Jovens debatem a chacina do Capital contra a juventude

Da Comunicação Via Campesina


Chegar à beira do gol e na hora de chutar o jogo termina, dói. Quando um camponês semeia a terra e é expulso, não consegue colher os frutos; dói muito. Quando um estudante é impedido de continuar seus estudos, dói mais ainda. Agora talvez o que mais provoque dor é a condição de saber que a juventude não vai completar seu ciclo de vida. 

Da Comunicação Via Campesina


Chegar à beira do gol e na hora de chutar o jogo termina, dói. Quando um camponês semeia a terra e é expulso, não consegue colher os frutos; dói muito. Quando um estudante é impedido de continuar seus estudos, dói mais ainda. Agora talvez o que mais provoque dor é a condição de saber que a juventude não vai completar seu ciclo de vida. 

O capital cada vez mais gradativamente vem causando um extermínio do jovem no mundo, seja diretamente pela opressão militar, ou pela exclusão dos jovens a direitos básicos, como saúde e educação. Em cada região essas ações brutais se manifestam de formas diferentes, mas duramente com uma única consequência: nossos jovens estão sendo impedidos de crescer e de viver.

Cristian, Michael, Miguel, Jean, Francisca, Paula, nomes diferentes, países, sonhos, idades e idiomas diferentes, mas com a mesma sina, todos e todas foram jovens mortos repentinamente, uns por lutar pelo direito a terra e educação, já outros por não terem acesso a um hospital, ou mesmo comida. 

Todos foram jovens vitimados pela exclusão e repressão em seus países. De fato se existe algo que o capital vem globalizando é o extermínio da juventude. E este ocorre tanto no campo, quanto na cidade.

Mas por que os jovens?

A lógica de quanto mais novo é mais inofensivo se mostra não funcional para a juventude. Os valores da rebeldia e da mudança fazem da juventude o motor das lutas contra a injustiça social, é o que afirma o Argentino Juan Moyano, militante do Movimento Nacional Campesino Indígena (MNCI). “O momento vivido pelos jovens é de muita força, física e mental, por isso não temos como ficar calados contra as injustiças que o capital promove contra nosso povo”, afirmou.

Moyano nos relata sobre o caso de Cristian Ferreira, jovem camponês que foi brutalmente assassinado por lutar pelo direito a terra na Argentina. 

“Cristian defendia seu povo, era um grande agitador, e foi brutalmente assassinado no dia 16 de novembro, três anos atrás, a mando de um empresário de Santa Fé chamado Ciccioli. Assassinado a sangue frio, ele foi morto por resistir a expulsão de suas terras, junto com outras famílias camponesas. Muitos empresários tentaram, e ainda tentam, expulsar as famílias com o uso da força, mas Cristian resistiu até o último minuto e defendeu nosso território com a sua vida. Onze meses depois assassinaram outro jovem, Miguel Galvan. Esses assassinatos vem se somando a outros episódios contra a juventude argentina, mas não vamos parar. Se eles acharam que a morte de Cristian nos enfraqueceria, estavam errados. Agora temos a obrigação de seguir lutando”, ressaltou Juan.

Após três anos, o assassinato de Cristian irá a julgamento. De acordo Juan, não é possível saber se acontecerá de fato justiça, apesar de que serão julgados os dois assassinos de Cristian e o mandante do crime. “Sabemos como a justiça favorece os mais ricos, mas será pela primeira vez na história da Argentina que um fazendeiro irá para o banco dos réus por assassinar um camponês”, ressaltou.

A trajetória de luta do Jovem Cristian e de tantos outros passa na região de Santiago del Estero, onde vivem cerca de 63 mil famílias camponesas e indígenas que se encontram ameaçadas em um território de mais de 9 milhões de hectares, que incansavelmente tenta ser arrematado por empresários e corporações.

Ferguson e o extermínio da Juventude nos EUA

Quando se fala de extermínio da juventude pelo capital não é possível deixarmos de lado o que ocorre no país que o centraliza, os Estados Unidos. O povo norte-americano está sujeito igualmente a injustiças das políticas culturais e econômicas opressivas de uma das nações mais racistas do mundo. 

“De todas as formas a mídia tenta mostrar que o capitalismo dá certo, que ele é bom, justo e funcional. Agora me digam, que sistema considerado bom provoca o extermínio da juventude? A morte do Michael Brown é mais uma afirmação de que esse sistema não funciona para o povo” afirmou Carey Jenkins, o popular ” CJ”, que junto com diversos jovens norte-americanos se mudaram para a cidade de Fergunson depois do assassinato do jovem Michael Brown por um policial. A mudança de cidade foi para contribuir na organização popular que emergiu depois desse assassinato.

CJ explica que nunca tinha visto a juventude reagir como ele viu em Ferguson. “Eu nunca presenciei um levante tão forte da juventude, eles estão lutando, reagindo, querem justiça, estão fazendo uma coisa que nunca fizeram. Não tenho dúvida que somos perigosos para o sistema, porque estamos mostrando que ele não funciona, e principalmente porque não temos medo igual aos mais vividos, agente vai lá e faz” relatou.

Carey explica que esse caso não é isolado. No entanto, o levante da juventude é especial. “Nós estamos recuperando uma luta que foi duramente combatida nos EUA, os Panteras Negras, os militantes dos Direitos Civis foram duramente massacrados, perseguidos e mortos, isso impediu um avanço constante na luta, era como cortar um caminho, agora estamos recuperando essa luta”, comentou.

