700 famílias são despejadas pela CODEVASF com apoio do Governo Federal

Reintegrações correspondem aos acampamentos Abril Vermelho, Iranir de Souza e Irmã Dorothy
Foto: Coletivo de comunicação do MST na Bahia

Por Coletivo de comunicação do MST na Bahia
Da Página do MST

A Justiça Federal, através da sentença de reintegração de posse, determinou a retirada de 700 famílias acampadas há mais de sete anos nos acampamentos, produzindo alimentos saudáveis e de qualidade. As famílias foram obrigadas a deixar para trás toda história construída e sonhos semeados ao longo desses anos de luta e resistência, que balizam e fortalecem a economia local.

A irresponsabilidade e a brutalidade do atual Governo faz com que se tema ainda mais resultados como o massacre em El Dourado dos Carajás, Corumbiara e Felisburgo. As famílias foram surpreendidas durante a madrugada com os despejos simultâneos dos três acampamentos no Norte da Bahia.

Foto: Coletivo de comunicação do MST na Bahia

As ações foram iniciadas por volta das 4 horas da manhã pelo Comando de Operações Táticas (COT), pela Coordenação de Aviação Operacional (CAOP), pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), Corpo de Bombeiros Militar e Polícia Militar, entre outros. Eles agiram de forma truculenta, aterrorizando as famílias com bombas de gás lacrimogênio, spray de pimenta e balas de borracha, chegando a atingir um idoso na região da cabeça. Uma jovem foi atingida por estilhaços na cabeça e uma criança de 3 anos de idade ficou com hematomas pelo corpo.

O ataque preparado pelo Estado atingiu famílias que produziam por ano mais de 7.200 toneladas de alimentos, gerando trabalho e renda para mais de 5.000 pessoas.

As áreas despejadas fazem parte do perímetro irrigado Nilo Coelho, Casa Nova, e o projeto Salitre em Juazeiro, que estavam ocupadas desde 2007. Os acampamentos foram estabelecidos em acordo com o Governo Federal, Governo Estadual, o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agraria), a CODEVASF (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) e o Ministério Público.

Á época, foi acordado que os acampados permaneceriam nas áreas até que a CODEVASF disponibilizasse áreas para fins de Reforma Agrária. Mesmo assim, todo o processo a polícia federal foi truculento, com as famílias foram jogadas sem destino e amparo.

“Eu tinha acabado de acordar e fui dar comida às criações, de repente os policiais chegaram, mandando a gente sair e ainda me atiraram”.

Relato de Laurindo Pereira da Silva, conhecido como “Seu Pepeu”, do acampamento Abril Vermelho.

Além dos feridos, mulheres grávidas tiveram que ser levadas as pressas para o hospital, e alguns idosos também precisaram de atendimento médico. Desse cenário, se destaca o ataque e a tentativa de criminalizar ainda mais as lutas sociais e os povos do campo.

O despejo das 700 famílias é um ataque direto à vida, à dignidade, aos direitos fundamentais de camponeses e camponesas que diretamente colocam comida na mesa de milhares de brasileiros.

Produção

Durante a existência dos acampamentos nas áreas dos perímetros irrigados do Vale do São Francisco, os acampamentos influenciavam diretamente na economia de Juazeiro, Casa Nova, Petrolina e cidades circunvizinhas.

A produção diária dos acampamentos chegava a 20 mil quilos de alimentos por dia, 600 mil quilos por mês e 7.200 toneladas por ano. Com uma diversidade de produtos oriundos das áreas de acampamentos, esta produção ia direto para mesa da população. Assim, o crime do trabalhador e trabalhadora rural Sem Terra foi produzir alimentos em grande escala para alimentar a população e gerar emprego e renda para mais de 5.000 pessoas.

Educação

Foto: Coletivo de comunicação do MST na Bahia

A violência do Estado vai além quando se refere à educação. Não só as casas e a produção de alimentos foram destruídas, construídas pelos próprios acampados. Também foram danificadas a Escola Municipal Irmã Dorothy e a Escola Municipal Iranir de Souza, que atendiam crianças com idade escolar entre 6 e 12 anos, em dois turnos, manhã e tarde.

Também foram prejudicados jovens e adultos do Ensino Fundamental II, que estudavam à noite na mesma escola, e os do Ensino Médio e EJA, que se deslocam para estudar em Casa Nova e Petrolina-PE com transporte cedido pelo município de Casa Nova-BA.

Além de interromper o ano letivo das crianças, destruíram o sonho de várias pessoas em ter e poder estudar numa escola do campo, onde já se tinham raízes e amizades e podiam aprender a partir das vivências do dia a dia.

Posição do MST

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) repudia a ação arbitrária, brutal e desumana realizada pela Polícia Federal e Militar, que estava acompanhada por milícia armada.

O ato faz do campo brasileiro um palco de guerra quando o agronegócio, o latifúndio e grandes empreendimentos saqueiam territórios de camponeses, quilombolas, indígenas, ribeirinhos e comunidades tradicionais, com a conivência e inércia dos Governos Federal e Estadual.

Foto: Coletivo de comunicação do MST na Bahia

As reintegrações, que territorialmente chegam a ultrapassar a dimensão de diversas vilas da zona rural e alguns bairros da cidade de Juazeiro/BA, não atinge diretamente apenas as famílias que perdem a sua produção, moradia, educação e vivência local, mas toda a região também.

O Brasil perde não só pelo impacto ocasionado pela reintegração de posse numa área que tem a dimensão de um bairro inteiro: ele perde pela destruição da produção de mais de 20 toneladas de alimentos saudáveis por dia, perde a dignidade por colocar nas ruas mais de 5.000 pessoas Sem Terra, perde por tirar a alegria de crianças, jovens e adultos que, além de produzir alimento, produzem saberes, cultura e transformação social.

“Hoje tentaram acabar com nossas esperanças e destruir nossos sonhos” afirma Ruy Leite, dirigente e morador de um dos acampamentos. “Permaneceremos em luta e resistência, e não abriremos mão de nenhum direito, estaremos a postos e queremos que se faça justiça frente a toda arbitrariedade cometida contra os trabalhadores e trabalhadoras”, conclui.

*Editado por Fernanda Alcântara