Mudanças no Código Florestal e propostas da Via Campesina

O Código Florestal

Uma Oportunidade para a Agricultura Camponesa

1 – Um pouco da História

O Código Florestal Brasileiro data de 1934. Surgiu como forma de regrar a expansão da economia agrícola para as áreas de florestas estimulada pelo desenvolvimentismo do Governo Vargas. Não funcionou pois a lei não foi respeitada nem exigida.

O Código foi reformado pelo Governo Militar em 1965, também como forma de controlar minimamente o desmatamento quando o governo da ditadura montou um grande programa de colonização da Amazônia como forma de esvaziar a luta pela Reforma Agrária que surgira no início dos anos 60. Mas foi novamente letra morta. Os militares induziram duas brutais ondas de migrantes, uma do sul e outra do leste/nordeste em direção à Amazônia. Era, no dizer dos militares, levar “os homens sem terra para a terra sem homens”. Grandes rodovias foram construídas. Milhões de famílias nordestinas e sulistas adentraram a Amazônia para “colonizá-la e levar o desenvolvimento”. A exploração da madeira vai na frente, levando os pobres como mão de obra barata, muitas vezes através de projetos de colonização, vindo logo em seguida o grande capital comercializando madeira, tomando terra e criando gado. O estímulo era desmatar e não cumprir o Código, mais uma vez, “letra morta”. Nos projetos de colonização, quem desmatasse um lote, ganhava outro.

O Código veio a sofrer ainda, duas reformas significativas, uma em 1989 e a outra no ano de 2001. A reforma de 1989 foi quando o Brasil se preparava para a ECO 92 no Rio de Janeiro e a chamada “pauta ambiental” passou a ser um elemento de pressão internacional sobre o governo brasileiro. É nesta reforma de 89 que o Código tenta controlar o uso de motosserras, por exemplo. O agronegócio amplia o desmatamento na Amazônia e no Cerrado. Nova onda de expansão capitalista pisoteia sobre as florestas e sobre as normativas do Código, deixando atrás de si a ampliação da chaga ambiental.

Em 2001, através de Medida Provisória, o governo tucano de Fernando Cardoso fez a última grande reforma no Código onde o mesmo é flexibilizado para permitir a implantação de grandes obras de interesse do Capital. No que trata da preservação ambiental, esta reforma cria mecanismos facilitadores para o cumprimento dos objetivos do Código, mantendo as exigências em termos de áreas e percentuais estabelecidos em 1989 quanto às Áreas de Preservação Permanente e a Reserva Legal.

Porém, não se estabeleceu nenhuma Política Pública nem Programa de Governo para adaptação e muito menos medidas efetivas de controle do desmatamento desregrado.

O Código Florestal se impôs pela luta dos brasileiros que sempre, ao longo da história, defenderam o meio ambiente e a natureza como um bem estratégico do povo. Conseguiram fazer escrever medidas importantes na lei, mas que nunca foram levadas a sério nem pelos governos, nem pelo conjunto da sociedade. Hoje a natureza cobra a conta e o cerco aperta, de modo especial com as conseqüências já comprovadas do efeitos do aquecimento global e as freqüentes intempéries climáticas, exigindo mais do que discursos na defesa de um ambiente saudável para todos. Neste momento, em rota contrária aos sinais “do tempo” e “dos tempos”, os poderosos querem destruir a lei ambiental para continuar destruindo a natureza. Nosso desafio, e os camponeses e camponesas podem fazer isto, é produzir alimentos saudáveis e em grande quantidade, respeitando a mãe natureza.