Em sua fala, CJ impactou ao dizer que “a juventude é ativa, não tem medo e se for para morrer de tiro então que se morra lutando”.

Michel Brown era um jovem negro de 18 anos que em agosto foi baleado com dois tiros na cabeça pelo policial branco Darren Wilson, na cidade de Ferguson, em Saint Louis – Missouri, no meio-oeste do Estados Unidos. 

A justiça decidiu não indiciar o policial porque considerou não existir provas suficiente para processá-lo por assassinato. O policial segue em liberdade e recebendo seu salário desde o fato, que desencadeou uma das maiores ondas de protestos raciais das últimas décadas nos EUA. 

Nos faltam 43 companheiros 

Quando jovens saem de ônibus, sejam para estudar, protestar, ou passear, nunca imaginam que não voltem para seus lares. Infelizmente não foi isso que aconteceu com os 43 jovens da escola rural Raul Isidro Burgos de Ayotzinapa, uma cidade que fica cerca de 125 km de Iguala, no México. 

Os jovens que planejavam ser professores viajaram no dia 26 de setembro para realizar atividades de arrecadação de fundos para sua escola, e depois disso nunca mais foram vistos, pois não voltaram.

O fato que até recentemente era afirmado como “desaparecimento” teve seu desfecho, quando se confirmou o que o povo duramente sabia, apesar de não querer acreditar: todos os jovens foram torturados e assassinados.

As provas indicam que os estudantes foram assassinados por integrantes de um cartel da região a mando do ex-prefeito de Iguala, para evitar protestos da juventude em comícios de Maria de los Ángeles, esposa do ex-prefeito.

O fato desencadeou diversas mobilizações populares em todo o México, professores e estudantes iniciaram greves gerais. O povo protesta conta a morosidade da investigação do caso, as ações se espalharam por todo o país, principalmente na região de Guerrero, em Chilpancingo.

A chacina em Iguala não cumpriu o objetivo de seus mandantes. Pelo contrário, provocou um levante popular do povo e da juventude em todo o país.

Jovens camponeses na luta pela terra no Paraguai

“O assassinato de um jovem já começa quando são negados seus direitos mais básicos, como saúde, educação e direito a terra” afirmou Angelina Barrento, militante da Coordenação Nacional de Organizações de Mulheres Trabalhadoras Rurais e Indígenas (CONAMURI). 

Angelina relata o caso de Curuguaty, onde camponeses, maioria jovens, foram duramente assassinados por lutarem pela terra. 

“O massacre de Curuguaty aconteceu em julho de 2012, morreram 17 pessoas, sendo 11 camponeses e 6 policiais. Nosso povo estava ocupando uma terra devoluta, que é do Estado, então é do povo. O problema é que o governo insiste em repassar as terras devolutas para as grandes empresas e latifundiários. Em Curuguaty fomos pegar o que era nosso. Se o governo cumprisse com sua função e distribuísse as terras aos camponeses, não haveria massacre, não haveria mortos, não haveria jovens assassinados” ressaltou.

A militante reforçou que agora a luta é por justiça. “Não vamos parar de lutar pela terra, mas agora também queremos e exigimos justiça aos nossos mortos, ficamos muito revoltados a saber que o julgamento foi adiado para 2015, é muito tempo para esperar pela justiça”. Segundo Angelina, a responsabilidade do massacre pela juventude é do Estado e do modelo capitalista. “Se existisse reforma agrária em Curuguaty não teríamos mortos. Se existe educação, saúde, liberdade para todos, não haveria nenhum jovem morto” concluiu.


No Brasil

Em todos os casos, a impunidade é uma característica marcante. A morosidade do Estado em fazer prevalecer a justiça pelos direitos dos povos é gritante. E a forma opressora com que o capital suga essa juventude e depois as descarta ameaça um futuro com valores de solidariedade e unidade para a sociedade camponesa e urbana. 

No Brasil os dados não são diferentes, em um ano, cerca de 30 mil jovens morrem vítimas de homicídios e esse número cresce acompanhado pela injustiça e a desigualdade. Na cidade, a criminalização e genocídio da juventude pobre, negra e de periferia. No campo, o êxodo rural junto ao avanço do agronegócio e a ausência de políticas públicas, expulsa para os rincões das cidades a juventude camponesa que se vê obrigada a entrar nesse modelo de disputa do sistema para sobreviver. 

“Não queria acreditar que chegamos a essa situação no Brasil, esse modelo injusto e desigual está nos impedindo de viver. É triste ver a disputa que esse modelo coloca para nós jovens. Temos que disputar uma vaga na escola, na universidade, no hospital, nos espaços culturais (…) Essa disputa por espaços que devem ser garantidos como direitos básicos, está nos matando”, ressaltou Genques Borcate, jovem camponês do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).

Para Genques a juventude também é assassinada pelas falta de perspectivas. “Se não morre pela bala, pela fome, o jovem morre as poucos pela falta de oportunidades, sem direito a escola, ao trabalho e ao lazer. Assim vai sendo criada uma geração robô, que eles chamam de massa de manobra. Querem nos apertar, sugar nossa energia e nos jogar em qualquer canto, mas ai vem uma coisa que só a juventude tem e talvez só ela entenda. Quanto mais nos atacam, nos agridem, mais nos deixam com vontade de lutar pela transformação, pela construção de um mundo melhor”, afirmou.