Relatório da MP 759 será votado nesta quarta-feira

Medida provisória dispõe sobre regularização fundiária urbana e rural e é objeto de crítica de movimentos campesinos e parlamentares de oposição.

O relator da Comissão que trata da MP 759, o senador Romero Jucá (PMDB), é importante apoio ao governo Temer. Foto Agência Senado.jpg
Romero Jucá (PMDB), relator da Comissão Mista que debate a MP 759. Foto: Agência Senado

 

Por Lizely Borges
Da Página do MST

 

O relatório da Comissão Mista da Medida Provisória (MP) 759/2016 será votado pelo colegiado composto por deputados e senadores na tarde desta quarta-feira (03), em Brasília. Editada no final de 2016 e de interesse da bancada ruralista, a MP dispõe sobre novas regras para a regularização fundiária urbana, rural e da Amazônia Legal, e revoga um conjunto de normativas estabelecidas e frutos da reivindicação popular, como o Programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) e o Estatuto das Cidades. 

Como o relatório não tinha sido disponibilizado anteriormente à sessão de votação do material no dia 26 de abril, a sessão fui suspensa e reiniciada para debate nesta terça-feira (02). Com 122 emendas acatadas, das 732 propostas apresentadas pelos parlamentares, o relatório será votado em um cenário de acirramento das tensões no campo, com mortes e agressões a campesinos e indígenas, e levante popular nas ruas em resposta às medidas adotadas pelo governo de Michel Temer (PMDB), em especial às reformas previdenciária e trabalhista.

Com composição significativa de expoentes do agronegócio, a comissão reflete o desenho das casas legislativas. Como aponta a agência A Pública, do total de 513 deputados federais, 207 são da bancada ruralista. No Senado o contexto é semelhante: dos 81 senadores, 32 possuem estreitos vínculos com interesses do agronegócio. Desta forma, a composição da Comissão Mista da MP é formada com forte presença dos ruralistas – 13 dos 37 deputados e senadores com titularidade ou suplência na Comissão integram a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), articulação do setor ruralista para incidência na atuação legislativa. Os cargos centrais ao trabalho do colegiado, relator e presidente, são preenchidos por integrantes da FPA, o senador Romero Jucá  (PMDB-RR) e o deputado federal Izalci Lucas (PSDB-DF), respectivamente.

Minoria na Comissão Mista, os parlamentares de oposição reconhecem a correlação de forças desfavorável neste espaço de disputa e defendem a necessidade de resistência com apoio popular. “Eles têm maioria e conseguem fazer com que a visão deles prevaleça. Não é batalha fácil, o que a gente tem que fazer é ampliar essa articulação com a sociedade para exercer pressão sobre essa institucionalidade. Esse sistema do jeito que está sendo tocado está falido. O que a gente faz é a resistência necessária para poder verbalizar as lutas das organizações e movimentos nas ruas. O que a gente pretende é manter a relação permanente com os movimentos e denunciando o que acontece, que é fazer com que matérias complexas, dos mais variados artigos e um deles modifica a vida de milhões de brasileiros”, aponta o líder da bancada do PSOL na Câmara, Glauber Braga (PSOL-RJ).

A bancada ruralista tem levado a cabo a “Pauta Positiva-biênio 2016/2017”, apresentada a Temer por parlamentares e entidades do agronegócio após a destituição de Dilma. A reedição da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) Funai-Incra, a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) em maio do ano passado e a reconfiguração da legislação referente à regularização fundiária e Reforma Agrária são exemplos, na avaliação das lideranças presentes, do aprofundamento de uma política agrária antipopular, consolidando um cenário de injustiça social no campo.

O deputado João Daniel (PT-SE) defende que recursos como pedido de vista ou obstrução da matéria são utilizados no processo legislativo para possibilitar ampliação do tempo de análise da matéria, com possibilidade de envolvimento da população. “Lamentamos que a MP nasça de um governo ilegítimo, que não surgiu do voto legítimo do povo. Ela mexe com uma questão central do poder que é terra urbana e rural. Infelizmente temos um Congresso conservador, o mínimo que podemos fazer é a obstrução”, aponta.

Impossibilidade do debate público

Tanto o conteúdo da MP quanto a condução dos trabalhos pela comissão sem a devida abertura ao debate público à altura do impacto da medida, são objetos de crítica pelos movimentos e organizações camponesas. “A condução do trabalho pela mesa diretora da comissão revela que o Executivo e Legislativo buscam, com toda pressa, aprovar a MP, retrocedendo nas conquistas históricas da classe trabalhadora do campo e da cidade. Com esta pressa, o governo e legislativo golpistas impedem o debate público que modifica mais de seis leis, inclusive a lei agrária [8.629/1993], historicamente construída por muitos anos e a Constituição, sem debate aprofundado sobre o tema”, argumenta o membro da Coordenação Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Alexandre Conceição.

Diante da afirmação do relator de que a Comissão tem sido pautada por “transparência e democracia” e que ao acatar 122 medas atendeu a interesses diversos, a assessora de política agrária da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Cleia Anice da Mota Porto, contesta. “As perguntas que ficam é: democrático para quem? A que interesses ele atendeu quando diz que atendeu a todos? O que temos ouvido de parlamentares vinculados às lutas dos trabalhadores é que as propostas apresentadas por eles, como emendas, não foram acatadas. Isso deixa uma preocupação grande – se as emendas aceitas não atendem aos interesses dos trabalhadores, as emendas que foram aceitas atendem aos interesses dos ruralistas”, problematiza.

 

*Editado por Leonardo Fernandes