Esta história nos leva a algumas conclusões:

– O Estado Brasileiro, ao longo dos anos, na legislação florestal, fez lei para efeito público e não para cumprir.
– A ação efetiva do Estado Brasileiro e o Movimento do Capital, andaram na linha contrária à preservação ambiental e isto continua (veja-se o PAC) e se acentuou sucessivamente em quatro grandes Etapas Históricas da expansão capitalista no Brasil, refletidas nas Reformas do Código Florestal: anos 30, com Getúlio; anos 60 com a Ditadura; anos 90 com a reorganização do Estado Brasileiro; e primeira década do século 21 com a expansão neoliberal.
– O Estado criou leis ambientais sob pressão (inclusive internacional, veja-se a Eco 92), mas não construiu condições objetivas para que fossem cumpridas ou que pudesse haver adaptação, pelo contrário, as políticas econômicas, agrícolas e energéticas continuaram induzindo e financiando a devastação.
– A legislação florestal nunca foi devidamente divulgada e o sistema educacional não a incorporou em seus conteúdos. Nem sequer as áreas afins, como as ciências agrárias e biológicas. O desconhecimento de seu conteúdo é geral.
– A corrupção campeou nesta área e o poder político local ( com seus interesses, sua voracidade e suas ligações com grandes grupos econômicos), nas áreas de expansão da devastação, sempre desprezaram a legislação, qualquer que fosse (“aqui a lei sou eu”). Os corruptores, porém, via de regra, foram e são grandes empresas transnacionais exportadoras de madeira, minérios, carne e produtos do agronegócio.

2 – Destrinchando o Código Florestal

Criou-se um verdadeiro pavor do Código Florestal, como se o mesmo fosse um “bicho papão” que vem para acabar com os pequenos agricultores e os assentados de reforma agrária e outras formas de produção camponesa. Muitos querem apresentar os pequenos agricultores e assentados como os grandes culpados pela devastação ambiental que atingiu o Brasil nos últimos 70 anos.

Temos que afirmar categoricamente: se há algo preservado, quem preservou foram os camponeses e os índios. O latifúndio e o agronegócio, agora comandados pelas transnacionais, foram e são os grandes devastadores. Este pavor, alimentado por ações policialescas e punitivas dos governos estaduais e uma interpretação conservacionista equivocada do Código Florestal, tem servido para os verdadeiros devastadores, o agronegócio e as empresas capitalistas, buscar nos camponeses novos aliados para continuar devastando. Um de seus principais objetivos é destroçar o Código Florestal no Congresso Nacional para continuar devastando sem piedade. E para isto insuflam os pobres do campo contra o Código.

Por isto que, para desfazer os mitos e as mentiras e acabar com o pavor criado nas famílias camponesas, é preciso conhecer o que o Código Florestal realmente diz e fazer uma interpretação correta do mesmo.

Precisamos conhecer algumas definições importantes que constam no Código Florestal e que são fundamentais para os Camponeses e Camponesas Brasileiros e seus Movimentos Sociais tomarem as decisões corretas neste momento em que o Agronegócio das Multinacionais e dos Latifundiários querem continuar fazendo uma agricultura e pecuária destruidora do solo, das águas, do ar, das chuvas, trazendo prejuízos enormes para todos os brasileiros.

Vejamos quais são estas definições:

1 – As Florestas e outras formas de vegetação existentes no Brasil SÃO BENS DE INTERESSE COMUM A TODOS OS HABITANTES DO PAÍS, e neles o direito de propriedade não é absoluto e tem que respeitar as leis do meio ambiente ( Art. 1º).

2 – O desrespeito ao meio ambiente é considerado USO NOCIVO (mau) DA PROPRIEDADE ( Art 1º, parágrafo 1º).

3 – Pequena propriedade rural ou posse rural familiar é aquela EXPLORADA PELA FAMÍLIA com mais de 80% da renda vinda de atividades camponesas e que tenha menos de 150 hectares na Amazônia Legal, menos de 50 hectares no Maranhão e menos de 30 hectares no restante do País. ( Art 1º, parágrafo 2º, inciso I).
É importante ressaltar que, no Código Florestal, a pequena propriedade tem um tratamento diferente.

