Conheça a história do assentamento mineiro que homenageia Ho Chi Minh

Localizado no município de Nova União, o Assentamento completa 15 anos em setembro, mês da Independência do Vietnã e da morte de Ho Chi Minh

Assentamento Ho Chi Minh. Foto: Agatha Azevedo

Por Fábio Nunes*
Da Página do MST

Nguyen Sinh Cung nasceu em 19 de maio de 1890, na província de Nghê An, no Vietnã, e morou na Rússia e em diversos outros países até retornar ao Vietnã e liderar a luta pela independência. Na França, contribuiu na constituição do Partido Comunista Francês. Devido à repressão, ele mudou seu nome para Ho Chi Minh, como hoje é conhecido, cujo significado é “aquele que ilumina”.

O mês de setembro nos traz pelo menos duas lembranças ligadas diretamente ao grande lutador popular Ho Chi Minh. Primeiramente, o dia 2 de setembro de 1945, com a Independência da República Democrática do Vietnã, marcando um longo período de 15 anos de luta das forças revolucionárias e o fim da colônia francesa Indochina, ficando a parte norte sob o comando das forças de libertação.

Posteriormente, o dia 2 de setembro de 1969 ficou marcado pela morte de Ho Chi Minh, que se tornou ao longo de sua trajetória um grande líder revolucionário e símbolo da luta anti-imperialista. Além destas, o assentamento Ho Chi Minh, local onde eu moro, completa 15 anos de história no dia 16 de setembro.

O processo histórico de lutas até a conquista da terra

A escolha dos nomes dos acampamentos, das escolas e demais estruturas do movimento devem levar em consideração a marca e simbologia das histórias de lutas pela transformação social no mundo. Partindo desse ponto, e tendo como referência o legado do grande lutador vietnamita e a marca do mês de setembro (mês de sua morte) nas ocupações que marcaram a vida das famílias, foi escolhido pela comunidade o nome de Ho Chi Minh para o nosso assentamento.

Mulheres no viveiro do assentamento Ho Chi Minh. Foto: Agatha Azevedo

A primeira ocupação aconteceu na madruga de 23 de setembro de 2002, com a participação de aproximadamente 150 famílias, no município de Pará de Minas (MG). Grande parte das pessoas tinha relação direta com a terra, pois vivenciaram nas décadas de 1970 a 1990 o fenômeno conhecido como êxodo rural, que, por diversos fatores diretamente relacionados à expansão dos latifúndios sobre as pequenas propriedades rurais, deixaram o interior de Minas Gerais em busca de melhores condições de vida na capital mineira.

Antes da ocupação, foram meses de trabalho base visando a organização e formação das famílias nas cidades de Betim, Ibirité e Contagem. Já início de 2003, veio a reintegração de posse, e uma determinação da justiça fez com que as famílias deixassem a área e ocupassem temporariamente parte do acampamento 2 de Julho.

Na busca por um pedaço de chão, as famílias realizaram duas novas ocupações nesse mesmo ano, mas, sem sucesso, foram despejadas novamente de latifúndios improdutivos nos municípios de Juatuba e Esmeraldas, respectivamente. Essas reintegrações marcam o início do governo Aécio Neves no estado, período em que aumentaram as ações de despejo com emprego de força pela polícia militar e os conflitos no campo.

Entre idas e vindas, o desgaste fez com que muitas famílias desistissem do sonho de conquista da terra, que parecia ficar mais distante. Nos anos seguintes intensificam-se as lutas do movimento na região para que essas famílias fossem assentadas. Com isso, foram construídas negociações com o INCRA para desapropriação da Fazenda Belo Horizonte, localizada em Nova União, mas caminhavam lentamente.

O assentamento

Viveiro do assentamento Ho Chi Minh. Foto: Agatha Azevedo

Novamente no mês de setembro, agora em 2005, para dar agilidade ao processo e pressionar o governo a fazer o primeiro assentamento de reforma agrária no município, as famílias ocuparam a área na madrugada do dia 16. Com o avanço das negociações, 37 famílias foram homologadas na terra no mês de dezembro.

O assentamento possui uma área de 786 hectares. Desse total, 200 hectares são destinados à Reserva Legal e 115 hectares de Áreas de Preservação Permante – APP. Ou seja, 40% da área total do assentamento é destinada à preservação e recuperação dos recursos naturais, com grande diversidade de fauna e flora.

A produção

A partir de então grande parte das famílias se dedicaram à produção de banana caturra, seguindo a cadeia produtiva já estruturada no município, que atualmente é um dos maiores fornecedores da fruta na Ceasa de Belo Horizonte.

Cachaça Coração. Foto: MST

Outras famílias se dedicam à produção de cana-de-açúcar, que na agroindústria se transformam em rapadura, açúcar mascavo, melado. O item com maior destaque na produção industrializada é a cachaça de qualidade, chamada de “Coração”, justamente porque no processo produtivo ocorre a separação da cabeça (obtida no início) e a cauda (destilada no final). Ambas contém alta concentração de resíduos tóxicos, sendo direcionadas para a produção de etanol. O “meio” é chamado de coração, o cerne, a qualidade do produto. É conhecida como a melhor cachaça produzida pelo MST no estado.

O assentamento apresenta ainda uma diversidade enorme de produtos, com destaque para hortaliças agroecológicas, mel, própolis, farinhas de mandioca e banana, coloral, açafrão, artesanatos, argila, doces, caponata de umbigo de banana, dentre outros.

Bananinha. Foto: MST

Como parte do Programa Ambiental do Movimento em Minas Gerais, foi construído no assentamento um viveiro florestal que visa a produção de mudas nativas para a recuperação de áreas degradadas nos acampamentos e assentamentos, aumentando a quantidade e qualidade das águas e demonstrando o compromisso com a Reforma Agrária Popular e com a preservação dos recursos naturais.

O Ecoturismo

O assentamento Ho Chi Minh, com grande área verde e muitas nascentes que abastecem o Rio Preto e formam lindas quedas de água em toda a extensão territorial é muito visitado por pessoas do município e de toda a região metropolitana em períodos de calor.

Além das cachoeiras, é possível encontrar construções que caracterizam o período de escravidão vivido pelos negros de nosso país em tempos não muito distantes. Relatos de moradores mais velhos indicam a presença de pessoas escravizadas, relacionando à muros de pedras em vários pontos, porões onde possivelmente eram trancados e transposições de água às margens dos rios.

Há ainda a possibilidade de contemplar a natureza com caminhadas em trilhas que cortam as áreas de mata, passeios de bicicleta e a apreciação de uma tradicional comida mineira junto com as famílias assentadas. O território é a prática da reforma agrária pensada pelo MST, com a memória do lutador Ho Chi Minh e a vida de gerações de famílias sem terra, que vivem e produzem de maneira saudável, e continuam a luta na região.

Confira o vídeo sobre o assentamento:

*Fábio Nunes mora no Assentamento Ho Chi Minh, é do setor de produção, e participa do coletivo de direção regional do MST da região metropolitana em Minas Gerais

**Editado por Fernanda Alcântara