“Nós, mulheres, estaremos em todas as trincheiras de luta”, diz dirigente do MST

As ações nas ruas terminaram com um protesto próximo ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), onde no último dia 24 de janeiro ocorreu o julgamento e a condenação em segunda instância do ex-presidente Lula
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Intervenção retratou a violência contra a mulher. Foto Catiana de Medeiros 

 

Por Catiana de Medeiros
Da Página do MST

Assim como ocorreu em 2017, a semana do 8 de março deste ano unificou as lutas das mulheres do campo e da cidade na região Metropolitana de Porto Alegre e na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. Com o lema “Em Defesa da Democracia e Soberania Nacional; por nenhum direito a menos”, milhares de trabalhadoras participaram de estudos e debates sobre as suas realidades, de marchas e de ocupações de órgãos púbicos.

Conforme Salete Carollo, da coordenação do Setor de Gênero do MST/RS, a integração que foi construída pelas mulheres de todo o estado nos últimos anos é um marco para a data 8 de março. Segundo ela, as mobilizações coletivas, que unificam diversas bandeiras, reafirmam que as mulheres gaúchas continuarão resistindo, de forma organizada e articulada, para não perderem mais nenhum direito.

“Nós estamos sendo saqueadas pelo governo golpista de Michel Temer e continuaremos mobilizadas no próximo período para que ocorra um processo de eleição democrática no país e, assim, retomar os nossos direitos. A luta nos fortalece e aponta que não podemos pensar em nossas categorias individuais, mas que é importante integrar as nossas bandeiras, porque os direitos são coletivos e de toda a classe trabalhadora”, explica Salete.

As atividades em alusão ao Dia Internacional da Mulher começaram na última terça-feira (6), no assentamento Capela, em Nova Santa Rita, com a conferência “Em Defesa da Democracia e da Soberania Nacional: as mulheres como sujeitos de resistência”, com a ex-presidenta Dilma Rousseff. Na ocasião, ela relatou as arbitrariedades que sofreu na época da Ditadura Militar, há mais de 50 anos, quando foi presa política, e também em 2016, ano em que a misoginia revestida de golpe a tirou do cargo político mais alto do país.

Mesclado aos estudos, as mulheres ouviram depoimentos de vida de uma assentada da Reforma Agrária e de uma catadora de materiais recicláveis. A intenção era motivá-las a continuarem na luta por seus direitos. Elas também participaram de plenária sobre a Revolução Russa e do lançamento do livro “Campo, Floresta e Águas: práticas e saberes em saúde”. Esta obra reúne vivências e reflexões  de todas as regiões do Brasil, inclusive, traz o “nascimento” da Estratégia Saúde da Família Rural Marisa Lourenço da Silva, localizada no Assentamento Santa Rita de Cássia, em Nova Santa Rita.

Ocupação da Conab, em Porto Alegre, em defesa do Programa de Aquisição de Alimentos. Foto Catiana de Medeiros.jpg
Ocupação da Conab, em Porto Alegre, em defesa do Programa de Aquisição de Alimentos. Foto Catiana de Medeiros 

Ocupação e marcha

Na tarde do dia 7 de março, cerca de 300 trabalhadoras do MST, do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e do Movimento das Trabalhadoras e dos Trabalhadores por Direitos (MTD) ocuparam a Superintendência Regional da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em Porto Alegre. A ação foi motivada pelo desmonte do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e reuniu produtoras de alimentos e beneficiárias que vivem em periferias das cidades. As mulheres, que exigiram a reposição do Orçamento da política pública para o RS, desocuparam o local ao fim do dia, com a garantia de que o valor destinado ao PAA ao estado seria o mesmo de 2017.

Já no dia 8 de março, a Jornada de Luta das Mulheres contou com uma grande marcha pelas ruas centrais da capital. Ainda nas primeiras horas da manhã, centenas de trabalhadoras urbanas e rurais começaram a se concentram próximo à rodoviária. Durante a marcha, elas davam gritos de ordem, tais como: “Sem feminismo, não há socialismo” e “Quando uma mulher avança, nenhum homem retrocede”, e carregavam faixas e cartazes, que denunciavam principalmente a violência contra a mulher e o desmonte de políticas públicas.