4 – ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – APP: é a área que deve ser protegida NAS BEIRAS DE RIOS, CÓRREGOS, SANGAS, IGARAPÉS E CORRENTES DE ÁGUA; NASCENTES E OLHOS D’ÁGUA; LAGOAS, LAGOS E RESERVATÓRIOS D’ÁGUA; TOPOS DE MORRO, MONTANHAS E SERRAS; ENCOSTAS COM DECLIVE ACIMA DE 45º; RESTINGAS; BORDAS DE TABULEIROS E CHAPADAS, COM FUNÇÃO AMBIENTAL DE PRESERVAR A ÁGUA, A PAISAGEM, A BIODIVERSIDADE, A FAUNA (animais), A FLORA (plantas), PROTEGER O SOLO E ASSEGURAR O BEM ESTAR DAS PESSOAS (Art. 1º, parágrafo 2º, inciso II).

As dimensões da APP são as seguintes:
– de 30 (trinta) metros para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;
– de 50 (cinquenta) metros para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;
– de 100 (cem) metros para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;
– de 200 (duzentos) metros para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;
– de 500 (quinhentos) metros para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;
– um raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura nas nascentes e nos chamados “olhos d’água”.
– em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo ( Art 2º).
5 – RESERVA LEGAL – RL: é a área no INTERIOR DE UMA PROPRIEDADE OU POSSE RURAL, NECESSÁRIA AO USO SUSTENTÁVEL DO RECURSOS NATURAIS, À CONERVAÇÃO E REABILITAÇÃO DA NATUREZA (processos ecológicos), CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE E ABRIGO PARA PLANTAS E ANIMAIS NATIVOS ( Art 1º, parágrafo 2º, inciso III).

As dimensões da Reserva Legal são as seguintes:

– 80 % em áreas de floresta na Amazônia Legal;

– 35% nas áreas do cerrado da Amazônia Legal, sendo 20% na propriedade ou posse e 15% podem ser compensados e outra área desde que na mesma microbacia;

– 20% em outras regiões do país, seja de floresta ou campos. (Art 16º, incisos I,II,III e IV).

6 – ATIVIDADES DE INTERESSE SOCIAL: podem ser consideradas atividades de interesse social, para fins de cumprimento do Código Florestal, entre outras, as seguintes atividades:

– Atividades necessárias à proteção da vegetação nativa, tais como: prevenção e combate ao fogo, controle da erosão, proteção de plantio com espécies nativas reconhecidas pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA).

– Atividades de MANEJO AGROFLORESTAL SUSTENTÁVEL PRATICADOS NA PEQUENA PROPRIEDADE OU POSSE RURAL FAMILIAR, desde que não descaracterizem a cobertura vegetal e não prejudiquem a função ambiental da propriedade;

– Planos, obras e projetos definidos em resoluções do CONAMA.

3 – As Áreas de Preservação Permanente e as Áreas de Reserva Legal são Áreas de Uso

Tanto a Área de Proteção Permanente como a Reserva Legal são ÁREAS DE USO e não de PURO CONSERVACIONISMO sem nenhuma utilização no sustento da família camponesa. Este é o primeiro equívoco que tem que ser desfeito e que tanto mal tem causado às famílias agricultoras.

Há uma diferença profunda entre Unidades de Conservação, tanto Públicas como Privadas, que tem o objetivo de preservar a Fauna, a Flora e outras formas de vida de uma determinada região e que são intocáveis. Nelas, a não ser em casos muito especiais, não podem se desenvolver projetos econômico-produtivos.

Não é este o caso das APPs e das RLs. Estas são áreas de uso, nas quais o componente Florestal e a preservação devem ser preponderantes. Mas não são áreas que o agricultor não possa usar para nada. Pode e deve.

