Ajuste fiscal e Congresso conservador recolocam luta de classes na pauta do 1º de maio

Dia do Trabalhador terá como debates centrais as terceirizações, as alterações em benefícios sociais e a taxação das grandes fortunas. Para o ex-ministro Bresser Pereira, os “empresários partiram para a luta de classes”.

centrais_1demaio.jpg

Por Bruno Pavan
Do Brasil de Fato

Este dia 1º de maio será de mais discussões por conta das atitudes da equipe econômica do segundo governo Dilma Rousseff. Por conta do baixo crescimento do PIB (Produto Interno Bruto, que é a soma das riquezas produzidas pelo país) em 2014 e a previsão de recessão para 2015, um profundo e polêmico ajuste fiscal está sendo gerido desde os últimos dias do ano passado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

As medidas provisórias 664 e 665, que alteram o recebimento de benefícios como seguro desemprego e abono salarial, já estão prestes a serem aprovadas na Câmara dos Deputados. Caso isso se confirme, o trabalhador só terá direito ao seguro desemprego se estiver trabalhando por 18 meses ininterruptos na empresa. Já para receber o abono salarial, terá que trabalhar por seis meses e receberá proporcionalmente ao tempo trabalhado.

Daniel Feldmann, doutor em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explica que as medidas são concentradoras de renda e que não dão certeza de que o país superará a crise econômica sem mais sacrifícios.

“Pode-se com isso agradar no curto prazo as agências de risco e detentores de riqueza financeira. Mas de forma alguma se sustenta a alegação do ministro de que tais medidas vão recuperar os investimentos na produção e o crescimento econômico. O contrário: me parece muito mais próximo da verdade e qualquer nova turbulência externa há de escancarar a realidade de que cortar um dedo hoje não nos exime de ter de cortar um braço amanhã”, criticou.

A saída na taxação das grandes fortunas

Logo que as medidas provisórias foram propostas pelo governo, as centrais sindicais e movimentos sociais reagiram e chegaram a levar mais de 40 mil pessoas às ruas da cidade de São Paulo. Eles cobravam uma saída diferente da crise e que não onerasse tanto os trabalhadores, atingindo os mais ricos.

Antiga demanda de setores progressistas da sociedade, a taxação de grandes fortunas, que é o único tributo que está presente na Constituição de 1988 e ainda não foi regulamentado, voltou ao debate. De acordo com o ex-secretário de finanças da prefeitura de Luiza Erundina em São Paulo, Amir Khair, em entrevista à revista “Carta Capital”, a taxação de 1% das fortunas acima de R$ 1 milhão daria uma arrecadação de R$ 100 bilhões ao país. O governo estima que a economia com os cortes nos benefícios trabalhistas vai chegar R$ 18 bilhões.

Feldmann reforça que a estrutura tributária brasileira tende a reforçar ainda mais a concentração de renda e riqueza no país. Para ele, é nesse contexto que mora a importância da taxação das grandes fortunas. “Nos anos 1960, enquanto nos EUA a alíquota de imposto de renda dos extremamente ricos chegava a 80%, o Brasil realizava uma reforma tributária que dava um peso excessivo para impostos indiretos, que na prática penalizam os mais pobres que tem que pagar o mesmo imposto que um milionário ao comprar um saco de arroz”.

PL 4330: um retrocesso social

De acordo com pesquisa do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), 190 dos 513 deputados eleitos em outubro fazem parte da bancada dos empresários. Junte-se a isso a conclusão do departamento de que o Congresso eleito em 2014 é o mais conservador desde 1964. Por conta desse cenário, diversos ataques às pautas de esquerda já estão em andamento. Entre os exemplos, o projeto de lei 171, que diminui a maioridade penal de 18 para 16 anos; e o 4.330, conhecido como PL da Terceirização, que visa aumentar a flexibilidade das empresas para contratações e as libera para terceirizar suas “atividades-fins”.

A proposta foi aprovada na Câmara dos Deputados e agora depende da análise do Senado. Centrais sindicais e movimentos sociais já estão fazendo pressão para que o projeto de lei não avance. Na última terça-feira (28), o ex-presidente Lula falou em discurso que a presidenta Dilma “tranquilamente” vai vetar a proposta.

Para o ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, a proposta é um retrocesso social e que os empresários industriais resolveram “partir para a luta de classes” para garantir sua competitividade frente a um câmbio super-valorizado.

“Esse projeto de flexibilização das leis trabalhistas em conjunto com o ajuste fiscal pode levar ao que se chamam de depreciação interna. Essa medida aponta para a mexicanização do Brasil. O México, depois de fazer o acordo com os Estados Unidos, passou por um processo de redução brutal dos salários, que já são compatíveis com os da China. Eu encontrei um economista mexicano que disse que o salário médio de um mexicano na indústria automobilística é quatro vezes menor que a do Brasil. O que o Congresso está querendo é que caminhemos nessa direção. Agora será que os brasileiros vão concordar com isso? Eu tenho minhas dúvidas, e espero que não”, finalizou.