Produção agroecológica amplia relação com a cidade

“São alimentos que chegam em nossas mesas e podemos oferecer sem medo a nossa família”, diz consumidor
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Toda semana o Assentamentos Contestado entrega oito toneladas de alimentos em 104 escolas da região.
Foto: Michele Torinelli

 

Por Gustavo Gonçalves e Sirlene Ivaniski
Da Página do MST

 

Ao adquirir um alimento vindo da agroecologia, o consumidor não leva para casa apenas um produto, mas cria um vínculo de amizade e cooperação com os camponeses e camponesas.

Leonel Nunes, morador de Curitiba e consumidor de alimentos agroecológicos, relata com muita gratidão como é importante esse modo de produção: “São alimentos que chegam em nossas mesas e podemos oferecer sem medo à nossa família. Nós só temos a agradecer a esse produtor que está nos dando essa referência de consumir produtos sem veneno”, conta.  

Leonel está entre os moradores de Curitiba que consomem os alimentos sem agrotóxicos produzidos no Assentamento Contestado, localizado na Lapa (à 70 km da capital paranaense), que neste ano completa 20 anos de resistência e organização.

Nessas duas décadas, o assentamento se fortaleceu como comunidade camponesa do MST, desenvolvendo ações na área da saúde popular, tratamentos homeopáticos, benzedeiras, escolas que atendem de crianças até o nível superior, além do Centro Cultural Casarão, com programação cultural diversificada. 

Quando o assunto é produção, uma das maiores conquistas é a Cooperativa Terra Livre, criada pelo assentamento. Ela é responsável pela organização e escoamento da produção de 210 sócios – agricultores da própria comunidade e também do município de Campo Largo, Lapa, Antônio Olinto, São Mateus do Sul, Palmeira, Teixeira Soares e Antonina.

Toda semana, a Cooperativa entrega oito toneladas de verduras, frutas, legumes e temperos agroecológicos em 104 escolas, por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e também para a população urbana. 

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Foto: Michele Torinelli

Dos 3.228 hectares que compõem a área total do assentamento, 1.240 são de proteção ambiental – como reserva legal ou preservação permanente. Todo o território integra os limites da Área de Proteção Ambiental da Escarpa Devoniana – uma unidade de conversação que protege os campos gerais do Paraná.

Do campo para a cidade 

Cezar Luiz Kebber é morador do assentamento e “guardião de sementes”, como são chamados os camponeses que cultivam e mantêm a diversidade das sementes crioulas, livres de transgenia ou agrotóxicos. “Aqui vivemos uma vida muito boa e saudável, onde eu posso produzir quase 100% da minha alimentação, eu posso continuar a reproduzir a vida, porque eu sou um guardião das sementes”, comemora.

Porém, após 20 anos de Assentamento e várias conquistas, as famílias assentadas ainda enfrentam dificuldades para serem aceitas e respeitadas, mas seguem perseverantes: “A gente ainda sofre discriminação da sociedade, inclusive no município aonde a gente faz parte. Mas isso não muda a nossa prática e não atrapalha nossos sonhos”, afirma Cezar, com convicção e esperança de uma sociedade mais respeitosa e amiga do povo do campo. 

Leonel Nunes é um dos exemplos dessa relação que Cezar propõe e um dos muitos aliados do MST na região. Além de consumidor de alimentos agroecológicos, ele é produtor de sucos naturais e integrante da Rede Mandala, uma articulação que reúne grupos do campo e cidade ligados à economia solidária e ao cooperativismo, da qual a Cooperativa Terra Livre também faz parte.

Ele mora no bairro Fazendinha e participa da comunidade da Paróquia Santa Amélia, onde compartilha os alimentos com outras pessoas e divulga os produtos agroecológico. “Temos que levar a divulgação da agroecologia todo dia para todas as comunidades em geral”, propõe Nunes. 

Outra consumidora é a assistente social, Janaine Santos, que ressalta o aprendizado da coletivização da vida, praticada no assentamento Contestado: “a opção pela agroecologia tem a ver com a forma como a gente cria nossas crianças, do ambiente livre de agrotóxicos e de viver a harmonia em comunidade”, ressalta.

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A ELAA é referência na formação de Agroecologia. Foto: Michele Torinelli

Formação em agroecologia

A Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), fundada em 2005, está localizada no assentamento e é uma referência de formação na área. A instituição fornece dois cursos de nível técnico, um deles em Licenciatura na Área da Natureza, em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR) – Setor Litoral, e o curso de Tecnologia em Agroecologia, em parceria com o Instituto Federal – Campus de Campo Largo.

Valmir Fernandes das Neves, recém-formado em Agroecologia pela ELAA, explica que a formação oferecida na escola contribui para a construção da Reforma Agrária Popular defendida pelo MST, em oposição ao latifúndio, “levantando a bandeira da agroecologia, cuidando da natureza, dando uma vida melhor aos camponeses e camponesas, gerando saúde para quem planta e quem se alimenta”, explica.

A partir da prática agroecológica, os agricultores não ficam refém do sistema hegemônico de controle de mercado (sementes e agroquímicos), tendo autonomia de produzir sem depender das multinacionais. É uma prática de recuperação da vida desde do micro ao macro, do solo, das plantas e das pessoas, estabelecendo uma relação equilibrada entre os seres humanos e a natureza.

 

*Editado por Solange Engelmann