Para que isto aconteça é preciso vencer dois obstáculos:

1º – Regulamentar corretamente o Código para que a família agricultora possa trabalhar com tranqüilidade e desenvolver atividades produtivas preservadoras do Meio Ambiente nas Áreas de Preservação e nas Reservas Legais, acabando com o terrorismo que as Polícias Ambientais e o Ministério Público de algumas regiões tem feito equivocadamente. E justamente porque, em muitos casos, as exigências do MP, dos Órgãos Ambientais e da Polícia Ambiental são irracionais em relação à cultura camponesa e em desconformidade com a letra e o espírito do Código, a causa ambiental e o próprio código acabam sendo rejeitados pelos principais sujeitos e protagonistas da preservação que são os pequenos agricultores. Isto precisa acabar imediatamente sob o risco de transformar esta repressão equivocada em efeito bumerangue. Além de regulamentar corretamente é preciso preparar os agentes dos órgãos fiscalizadores, pois o despreparo e o desconhecimento de elementos basilares das práticas agrícolas e pecuárias e da cultura camponesa também são enormes e causam grandes prejuízos.

O Código Florestal não pode ser lido e interpretado com o rigorismo que não se tem em relação aos descalabros ambientais dos grandes centros urbanos, que aprendeu a suportar e conviver com cidades ambientalmente insustentáveis, mas quer impor a uma família de pequenos agricultores exigências impossíveis, desnecessárias, irracionais e não constantes no Código Florestal, colocando sobre ele uma repressão policial implacável, fazendo de um ambientalista nato (a família camponesa), um inimigo das políticas ambientais. Isto tem que acabar para o bem da causa que é de todos.

2º – As diversas organizações políticas, sociais e econômicas dos camponeses brasileiros precisam se convencer de vez que o cuidado com o meio ambiente faz bem para todos, melhora a produção, melhora o regime de chuvas, diminui o impacto das pragas, garante volumes mais regulares de produção, traz novas fontes de renda e de auto-sustento nas áreas de preservação ambiental.

Promover e lutar por políticas públicas que promovam uma agricultura com áreas de uso múltiplo, que cumpram funções ambientais, seqüestrem carbono, protejam as águas e o solo e ao mesmo tempo produzam alimentos e outros bens de uso e finalidades econômicas é uma pauta bem mais interessante e inteligente do que ser linha auxiliar de um projeto de agricultura que destrói e devasta. Além do mais, esta proposta de agricultura aponta novas possibilidades de viabilidade social e econômica das produção agropecuária de pequena escala e coloca a agricultura camponesa familiar na rota do futuro e não no caminho do atraso.

Neste sentido, é necessário que as Organizações do Campo travem um debate profundo sobre a questão ambiental, os modelos de agricultura e o papel das florestas na produção e na qualidade de vida no campo e as disputas que se estabelecem em torno do Código Florestal, seja inseridos neste contexto. Não podemos debitar ao Código uma conta que não é dele. Os camponeses precisam melhorar as práticas produtivas, o Estado precisa regular melhor o Código e os Órgãos Ambientais precisam atuar preventiva e educativamente buscando com o tempo necessário as devidas adaptações.

A repressão, a polícia, os órgãos ambientais e judiciários devem centrar suas ações sobre os grandes devastadores, que certamente terão muito a fazer e com bem melhores resultados para a preservação ambiental.

O Código Florestal é sensato, pode ser cumprido e algumas questões que são dúbias podem ser resolvidas através de resoluções no âmbito do CONAMA e dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente e no âmbito dos Ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário, aplicando corretamente o que já está definido no Código e ajudando ao Brasil todo fazer uma Agricultura realmente sustentável.

Cito, a título de exemplo que pode ser sensatamente ampliado, a Resolução 369/2006, art 11, do CONAMA estabelecendo várias possibilidades de Usos Produtivos em Áreas de Preservação Permanente, que podem ser desenvolvidas junto com a preservação Florestal:

Definições do Conselho Nacional de Meio Ambiente – Conama, sobre a retirada de vegetação em Áreas de Preservação Permanente, quando o impacto ambiental é baixo.

