Governadores loteiam terras para o capital internacional

Por Edelcio Vigna Mestre em Ciência Política pela Universidade de Brasília e assessor do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) O Comitê do Partido Comunista da China está estimulando, desde 2003, as empresas a comprar terrenos agrícolas e florestais na América latina e na África para produzir soja, arroz, milho, banana e óleos vegetais. A produção será para suprir a demanda dos mercados internos e internacional, além da função estratégica de não ficar submetida aos interesses dos grandes tradings, como a Cargil, ADM, Bunge e Luis Dreyfus.

Por Edelcio Vigna
Mestre em Ciência Política pela Universidade de Brasília e
assessor do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)

O Comitê do Partido Comunista da China está estimulando, desde 2003, as empresas a comprar terrenos agrícolas e florestais na América latina e na África para produzir soja, arroz, milho, banana e óleos vegetais.

A produção será para suprir a demanda dos mercados internos e internacional, além da função estratégica de não ficar submetida aos interesses dos grandes tradings, como a Cargil, ADM, Bunge e Luis Dreyfus.

Esta estratégia está sendo seguida por diversos países como a Coréia, Japão, Indonésia, Arábia Saudita, entre outros. É uma ação dos governos-empresas que vampirisa os recursos naturais e humanos dos países em desenvolvimento, em favor das economias desenvolvidas ou emergentes, como a China.

O interesse em comprar terras no Brasil acelerou depois que a Câmara dos Deputados aprovou, e encaminhou ao Senado Federal, um projeto de lei que limita a 1.1400 hectares o tamanho dos imóveis rurais que podem ser comprados por estrangeiros.

As empresas pretendem fechar os negócios antes de o projeto ser sancionado. A Constituição Federal não trata especificamente da compra de terras por estrangeiros, mas o art. 188 especifica que:

– “A destinação de terras públicas e devolutas será compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária. Parágrafo 1º – A alienação ou a concessão, a qualquer título, de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares a pessoa física ou jurídica, ainda que por interposta pessoa, dependerá de prévia aprovação do Congresso Nacional”.

Os chineses estão negociando com os governos estaduais do Amazonas, Acre, Rondônia, Roraima, Mato Grosso, Para, Amapá, Maranhão, Tocantins e Bahia. Para serem mais atrativos os projetos são acompanhados de promessas de instalação de hospitais, escolas e doações aos governos locais. Como escreveu Assis Moreira, do Valor Econômico 1 (no artigo “Chineses querem mais terras no Brasil”, 27 de abril de 2010.) “é o novo colonialismo”.

A Coréia, que possui 0,6% das terras agriculturáveis existentes no Brasil, declarou que pretende comprar terras no Maranhão, Tocantins e Bahia. O grupo Hyundai, desde 2009, está desenvolvendo projetos na Rússia, onde comprou 10 mil hectares para plantar soja e milho.

O governo chinês está em estado de alerta desde a crise alimentar internacional. A alta nos preços das commodities fez com que o preço dos cereais subisse 25% no mercado chinês, desde o início deste ano.

Os governadores estaduais visados pelo capital estrangeiro estão entusiasmados. Não os importa a exploração exaustiva e a exportação virtual dos recursos naturais não-renováveis e da força de trabalho nacional. A estatal chinesa Chongquing Grain Group, por exemplo, pretende investir cerca de R$ 525 milhões, na compra de 100 mil hectares no oeste da Bahia, até julho de 2010. Em uma segunda etapa a pretensão é comprar 200 mil hectares e investir R$ 1,5 bilhão (informações do Estadão Online, 22/04/10 e do artigo “Estatal da China anuncia compra de terras para produzir soja em Tocantins”).

No artigo “Chineses querem mais terras no Brasil”, Assis Moreira relembra que “um grande empresário egípcio, produtor de arroz, chegou ao Brasil querendo investir na agricultura. Foi ao Rio Grande do Sul e a reposta que recebeu foi de que havia arroz para vender, mas não terras”. Quem sabe essa postura do governo gaúcho não poderia ser acompanhada por outros governos que estão se mostrando tão subservientes ao capital internacional.

Os governadores estão promovendo reuniões de empresários locais com os negociantes estrangeiros. Alguns planejam levar seus empresários até a China. Esta visão empresarial de curto prazo é uma ameaça à soberania nacional. Esses governadores estão loteando o território brasileiro e colocando à disposição de outras nacionalidades a força e os recursos naturais, que são riquezas futuras da nação.

Alguns argumentam que as terras que estão sendo negociadas são propriedade privadas e não terras estaduais. Esquecem que a ordem econômica é fundada em diversos princípios e, entre eles, a soberania nacional e a função social da propriedade. A terra cumpre uma função social e, se não forem cumpridos os requisitos, os imóveis podem ser desapropriados. É fundamental que os negociantes internacionais se inteirassem deste artigo, e outros, da Constituição Federal.

Se os cidadãos e cidadãs não demonstrarem sua indignação diante dos gestos insanos dos seus representantes, as negociações das terras brasileiras irão continuar favorecendo o negociante local e o capital internacional. O argumento de que os investimentos promoverão a mão de obra local e estimularão o desenvolvimento está desacreditado há muito tempo. As regiões onde o capital internacional entrou ficaram, depois da exploração à exaustão, mais empobrecidos do que antes. A Bolívia, por exemplo, é um triste exemplo do “estímulo” do capital internacional.