As cerca de duas mil mulheres que ocupavam as ruas de Porto Alegre fizeram uma primeira parada para protestar em frente à prefeitura, no Centro Histórico. Lá, criticaram duramente as medidas neoliberais do governo de Marchezan Jr. (PSDB). Numa rua em frente ao paço municipal, protagonizaram uma intervenção para denunciar a violência contra a mulher, que hoje mata 12 por dia no Brasil. Depois, em frente ao Palácio Piratini, elas repudiaram os pacotes de maldade que o governo de José Ivo Sartori (MSD) envia à Assembleia Legislativa gaúcha, os quais têm castigado o serviço público.

As ações nas ruas terminaram com um protesto próximo ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), onde no último dia 24 de janeiro ocorreu o julgamento e a condenação em segunda instância do ex-presidente Lula no caso Triplex do Guarujá. A Brigada Militar impediu as mulheres de se aproximarem do local, porém, próximo a ele, elas criticaram a criminalização sofrida pelos movimentos populares, o auxílio-moradia recebido pelos juízes e a seletividade da justiça brasileira ao julgar processos que envolvem mulheres e políticos.

Próximo ao TRF4, em Porto Alegre, trabalhadoras repudiaram o auxílio-moradia destinado aos juízes (1).jpg
Próximo ao TRF4, em Porto Alegre, trabalhadoras repudiaram o auxílio-moradia destinado aos juízes 

Audiência

Uma audiência que pautou a falta de transporte escolar para as escolas estaduais encerrou a Jornada de Luta. Um grupo de mulheres do MST e da Via Campesina, acompanhadas do deputado estadual Edegar Pretto (PT), se reuniram com o chefe da Casa Civil do governo Sartori, Fábio Branco. Na ocasião, as camponesas cobraram medidas urgentes para solucionar problemas oriundos da defasagem do atual valor repassado pelo Estado às prefeituras — desde 2014, o orçamento é de R$ 117 milhões para o transporte escolar.

Diana Daros, da coordenação do setor de Educação do MST/RS, ressalta que os estudantes não podem ser reféns dos problemas existentes dos desajustes de convênios entre estado e municípios. “As nossas escolas precisam estar em funcionamento para ajudar a organizar as comunidades. Quando fechadas, sinalizam aos pais uma não perspectiva de futuro para os seus filhos”, argumenta. O secretário se comprometeu a agilizar a licitação emergencial para atender municípios e disse que o governo do Estado vai “tentar ser mais justo” no próximo ano, por meio da redistribuição de recursos para o transporte.

Mobilização na Fronteira Oeste

Além das atividades em Nova Santa Rita e em Porto Alegre, que reuniram assentadas e acampadas de todas as regiões do estado, camponesas do MST se mobilizaram no dia 8 de março em Santana do Livramento, na Fronteira Oeste gaúcha. Numa ação conjunta com trabalhadoras uruguaias e urbanas, elas fizeram marchas para denunciar principalmente o fim da violência contra a mulher e um ato político na Praça Internacional.

Ainda em alusão ao Dia Internacional da Mulher, trabalhadoras do MST ocuparam a prefeitura de Santana do Livramento, para exigir solução ao problema da falta de transporte escolar para os seus filhos estudarem. O encerramento da jornada na região se deu com uma manifestação de solidariedade ao Hospital Santa Casa de Misericórdia do município, que corre risco de ter as suas portas fechadas.

Marcha em Porto Alegre reuniu cerca de 2 mil mulheres. Foto Leandro Molina.jpg
Marcha em Porto Alegre reuniu cerca de 2 mil mulheres. Foto Leandro Molina 

Jornada Nacional

Todas as atividades organizadas esta semana pelo MST no Rio Grande do Sul fizeram parte da Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra, que tem como lema “Quem não se movimenta, não sente as corrente que a prendem”. De acordo com Silvia Reis Marques, da direção nacional do Movimento, somente com iniciativas de mobilização social e de ocupação das ruas é que as mulheres conseguirão garantir os seus direitos. Para ela, a luta das trabalhadoras é “forte e de resistência”, além de ser sinônimo de unidade.

“Em nível de país, ocupamos fazendas, órgão públicos e empresas golpistas de comunicação; fizemos marchas e audiências públicas; denunciamos a retirada de direitos e a violência contra a mulher; e defendemos a democracia e a soberania nacional. Isso tudo dialoga com as nossas vidas, com a produção de alimentos e com o futuro do nossas crianças. Por isto, esta foi uma jornada muito importante para a classe avançar em suas conquistas e na construção de um projeto popular para o país. Este é um processo em que nós, mulheres, estaremos sempre em todas as trincheiras de luta”, sinaliza.