.

Além disso, o estudo explica que tais agrotóxicos causam também efeitos neurológicos retardados após a exposição aguda e como conseqüência da exposição crônica, incluindo confusão mental e fraqueza muscular. A exposição crônica aos seus compostos pode levar ao desenvolvimento de sintomas de depressão, um fator importante nos suicídios. Num estudo levantado pelos pesquisadores com produtores de algodão mostrou que a exposição a estes produtos está associada à deficiência das funções neurológicas ligadas ao comportamento, bem como a prejuízos da capacidade de abstração verbal, atenção e memória. Verificou-se que as atividades que envolviam o uso de agrotóxicos estavam associadas ao risco de letalidades como conseqüência de desordens mentais, principalmente em mulheres.

Em Dourados, os organofosforados monocrotofós e metamidofós foram responsáveis pela maioria dos registros das intoxicações e tentativas de suicídio, representando, em média, 46 e 29,0% das ocorrências reportadas aos inseticidas, respectivamente.