Em Brasília, acampamento Terra Livre denuncia governo

Iniciado esta semana, a 15ª edição do acampamento contará com diversas ações e atividades contra os desmontes do governo Bolsonaro

 

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Acampamento deve se estender até a próxima semana/ Fotos: Matheus Alves

Por Janelson Ferreira
Da Página do MST

 

Na manhã desta quarta-feira (24), cerca de quatro mil indígenas de todo Brasil desembarcaram em Brasília para o início do Acampamento Terra Livre (ATL). Este ano, o acampamento chega em sua décima quinta edição organizado pela Articulação dos Povos Indígenas (APIB) e tem a participação de dezenas de povos do país e representações de outras nações.

Com previsão de durar até esta sexta-feira (26), o acampamento contará com diversas ações e atividades. Estão previstos encontros das delegações indígenas, atividades culturais, manifestações em frente ao Congresso Federal, STF e Palácio do Planalto, vigílias, audiências públicas e marchas, dentre outros.

Em 2019, o ATL busca exigir que a Fundação Nacional do Índio (Funai) volte a ser subordinada ao Ministério da Justiça e que retome as atribuições de demarcar essas áreas e opinar sobre o licenciamento ambiental de projetos que afetem essas populações. As lideranças também protestam contra a proposta do governo de passar para os municípios ou para os estados o atendimento de saúde das comunidades.

Sônia Guajajara, da APIB, afirmou que os povos indígenas seguirão em marcha para mostrar que não irão recuar. “Estamos aqui em nome de todas as vozes que combatem as injustiças e estão tendo suas terras invadidas pela mineração, especulação imobiliária e pelas madeireiras”, afirma a indígena.

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Fotos: Matheus Alves

Para Guajajara, o discurso oficial do governo Bolsonaro retoma uma política da época da ditadura de integração do índio à sociedade. “O que está em disputa hoje é a terra. Bolsonaro disse que a cavalaria do Brasil, ao contrário da americana, é incompetente, por não ter conseguido exterminar os indígenas. Mas estamos aqui em Brasília para mostrar que a resistência é muito maior do que se imagina”, ressalta.

Desde o início de seu governo, Bolsonaro já atacou os povos indígenas de diversas formas. Editou a Medida Provisória MP 870, buscando paralisar de vez o reconhecimento e a demarcação das terras indígenas. O governo também transferiu a Funai do Ministério da Justiça para o recém criado Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (Decretos 9660/19 e 9673/19).

Seguindo adiante com o desmonte, Bolsonaro entregou a atribuição de demarcar terras indígenas para a Secretaria Especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), sob comando de representantes do latifúndio e do agronegócio. Para esta secretaria do Ministério da Agricultura também seguiu a manifestação estatal sobre processos de licenciamento ambiental de empreendimentos com impacto sobre essas terras (Decreto 9667/19).

 

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Fotos: Matheus Alves

Os ataques do governo ainda atingem diversas políticas públicas destinadas aos indígenas. Está em curso, em ação protagonizada pelo Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, a tentativa de municipalização da política de atenção básica à saúde indígena. Bolsonaro também não apresentou nenhuma proposta para melhorar a infraestrutura das escolas Indígenas e de promover a formação de professores indígenas, mas, pelo contrário, extinguiu a Coordenação Geral de educação Escolar Indígena da estrutura administrativa do Ministério da Educação.

Para Elizeu Guarani Kaiowá, também da APIB, o governo tem um objetivo claro em relação aos povos indígenas. “O que ele quer é acabar com nós, mas isto não vai acontecer, resistiremos até o último guerreiro”, afirma a liderança.

Além de ações concretas, diversas declarações de Bolsonaro e sua equipe reforçam este ataque aos povos originários. Ele já afirmou que não pretende demarcar nenhum centímetro a mais de terra indígena e que pretende rever as demarcações consolidadas. O governo também assume publicamente um discurso integracionista, afirmando que os povos indígenas não precisam de terras, a não ser que assumam o viés produtivista do agronegócio e disponibilizem suas áreas para o mercado de terras ou para o arrendamento, usurpando assim o direito de posse e usufruto exclusivo assegurado pela Constituição Federal.

“Querem entregar nossos territórios para as grandes empresas multinacionais”, denuncia Sônia Guajajara. A indígena ainda aponta que estas empresas consideram apenas o lucro e a ganância. “O que importa para estas empresas e o governo é o PIB, a bolsa de valores. Mas nós, defendemos nossa terra, nossa vida”, destaca.

Acampamento Terra Livre começa sob ameaça do governo

A postura de ataque aos povos indígenas foi seguida pelo governo também para o ATL. O Gabinete de Segurança Institucional (GSI) ordenou ao Ministro da Justiça, Sérgio Moro, autorizar o uso da Força Nacional de Segurança na praça dos Três Poderes e na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, por 33 dias.

Esta portaria, assinada por Moro, entrou em vigor na última quarta-feira (17) e, além de tentar intimidar os povos indígenas, busca também coibir manifestações no Dia do Trabalhador, que ocorrerá em 1 de maio. Neste ano, as manifestações nesta data buscarão denunciar, principalmente, a tentativa de aprovação da Reforma da Previdência, que ataca diversos direitos da classe trabalhadora.

“Chegamos aqui com uma responsabilidade e não vamos recuar, lutaremos pelos que estão aqui e aqueles que ficaram nas nossas aldeias”, concluiu Guajajara.

 

Editado por Fernanda Alcântara