Acampamento Marielle: de Valinhos (SP) à Itália

Exposição fotográfica leva um pouco da história e experiências de acampamento do MST em Valinhos para a Itália
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Fotos fazem parte da exposição “Terún”, que chegam à Itália ainda este mês. Fotos: TomasCajueiro

Da Página do MST
 

‘O fotógrafo Valinhes Tomá Cajueiro leva um pouco da história de Valinhos para exposição fotográfica na Itália: Terún’ é uma série fotográfica que dá voz aos acampados do acampamento ‘Mariele Vive’ em Valinhos/SP.

As fotografias e histórias foram registradas nos primeiros 12 meses da ocupação e registram os pioneiros, aqueles que chegaram ainda em uma situação juridicamente instável, para lutar por um pedaço de terra. Registra o surgimento e a evolução de um espaço hoje ocupado por mais de 1.000 famílias. A série conta com fotografias de situação cotidianas e retratos dos acampados.
 

Depois de serem expostas na Virada Sustentável de Campinas em 2019, as fotografias começam um giro por centros culturais europeus. Entre 20 e 29 de setembro acontece a primeira dessas mostras, no L’Arteficio – Showroom & Art Factory, em Turim, na Itália. Na abertura, dia 20/09 as 19h00, o fotógrafo  curador Tomás Cajueiro fará um bate papo com os presentes sobre sua experiência

O acampamento 

Era abril de 2018 quando em Valinhos, no interior de São Paulo, um grupo de agricultores do MST teve a corajosa atitude de ocupar as terras de uma fazenda há muitos anos improdutiva. A histórica luta por terra em nosso país chegava a uma cidade que nas últimas décadas tem tido na especulação imobiliária o pilar de seu desenvolvimento.
 

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Em poucas semanas, a Ocupação &”39;Marielle Vive&”39; passou a ocupar também o imaginário coletivo da população, pautando os debates da pacata cidade do interior paulista. Pessoas tomavam lado, embates aconteciam, opiniões se contrastavam e, claro, fatos eram criados sem ter nenhuma relação com a realidade. Mesmo assim, os acampados não eram ouvidos. Nunca. Debatia-se sobre eles, sem dá-los a necessária voz.

Muito inócuo, o debate que surgia na cidade parecia deixar de lado o principal aspecto da questão: a luta da terra vai muito além de grandes questões político partidárias. Vai muito além de opiniões digitais. É uma luta concreta, feita de gente. De pessoas com sonhos, dores e alegrias e que buscam naquelas novas terras a oportunidade de construir uma nova vida. Foi com essa ideia na cabeça que Tomás Cajueiro acompanhou a evolução da ‘Ocupação Marielle Vive’. 
 

‘Terún’ é uma palavra que, assim como Valinhos, tem origem Veneta. ‘Terún’ é aquele que vem da terra, que trabalha a terra. Palavra cujos primeiros registros remetem aos anos do Ressurgimento italiano, quando assim se referiam os aristocratas a parcela da população que trabalhava na agricultura. Inicialmente sem conotação negativa, mas tampouco positiva, ‘Terrone’ estava para o italiano muito como o termo ‘Camponês’ está para o brasileiro. Curiosamente, foram justamente eles, os agricultores do nordeste italiano, que imigraram as novas terras na América do Sul fugindo da miséria. Valinhos, então ainda um distrito de Campinas, recebe em massa parte desses imigrantes.
 

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Passaram-se os anos e a Itália, assim como Valinhos, se urbanizou, criou indústrias, se tornou uma potência. Essa nova Itália, pós-guerra, vê ressurgir e ganhar força e um novo uso a palavra ‘Terrone’. Dessa vez não mais neutra e objetiva, mas com forte carga semântica negativa. ‘Terrone’ se refere ao imigrante do sul do país que foi para o rico e industrializado norte atrás de oportunidades. São massas de pessoas que vivem nas periferias de Milão, Turim, Gênova e tantas outras cidades da Itália setentrional. Pejorativamente, esses imigrantes são chamados ‘Terroni’. No século XX, o termo ‘Terrone’ é um insulto.  É ser preguiçoso, ser ignorante.  

Valinhos tem suas origens fortemente ligadas ao nordeste da Itália. Foram os ‘Terrone’ do século XIX que, com muito suor, construíram a história da próspera cidade. No dialeto Veneto, ‘Terrone’ são chamados ‘Terún’. Daí nasce o nome da série, que visa fazer refletir sobre nossos julgamentos sobre realidades que não conhecemos e como, paradoxalmente, os filhos e netos dos ‘Terrone’  de outrora, agora julgam os acampados com termos e ideias que se encontram no mesmo, racista, campo semântico que julgou seus antepassados. Falassem italiano, o valinhense, infelizmente, se referiria aos acampados como ‘Terún’.

Serviço:

Exposição Terún

Local: L’Arteficio – Arte e Showroom – Turim (Itália)

Data: do 20 ao 29 de setembro.

Abertura com coquetel dia 20 as 18.30. Bate papo as 19.00

Link com informações: https://www.facebook.com/events/1345025085673286/