Copavi: 27 anos sem cercas e na construção da agroecologia

Cooperativa de Produção Agropecuária Vitória, localizada em Paranacity, noroeste do Paraná, é um exemplo de sonho coletivo que se tornou realidade

“A ciranda, onde nossas crianças aprendem desde muito pequenas o sentido do viver e ser coletivo.”
Foto: Dandara Sturmer

Por Cristiano Czycza*
Da Página do MST

Na sua canção Prelúdio, Raul Seixas nos diz: “…Sonho que se sonha só, é só um sonho que se sonha só. Mas sonho que se sonha junto é realidade…”. E assim nasce, em 10 de julho de 1993, no município de Paranacity (PR), a Cooperativa de Produção Agropecuária Vitória – Copavi, no assentamento Santa Maria. Um sonho sonhado junto, em coletivo. Sonhado por muitas mãos, mentes e corações.

Sonhado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que buscou na fonte das experiências cubanas a cooperação como proposta de organização para os/as camponeses/as Sem Terra. Assim, sonhou e organizou ocupações de terra em todo o Brasil – inclusive no noroeste paranaense.

Sonho sonhado pelas diversas famílias de vários acampamentos no estado do Paraná, que aceitaram o desafio de tornar realidade esse sonho coletivo. 

Sonho sonhado e realidade construída através da solidariedade, aqui plantada, regada e colhida por milhares de pessoas. Por aquelas da sociedade local que apoiaram desde o primeiro dia de acampamento, por aquelas/es Sem Terra que vieram ajudar a derrubar o monocultivo de cana e veneno que esta terra recebia.

Solidariedade nacional e internacional que, por ser um princípio do MST, da mesma forma que recebemos por diversas vezes, assim também oferecemos, com outras famílias acampadas, assentadas, com a sociedade em geral, com o povo do campo e da cidade.

Produção das famílias integrantes da Copavi. Foto: Dandara Sturmer

É com esse sentimento que a COPAVI, neste período de Pandemia da Covid-19, se soma à campanha nacional do MST para doação de alimentos. Até o momento ,a cooperativa e suas famílias já doaram, em diversas ações, 8 toneladas de alimentos e 60 litros de álcool 70%.

As famílias aqui sonharam muitos sonhos, fizeram e fazem esses sonhos se tornarem realidade. Nem tudo foi acertado. Não tem problema, aprendemos com os erros, que mesmo estes, são coletivos. Mas o que aqui existe, e qualquer pessoa que por aqui passar, saberá que é fruto da construção de sonhos coletivos. E muitos são!

A primeira horta do acampamento, a atual do assentamento, é onde se produz parte de nosso alimento. O refeitório comunitário, onde as refeições são partilhadas e confraternizações acontecem. A agrovila, onde as pessoas moram e convivem sem cercas e muros. A ciranda, onde nossas crianças aprendem desde muito pequenas o sentido do viver e ser coletivo. O grupo de jovens, em que nossa juventude se encontram para confraternizar, fazer formação e conversar sobre ser jovem na Copavi e no MST, sobre seus sonhos. O grupo de mulheres, em que as companheiras fazem formação sobre o ser mulher Sem Terra, sobre o combate ao patriarcado e machismo em nossa comunidade e em toda sociedade.

Produção das famílias integrantes da Copavi. Foto Dandara Sturmer

A produção de leite e o laticínio, de onde saem iogurtes, queijos, manteigas, natas… A produção de cana e a agroindústria, onde são produzidos o açúcar mascavo, o melado e a cachaça. A padaria, onde são produzidos os pães, cucas, bolos e bolachas. O escritório, onde é feito nossa comercialização, controles administrativos, compras e apoio às demais atividades. A liberação de militantes, onde a cooperativa se faz presente em tarefas do MST e outras organizações. A liberação para cursos e formações, onde as pessoas podem se qualificar e se formar do ponto de vista profissional, político e pessoal. A decisão política pela Agroecologia, que nos coloca na condição de como camponeses/as produzir alimentos, mas em relação com toda natureza viver e ser, em todas as dimensões, a construção de novos homens e novas mulheres. 

Aqui, onde antes só se produzia cana em monocultivo, agora, sob as mãos de 26 famílias camponesas Sem Terras, os 232 hectares de terras produzem de forma agroecológica, anualmente, 350 toneladas de açúcar mascavo, 80 toneladas de melado de cana, 8 mil litros de cachaça, 10 mil quilos de panificados, 85 mil litros de leite e iogurte, 15 toneladas de hortaliças e 7 toneladas de feijão, mandioca e batata-doce. Seguimos inspirados pela canção Caminhos Alternativos, do companheiro Zé Pinto, que diz: “…Amar a Terra e nela plantar semente, a gente cultiva ela e ela cultiva a gente…”

Estamos em períodos difíceis para toda humanidade. Mas tenhamos a certeza que, como bem temos praticado e aprendido com nosso movimento MST, que, ao sonharmos juntos em coletivo, construiremos muitas outras realidades. Para estes tempos, como bem diz Beto Guedes em trechos de sua canção O Sal Da Terra: “… Vamos precisar de todo mundo, pra banir do mundo a opressão, para construir a vida nova… Vamos precisar de todo mundo, um mais um é sempre mais que dois, pra melhor juntar as nossas forças, é só repartir melhor o pão…”. 

Alimentos produzidos pela Copavi sendo partilhados com famílias vulneráveis da cidade em junho. Foto: Dandara Sturmer

Parabéns, Copavi, pelos seus 27 anos. Nessa data, reafirmamos nosso compromisso com a Reforma Agrária Popular e a construção de um novo projeto para sociedade. 

Lutar, construir Reforma Agrária Popular! 

*Cristiano Czycza, assentado em Paranacity, sócio da Copavi e membro do Setor de Produção, Cooperação e Meio Ambiente do MST/PR. 

**Editado por Fernanda Alcântara