Em nota, CPT repudia a tentativa de despejo de 96 famílias do assentamento Nova Conquista no MT

O anúncio de despejo não é um anúncio frio de uma decisão judicial para estas 178 pessoas. É um anúncio da negação de cada um enquanto humano, enquanto cidadão e cidadã

 

Da Comissão Pastoral da Terra 

Em nota, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) denuncia a ação de despejo movida contra 96 famílias do do Assentamento Nova Conquista II localizado no município de Novo Mundo, Mato Grosso. O local da ocupação já sido destinado pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para a construção de um assentamento, porém na nesta terça-feira (5), as famílias foram surpreendidas pela decisão da Desembargadora Daniele Maranhão Costa, do TRF da 1ª Região – Brasília, que determina a “suspensão da execução da sentença”. e o despejo das 96 famílias.

Acompanhe: 

Uma verdade que teima em persistir na vida dos pobres da terra é a verdade de que a justiça não é para
eles. E as 96 famílias, hoje, moradoras do Assentamento Nova Conquista II sentem em suas peles esse
grande pecado social de ser pobres, sendo castigadas dia-após-dia.

O sonho de acessar a terra prometida se aproximou com a decisão da Justiça Federal de Sinop, Ação
Reivindicatória nº. 0000088-16.2009.4.01.3603, quando é reconhecida a propriedade da área da Fazenda
Recanto (9.658 hectares) como sendo da União e antecipa tutela em 2000 hectares, determinando ao INCRA
que faça um plano de Ocupação para serem assentadas 96 famílias. Em 20 de fevereiro de 2018 as partes do
processo (União e fazendeiros) realizam um acordo, que é homologado pelo Juiz Murilo Mendes, que
permitiu que as famílias fossem assentadas. O assentamento das famílias já está consolidado, o INCRA já
criou a portaria de criação (nº. 607), bem como demarcou e cortou todos os lotes. Desde então as famílias
estão vivendo no assentamento.

Contudo, na data de ontem (05/06/2018) as famílias foram surpreendidas com a absurda decisão da
Desembargadora Daniele Maranhão Costa, do TRF da 1ª Região – Brasília, onde a mesma determina a
“suspensão da execução da sentença”. Essa decisão, caso cumprida pelo juízo da 1ª Vara da Justiça Federal
de Sinop, irá acarretar o despejo das 96 famílias.

Destas famílias, existem as que estavam acampadas desde 2001, no Acampamento União Recando
Cinco Estrelas, na esperança de possuir a terra. Uma terra que não é somente para a geração de renda, mas
uma terra de trabalho onde produzem seus próprios alimentos, se tornando um lar. Essas famílias
vivenciaram diversas formas de violências psicológicas e físicas, entre elas ataques de pistoleiros, disparo de
armas de fogo, despejos, expulsões, ameaças de morte, destruição de bens, envenenamento por agrotóxicos,
etc, além da violência e ameaças perpetradas pela Polícia Militar local, como a Comissão Pastoral da Terra e
o Fórum Direitos Humanos e da Terra vem denunciando há vários anos, não tendo o Estado tomado
nenhuma providência.

Contudo, o estado de exceção vivenciados no cotidiano destas famílias é uma negação de direitos que
as perseguem teimosamente deixando-as em condição de vulnerabilidade, superexploração de sua força de
trabalho, escravização (102 pessoas das 96 famílias já estiveram em situação de trabalho escravo).

O Profeta Miquéias alerta os poderosos nas sagradas escrituras:

“Ai daqueles que planejam iniquidade e que tramam o mal em seus leitos!
Ao amanhecer, eles o praticam, porque está no poder de sua mão.
Se cobiçam campo, eles o roubam, se casas, eles a tomam”. (Miquéias 2, 1-2).

A possibilidade do despejo trás para as 96 famílias (60 crianças/adolescentes de zero a 14 anos, 10 jovens de 15 a 19 anos, 66 adultos e 32 idosos) um estado de terror, a possibilidade de verem seus lares já construídos, suas hortas e outras plantações, suas pequenas criações destruídas os angustiam a cada minuto. O anúncio de despejo não é um anúncio frio de uma decisão judicial para estas 178 pessoas. É um anúncio da negação de cada um enquanto humano, enquanto cidadão e cidadã. É a negação da VIDA. E o grito da pessoa oprimida tem que chegar a todos e todas nós. Um grito, às vezes, mudo, silencioso, mas doloroso, mortal, bárbaro.

“Eu vi, eu vi a miséria do meu povo… Ouvi o seu clamor por causa dos seus opressores; pois
eu conheço as suas angústias. Por isso desci a fim de libertá-los…, e para fazê-los subir aquela
terra a uma terra boa e vasta, terra que mana leite e mel.” Êxodo 3, 7-8.

Sentir o coração de quem sofre com o nosso próprio coração é uma das características mais humanizante do Ser Humano. Desta forma, estas famílias necessitam do apoio e solidariedade de cada um e cada uma, de toda a classe trabalhadora, do campo e da cidade.

Assim, despejar estas famílias é negar-lhes cidadania. É negar-lhes o acesso à moradia digna, ao trabalho, à educação, à alimentação, à renda, e jogá-las, novamente, às situações de violências já vivenciadas, decisão esta que temos a Esperança de que não será tomada pelo Juiz Murilo Mendes. Por fim apelamos à Desembargadora Daniele Maranhão para reverta a sua decisão.

Em apoio a esta Nota Pública, assinam: E demais entidades abaixo relacionadas:

Ação Nacional Unificada – ANU
Associação Brasileira de Homeopatia Popular – ABHP
Central Única dos Trabalhadores – CUT
Centro Burnier Fé e Justiça, CBFJ – CJCIAS
Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Bienes – CDHDMB
Centro de Pastoral para Migrantes – CPM
Conselho Indigenista Missionário – CIMI/MT
Conselho Nacional do Laicato do Brasil – CNLB
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE
Grupo de Estudo Educação Merleau-Ponty – GEMPO UFMT/IE
Grupo de Pesquisa Movimentos Sociais e Educação – GPMSE UFMT/IE
Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte – GPEA-UFMT
Instituto Caracol – iC
Instituto Humana Raça Fêmina – INHURAFE
Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra – MST
Movimento dos Trabalhadores Rurais 13 de Outubro
RuAção- Núcleo Interinstitucional Merleau-freiriano (UFMT)