Art. 11. Considera-se intervenção ou supressão de vegetação, eventual e de baixo impacto ambiental, em APP:

I – abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões, quando necessárias à travessia de um curso de água, ou à retirada de produtos oriundos das atividades de manejo agroflorestal sustentável praticado na pequena propriedade ou posse rural familiar;
II – implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da água, quando couber;
III – implantação de corredor de acesso de pessoas e animais para obtenção de água;
IV – implantação de trilhas para desenvolvimento de ecoturismo;
V – construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro;
VI – construção de moradia de agricultores familiares, remanescentes de comunidades quilombolas e outras populações extrativistas e tradicionais em áreas rurais da região amazônica ou do Pantanal, onde o abastecimento de água se de pelo esforço próprio dos moradores;
VII – construção e manutenção de cercas de divisa de propriedades;
VIII – pesquisa científica, desde que não interfira com as condições ecológicas da área, nem enseje qualquer tipo de exploração econômica direta, respeitados outros requisitos previstos na legislação aplicável;
IX – coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e produção de mudas, como sementes, castanhas e frutos, desde que eventual e respeitada a legislação específica a respeito do acesso a recursos genéticos;
X – plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e outros produtos vegetais em áreas alteradas, plantados junto ou de modo misto;
XI – outras ações ou atividades similares, reconhecidas como eventual e de baixo impacto ambiental pelo conselho estadual de meio ambiente.

Determinações semelhantes podem ser construídas, à várias bons e com intensos debates, contribuições e estudos para Reservas Legais e mesmo para as APP.

Também já há suficiente acúmulo científico, técnico e prático ( no Estado Brasileiro, principalmente no MDA, no MMA, na Embrapa e no Sistema Brasileiro de Ater e de Pesquisa Agropecuária e Florestal) para estabelecer formas de Manejo Florestal Sustentável, Manejo Agroflorestal Sustentável e Atividades reconhecidas de Interesse Social que possam estabelecer regras e parâmetros para produzir em escala, qualidade e quantidade necessários e CUMPRIR O CÓDIGO FLORESTAL, com o devido tempo de adequação e adaptação para as áreas que já foram devastadas no passado, não raro, com estímulo de políticas de Estado.

O que precisa são Políticas do Estado forte e dinâmicas para induzir estas práticas.

Para as Áreas de Reserva Legal basta ficar mais claras quais são as atividades previstas no Código, no Artigo 16º, parágrafos 2º e 3º, que dizem:

§ 2o – A vegetação da reserva legal não pode ser suprimida, podendo apenas ser utilizada sob regime de manejo florestal sustentável, de acordo com princípios e critérios técnicos e científicos estabelecidos no regulamento, ressalvadas as hipóteses previstas no § 3o deste artigo, sem prejuízo das demais legislações específicas.

§ 3o – Para cumprimento da manutenção ou compensação da área de reserva legal em pequena propriedade ou posse rural familiar, podem ser computados os plantios de árvores frutíferas ornamentais ou industriais, compostos por espécies exóticas, cultivadas em sistema intercalar ou em consórcio com espécies nativas.

E no Artigo 1º, parágrafo, inciso V, letra b, que define as atividades de interesse social:
V – interesse social:
b) as atividades de manejo agroflorestal sustentável praticadas na pequena propriedade ou posse rural familiar, que não descaracterizem a cobertura vegetal e não prejudiquem a função ambiental da área;

Fica claro que o agricultor PODE fazer:

a) Manejo Agroflorestal sustentável, quando for reconhecido de Interesse social, que, via de regra, o é;
b) Manejo Florestal sustentável, isto é, ele pode tirar madeira desde que não SUPRIMA, isto é, tire toda, devaste a área toda. Manejo florestal sustentável também é usar árvores para produzir comida e renda, como frutas, chás, lenha, madeira, óleos, energia, todas as formas de extrativismo;
c) Plantios de árvores frutíferas, ornamentais e industriais, inclusive exóticas, cultivadas de maneira intercalar (combinando cultivos diferentes) ou em sistemas de consórcio com espécies nativas. O Código é quase flexível demais, mas fica claro que a família agricultora pode fazer agroflorestas para extrair renda de forma inteligente e dinâmica e cumprir o Código Florestal;
d) Desenvolver Regimes de Uso das áreas de preservação que combinem plantios perenes com anuais, utilização sustentável de madeira para diversos usos, extrativismo, produção de frutos e óleos, energia e outras que possam combinar produção e preservação.

