Como enraizar a cultura da luta através do teatro?

Em dez dias de estudo e trabalho, MST realiza Residência Artística da Brigada Nacional de Teatro Patativa do Assaré
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Diversas oficinas e atividades teatrais impulsionaram a Residência Artística.
Foto: Divulgação MST

 

Por Jailma Lopes
Da Página do MST

 

Estudar os acúmulos que o MST vem construindo desde 2001 com os processos de organização do trabalho com o teatro; se apropriar das várias técnicas; proporcionar experiências de troca; e, construir possibilidades de potencializar o trabalho de base, os processos de formação, organização e luta como ferramenta de resistência no atual momento político, sem perder de vista a construção da Reforma Agrária Popular. 

Esses foram os principais objetivos da Residência Artística da Brigada Nacional de Teatro Patativa do Assaré realizada entre os dias 20 e 29/05, em São Luís (MA). O espaço reuniu 40 trabalhadores e trabalhadoras Sem Terra, em sua grande maioria jovens, vindos da região Amazônica e Nordeste do país. 

A inciativa é um processo construído pelo Coletivo Nacional de Cultura do MST e está vinculada ao processo de enraizamento do Programa Cultural do MST, que é a Reforma Agrária Popular, tendo como base, o princípio de desenvolver nos territórios a possibilidade de toda e todo Sem Terra fazer arte. 

Nesse sentido, os dez dias de trabalho, envolveu muito estudo acerca dos processos históricos de disputa cultural, com o objetivo de reafirmar o princípio que o MST aprendeu com Augusto Boal, importante dramaturgo brasileiro, no qual dizia que: “o teatro é uma arma e é o povo que deve manejá-la”.

Enraizamento

Ao construir pontes entre a teoria e a prática, durante a Residência, ocorreu um mutirão de oficinas de teatro, em cinco assentamentos da regional Itapecuru, localizada na mesorregião Norte do Maranhão, para discutir com as famílias Sem Terra o Programa Cultural do MST. 

Foram realizadas oficinas com crianças, jovens e adultos de várias idades, que se envolveram com muita disposição, em um encontro da linguagem teatral como método e educação dos sentidos.

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Mística realizada durante os estudos.
Foto: Divulgação MST

De acordo com Nieves Rodrigues, do setor de frente de massa, comunicação e direitos humanos do MST no Pará, ir às áreas foi desafiante, porque entre aprender e multiplicar há muita responsabilidade, mas, além disso, é muito interessante as possibilidades que é possível desenvolver nos territórios. 

“O diálogo com nossa base, principalmente com a nossa juventude, tem muito potencial e trabalhar as várias linguagens, principalmente do teatro, permite debater os temas atuais que envolvem a nossa luta de uma forma que as pessoas se enxerguem dentro dos processos”, destacou Nieves. 

Durante a residência recuperou-se as sínteses que a brigada construiu sobre o legado do teatro político, que nos processos históricos estiveram a serviço do povo, a exemplo da Revolução Russa, da Alemanha, e no Brasil, a tradição do Teatro de Arena, os processos de Centros Populares de Cultura (CPC’s) e do Movimento de Cultura Popular, em Pernambuco. 

Para Jobson Passos, do coletivo de juventude, comunicação e cultura do MST na Bahia, “ter a possibilidade de experimentar o fazer prático foi maravilhoso e bem místico, porque ao longo da residência a gente estudou os movimentos de cultura antes da ditadura e nesse final de semana a gente pode organizar e reconstruir o caminho que eles percorreram. Conversar com o povo a partir da linguagem teatral é abrir outra forma de diálogo, que é tão ou mais eficiente quanto às formas clássicas de trabalho de base”.

Brigada Nacional de Teatro Patativa do Assaré 

Desde 2001, o MST iniciou o trabalho com o teatro de forma organizada e nacional, a partir da oficina com o Centro de Teatro do Oprimido (RJ), sob a coordenação do próprio Augusto Boal. Várias parcerias se iniciaram em diferentes estados, como em São Paulo com a Companhia do Latão e Teatro de Narradores, com as assessorias em estudos com a Iná Camargo Costa, com o grupo Ó Nóiz Aqui Traveiz (RS), dentre as várias articulações no RJ e DF. 

Essas ações culminaram, em 2005, com a maior ação teatral do Movimento, o Teatro Procissão, reunindo 270 militantes do coletivo de cultura durante a Marcha Nacional do MST, onde contou com cerca de 12 mil marchantes. 

Nesse processo foram formados no Brasil 40 grupos de teatro do MST, envolvidos nas pautas de luta e da conjuntura. Esses grupos formaram a Brigada Nacional de Teatro Patativa do Assaré e, desde então, o trabalho com o teatro tem se reafirmado nos processos de formação, organização e luta, seja nos territórios, nas Brigadas de Agitação e Propaganda ou na relação com a sociedade. 

Com isso, alguns desafios se apresentam, entre eles, a compreensão dessa linguagem como um importante instrumento de agitação, formação da consciência, diálogo com a sociedade e acúmulo de forças.

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Jobson Passos diz que foram dias de partilha, debate, vivência e de intensa comunhão.
Foto: Divulgação MST

Atualmente, e segundo Luciana Frozi, integrante da Brigada Nacional de Teatro, o trabalho da Patativa no próximo período está diretamente ligado ao processo de enraizamento do Programa Cultural do MST.

“Esses dias de partilha, debate, vivência, de intensa comunhão dos saberes e apropriação do teatro político, tendo como base as experiências teatrais anteriores, as influências estéticas da dramaturgia de Bertold Brecht, o agitprop alemão e soviético, além dos processos desenvolvidos na América Latina com o Augusto Boal, nos ajuda a pensar o nosso fazer, com o objetivo de potencializar e construir experiências a partir dos nossos territórios.” 

E continua: “Saímos com o desafio de cada vez mais construir um fazer teatral ligado a estratégia do MST, no trabalho nos nossos acampamentos, assentamentos, escolas e na construção das relações com a sociedade, somando-se as lutas da classe trabalhadora, contra a propriedade privada e as ações do capital”, enfatizou.

Por fim, segue sendo centralidade da Patativa, de acordo com Frozi, a necessidade que a linguagem teatral seja apropriada pelas camponesas e camponeses. Ela pontua que essa forma de formar, educar e conscientizar, precisa ocupar e disputar os territórios, estando a serviço da transformação social.

 

*Editado por Wesley Lima