João das Neves: um legado que semeia e germina rebeldia

Em nota, o MST reafirma o papel político da arte na luta e o legado de João na resistência à ditadura militar
 
 
 
Da Página do MST
 
 
“João das Neves parte, mas fica seu exemplo, fica sua produção, fica sua militância, alimentando nossa cultura, nossa luta e resistência”. São com essas palavras de profundo agradecimento, que o MST se despede do dramaturgo, teatrólogo e companheiro João das Neves. 
 
Com 84 anos, João veio a falecer nesta sexta-feira (24), em Belo Horizonte (MG). Referência na cena teatral brasileira, o dramaturgo foi uma das principais lideranças do teatro do país e um dos fundadores do Grupo Opinião, ao lado de nomes como Ferreira Gullar, Vianinha e outros.
 
 
Em nota de pesar, o MST reafirma o papel político da arte na luta de classes e o legado histórico de João na resistência à ditadura militar, sem perder de vista, a contribuição que tem dado em diversas atividades junto com o coletivo de cultura do Movimento. “Se parte de nós sente profundamente a partida do companheiro, por outro lado, nos acalenta a memória dos últimos anos em que estivemos juntos. João, com a idade já avançada e com dificuldades, irradiava felicidade e vigor, se transformava, quando participava de nossos cursos de formação e de nossas escolas de artes em Minas Gerais”.
 
Leia a nota na íntegra: 
 
No duro momento histórico que estamos atravessando, tivemos uma perda inestimável com a partida do dramaturgo, teatrólogo e companheiro João das Neves. Parte de nossos sentimentos são de profundo pesar por sua partida. João das Neves foi uma das figuras centrais na produção cultural brasileira. Sua atuação mais destacada foi no Centro Popular de Cultura (CPC), movimento cultural inspirado por Paulo Freire e pelo Movimento de Cultura Popular (MCP).
 
 
Ele foi um dos coordenadores do CPC e responsável na organização pelas intervenções de teatro de rua. Uma das mais importantes experiências de vinculação entre arte e política, o CPC foi extinguido pelos tanques do golpe de 1964. Uma das primeiras reações culturais contra o regime autoritário que se instalava foi a show Opinião, que resultou na formação do Grupo Opinião, do qual João das Neves foi um dos coordenadores. Intervenção musical marcante, o show Opinião reuniu Zé Kéti, trazendo a voz do morro, afirmando que não mudaríamos de opinião; a voz de João do Vale, autor da clássica música Carcará, retratando o retirante nordestino e dando voz ao êxodo rural, e Nara Leão, representando a participação de setores urbanos na transformação social. João das Neves foi um dos organizadores dessa intervenção divisora de águas na cultura brasileira.
 
 
Se parte de nós sente profundamente a partida do companheiro, por outro lado, nos acalenta a memória dos últimos anos em que estivemos juntos. João, com a idade já avançada e com dificuldades, irradiava felicidade e vigor, se transformava, quando participava de nossos cursos de formação e de nossas escolas de artes em Minas Gerais. Seu depoimento no IV Seminário Nacional de Cultura do MST, realizado em 2017, foi um testemunho de força e convicção no potencial transformador da arte e da cultura.
 
 
Também nos ameniza a dor saber que provavelmente uma de suas últimas obras tenha sido a elaboração, em conjunto com o MST e o Levante Popular da Juventude, de uma nova peça de teatro de rua, uma intervenção contra o golpe em curso, em defesa da democracia e para os trabalhos de base para os processos de construção do Congresso do Povo. 
 
 
João das Neves parte, mas fica seu exemplo, fica sua produção, fica sua militância, alimentando nossa cultura, nossa luta e resistência. João partiu, serenamente, revigorado, como ele mesmo dizia, pois via que os frutos que havia semeado germinava, que as armas e os golpes não o calaram. Seu exemplo não será esquecido, pois seguirá vivo nas lutas populares.
 
 
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
24 de agosto de 2018