MST realiza a 1ª Plenária Nacional de Educadores da Reforma Agrária

Evento online colocou em pauta os desafios para a construção de uma sociedade autônoma através da educação, analisando os últimos retrocessos

Em agosto, o MST lançou a campanha “Volta às Aulas na Pandemia é Crime!”, que alerta sobre os riscos no retorno às aulas em tempo de coronavírus (Foto: Divulgação/MST)

Por Ludmilla Balduino
Da Página do MST

Mais de 400 pessoas estiveram presentes na 1ª Plenária Nacional dos Educadores e Educadoras da Reforma Agrária, organizada pelo MST e transmitida ao vivo pelo YouTube na tarde desta sexta-feira (23). Além de fazer parte das celebrações em torno do Dia dos Professores (15 de outubro), o objetivo da Plenária foi debater temas pertinentes à educação brasileira na realidade atual.

Para Erivan Hilário, da Direção Nacional do MST pelo Setor de Educação, o momento é extremamente desafiador: “enquanto a pandemia obrigou as escolas a fechar, o governo, com suas políticas ultra neoliberais, tem feito um grande desmonte da política nacional de educação brasileira, desestruturando o MEC, a educação do campo e ameaçando o piso salarial dos educadores”, disse.

Para a Educação do Campo, os desafios são ainda maiores, já que, segundo Erivan, o contexto é bem diferente do urbano. “A pandemia dá essa impressão de que a prioridade é ter condições para a educação remota. Mas no campo é diferente, os professores moram nas comunidades e a gente acredita que educação é relação humana, é contato, é encontro, é conversa, é pedagogia dos gestos. Aula online não faz parte do projeto de educação no campo que a gente acredita. Nossa educação pressupõe relação com a natureza, com a comunidade, espaços de organização coletiva”.

Jailma Lopes, do Coletivo de Juventude do MST, reforça que desde o início da pandemia, as ações de solidariedade têm sido o principal método de formação da Juventude Sem Terra. “Todas as atividades que aglomeram pessoas estão suspensas, por isso o que temos potencializado são as ações em torno do isolamento produtivo”, diz, referindo-se especialmente aos cursos online que o MST tem disponibilizado na plataforma “Formação em Tempos de Corona”.

A plenária começou com Clarice Santos, professora da UnB integrante do Fórum Nacional de Educação no Campo (Fonec), que alertou sobre a padronização na formação de educadores e educandos, imposta através de reformas curriculares do atual governo que colocam, entre outros quesitos, uma metrificação do processo de ensino. “Esse modelo de gestão educacional neoliberal, focado na responsabilização individual dos professores, é uma forma de manter o controle sobre as escolas, que perdem a autonomia. Em vez de falar no direito à educação, o governo fala no direito ao aprendizado, que significa formar apenas mão-de-obra alienada para suprir demandas do mercado de trabalho.”

A professora destacou ainda elementos sobre o contexto atual, que é de total desmonte de todas as formas de pensamento autônomo: além do fechamento de escolas, de turmas e de turnos, que se agravou na pandemia, as escolas estão sendo precarizadas para oferecer o básico e, por outro lado, grandes empresas de comunicação seguem o lobby para vender pacotes tecnológicos. Isso sem contar com a extinção do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), que nos seus 22 anos de vigência, já teve um orçamento de 70 milhões. Mas, como vem sendo desmontado, para o ano que vem, vai receber um aporte de 20 mil reais.

Mesmo com tantos ofensivas, Clarice tem se reunido com escolas do campo e diz que estão organizando um observatório para monitorar, junto ao Ministério Público Federal, o fechamento de escolas no Brasil. “Todas as propostas do governo ferem os princípios constitucionais de educação emancipatória. Fere até mesmo o direito de acesso à educação”, disse.

Por fim, Clarice convocou os trabalhadores da educação do campo para focar na base: “não adianta somente acionar o judiciário. Professor tem de ser militante”. Para ela, a força organizada de mães, pais e estudantes, é determinante no processo atual de resistência. 

Também é preciso, segundo a professora, fortalecer os sindicatos de professores municipais, estaduais e do ensino superior. “Tudo que nós conquistamos até aqui foi com a nossa organização e mobilização. O momento atual nos convoca, mais do que nunca”.

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Em seguida, Daniel Cara, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, expôs os números que comprovam a importância fundamental da educação no Brasil: há, no país, 55 milhões de pessoas que vão às escolas para estudar ou trabalhar. São 51 milhões de estudantes e 4 milhões de trabalhadores. Isso corresponde a mais de 25% da população.

Com um número tão elevado, é fácil perceber que os investimentos em educação também precisam ser elevados. “Para melhorar a qualidade, as condições de ensino e de aprendizado, é preciso aumentar o gasto público. O Brasil precisa de cerca de R$ 100 bilhões a mais em investimento em educação básica”, disse.

Por último, João Pedro Stédile, da Coordenação Nacional do MST, propôs imaginar o futuro a partir da observação histórica, e não apenas nos atermos à “mediocridade da luta de classes cotidiana”.

“O capitalismo está em crise. O governo bolsonarista está isolando-se do resto do planeta, e a burguesia brasileira não tem projeto de país. Este é o momento ideal para a renascença das lutas de massa, que não acontecem no Brasil desde 1989”.

Para concretizar essa renascença, é preciso, segundo Stédile, seguir com as ações de solidariedade, como, por exemplo, construir programas de educação baseados no Pronera, sem esperar o auxílio do governo (até porque ele não vai vir). Também colocar fundações sólidas no trabalho de base nas periferias urbanas, criando programas de formação política em todos os ambientes possíveis. 

“Em tempos de crise, cabe à classe trabalhadora se preparar. Em tempos de crise é que se forja a têmpera do militante, que não vai se deixar influenciar pela Globo. É o momento de transformar o militante em inquebrantável”.

A plenária teve a participação de mais educadores do MST, como Edgar Jorge Kolling, que pediu aos participantes para prepararem-se não para uma maratona, mas uma jornada de lutas que deve durar anos ou até gerações. “É o tempo de reafirmar a nossa rebeldia”, disse.

A animação do evento ficou por conta dos artistas Zé Pinto e Marquinhos, que, ao som de voz e violão, cantaram músicas com letras relacionadas à força da luta do povo pela educação libertadora.

Clique aqui e assista à gravação da 1ª Plenária Nacional dos Educadores e Educadoras da Reforma Agrária.

*Editado por Gustavo Marinho