Precisa também o Estado Brasileiro, através dos Governos e do Judiciário, antes de exigir dos agricultores, cumprir as suas tarefas, ainda não cumpridas ou só cumpridas em parte, que Constam do Código, entre elas, as definições quanto:
I – o plano de bacia hidrográfica;
II – o plano diretor municipal;
III – o zoneamento ecológico-econômico;
IV – outras categorias de zoneamento ambiental

Além do mais, o Governo não precisa mudar o Código, caso precise adaptar algumas situações difíceis, pois já tem autoridade delegada para tanto, como por exemplo, mediar situações difíceis para os camponeses da Amazônia. O Governo pode reduzir a reserva legal caso situações especiais o exijam sem mudar o Código:
O Poder Executivo, se for indicado pelo Zoneamento Ecológico Econômico – ZEE e pelo Zoneamento Agrícola, ouvidos o CONAMA, o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério da Agricultura e do Abastecimento, poderá:
I – reduzir, para fins de recomposição, a reserva legal, na Amazônia Legal, para até cinqüenta por cento da propriedade, excluídas, em qualquer caso, as Áreas de Preservação Permanente, os ecótonos, os sítios e ecossistemas especialmente protegidos, os locais de expressiva biodiversidade e os corredores ecológicos; e
Ainda, em muitos casos, as Áreas de Preservação Permanente podem contar também para Reserva Legal:
Será admitido, pelo órgão ambiental competente, o cômputo das áreas relativas à vegetação nativa existente em área de preservação permanente no cálculo do percentual de reserva legal, desde que não implique em conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo (…..).

4 – Propostas para implementar uma Política Ambiental e Florestal Adequando para o Campo Brasileiro:

1 – Manter o Código Florestal e cumpri-lo de forma a implementar uma agricultura camponesa sustentável, reconhecendo a importâncias das florestas para alcançar este objetivo;

2 – Interromper a devastação florestal imediatamente e criar condições e prazos compatíveis para a adequação e regularização dos que estão em desconformidade com o Código, pois a maioria foi induzida a esta desconformidade por políticas do próprio Estado;

3 – Programa amplo com recursos não retornáveis para florestar e reflorestar; constituir agroflorestas, sistemas agroflorestais e agrosilvipastoris implantando em todo o Brasil uma agricultura que preserve o meio ambiente;

4 – Recursos não retornáveis para acompanhamento técnico e assistência técnica nas comunidades camponesas e para coleta de sementes e construções de viveiros de mudas em todo o território nacional;

5 – Implantação imediata de um Programa de Pagamento por Serviços Ambientais no campo para os que preservarem matas, solo, agroflorestas, fontes e nascentes, rios, encostas, mangues, restingas e todo e qualquer serviço ambiental relevante no campo, com pagamento mensal e permanente em valores de R$ 150,00 a R$ 400,00 por família (corrigidos anualmente pela correção do Salário Mínimo) de acordo com a situação de renda e da área ambiental protegida.

6 – Criação de um Fundo Nacional de Adaptação às Mudanças Climáticas com imposto sobre grandes fortunas, indústrias poluentes e eletrointensivas, empresas acumuladoras de lixo, sobre produção e consumo de produtos petrolíferos e carboníferos, sobre a indústria do cimento, empresas do agronegócio, etc. Este fundo financiaria o pagamento por serviços ambientais e os custos da adequação da agricultura às exigências ambientais.

7 – Implementação de um amplo Programa de Educação Ambiental, tanto nas escolas como nas comunidades camponesas, em parceria com os sistemas educacionais e Moimentos Sociais, e campanha pública de informação através dos Meios de Comunicação, visando informar e formar a população sobre a questão ambiental e as conseqüências da devastação e as vantagens da preservação.

Frei Sérgio Antônio Görgen

Março de 2009