Escola de Arte da Região Sudeste rega a cultura para qualificar a luta

Foram 13 dias de debates, estudos e oficinas com 60 participantes de Minas, São Paulo, Espírito Santo e Rio de Janeiro.
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Oficina de preparação com Titane e Sérgio Pererê. Foto Geanini Hackbardt

Por Geanini Hackbardt
Da Página do MST

“A gente trabalhou coisas que foram/ trazer a arte para dentro do conceito da luta, ou ter a arte como forma de pensar estratégias de resistência”, assim conta Sérgio Pererê, cantor, compositor, um dos organizadores e educador da II Escola de Artes da Região Sudeste. A grande maioria dos participantes eram jovens, militantes do MST ou convidados do Levante Popular da Juventude (LPJ) e do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM). A Escola foi realizada entre os dias 6 e 18 de outubro, no Centro de Formação e Cultura Guimarães Rosa, em Belo Horizonte.
 

O projeto foi uma construção da cantora Titane com o MST. “São necessárias grandes transformações culturais para que uma nova sociedade se construa. Esta Escola de Arte tem buscado a reconstrução de uma humanidade vibrante, reflexiva e criadora que, ao longo do tempo, foi ficando adormecida ou encurralada dentro de nós”, afirma Titane.
 

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Apresentação do coro no Armazém do Campo
de Belo Horizonte. Foto: Ágatha Azevedo

A “reconstrução humana” a qual a cantora se refere perpassou todos os momentos, desde os debates até os espaços de convívio. Durante o seminário de cultura, o jornalista João Paulo Cunha expôs as intervenções do governo Bolsonaro nas áreas da arte e da cultura, promovendo, inclusive, mecanismos de censura. Como exemplo, ele citou os comitês instalados nos fundos de cultura da Caixa Econômica Federal, no qual alguns funcionários se dedicam a selecionar e proibir projetos que apresentem crítica ao governo.
 

Para João Paulo Cunha, a cultura é um campo de fundamentação de valores. Nesse sentido contribuíram as declarações de Roberto Alvim, diretor da Fundação Nacional de Artes (Funarte). “Estou aqui para criar uma máquina de guerra cultural para defender os valores do bolsonarismo”, Roberto Alvim. 
 

Até o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) virou alvo, tendo vários diretores afastados. Em MG, esse órgão cumpre o papel de, minimamente, proteger algumas cidades consideradas históricas. É o caso de Congonhas, uma das grandes cidades ameaçadas pela mineração, mas que guarda a obra de Aleijadinho como patrimônio.
 

O debate apontou para o surgimento de uma “cultura bolsonarista”, expressão da barbárie do sistema econômico-político brasileiro que perpassa a degradação dos direitos, o desemprego, o descrédito da população com as instituições e até as reações de cunho mais violentas. As palavras e ações do governo têm buscado fomentar uma cultura que se aproxima do fascismo. Prova disso é que conteúdos relacionados à questão LGBT, ao gênero, ao racismo, ao meio ambiente e etc, são os principais objetos de censura.
 

Titane e Sérgio Pererê conduziram as oficinas de formação artística em teatro e música (percussão, violão, canto, composição, práticas cênico-musicais e artes plásticas), com ênfase no desenvolvimento de um coro cênico. Ainda foram realizadas oficinas de literatura e na área da comunicação, como rádio, serigrafia popular e audiovisual. 
 

A escola contou com a participação de 16 orientadores e espaços de reflexão sobre temas variados: indústria cultural e agronegócio, economia, política e cultura, a música na história do MST e matrizes culturais do Brasil. Sérgio Pererê faz um balanço desse processo. “Foi uma experiência muito poderosa, em vários aspectos. Começando pelo fato de ter um público muito jovem, o que me dá entender que o movimento está se renovando e se ampliando. Uma juventude muito atenta, muito musical e muito artística”. 
 

Ele conta que os elementos utilizados para a criação foram a símbolos da própria luta do movimento. “Tanto a Titane quanto eu não trouxemos elementos, a gente trabalhou com elementos que já existiam dentro. A gente trabalhou a música e o corpo o tempo todo junto. A cultura popular, o Boi. Acabou que durante o processo criou-se um boi maravilhoso, que vai ficar como um totem de proteção”, Sérgio Pererê.
 

O encerramento foi no Armazém do Campo BH, com uma apresentação artística que batizou a Escola com o nome de João das Neves, dramaturgo que lutou contra a ditadura e contra a censura e ajudou a construir a I Escola de Artes da Região Sudeste, em 2017. Agora, a missão da turma é multiplicar os aprendizados realizando oficinas com suas comunidades nos seus estados.

*Editado por Fernanda Alcântara