Agrotóxicos

Entidades e Movimentos se mobilizam contra a flexibilização da lei dos agrotóxicos no RS

Pedido é para que o governo gaúcho arquive o PL 260 que tramita na Assembleia
Agrotóxicos – Foto: Agência Brasil

Por Leandro Molina
Da Página do MST

A Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa realiza audiência pública, nesta quinta-feira (20) às 10h, para debater o funcionamento dos serviços públicos de cadastramento, licenciamento, controle, fiscalização de agrotóxicos e o Projeto de Lei (PL) 260/2020. A audiência foi proposta pelos deputados petistas Edegar Pretto, Jeferson Fernandes e Zé Nunes.

O principal ponto de discussão será o PL 260, do Poder Executivo, que tramita na Assembleia com a proposição de alterar a Lei Estadual nº 7.747/82 sobre o controle de agrotóxicos e outros biocidas. Deputados, ambientalistas e especialistas da área da saúde consideram um retrocesso ambiental a retirada da exigência legal de somente admitir o uso no estado de agrotóxico que seja autorizado no país de origem, regra que constitui uma barreira a produtos que foram proibidos em países sedes das empresas fabricantes. “A lei de 1982 foi um momento de afirmação de um RS que nos orgulha, pois estabeleceu uma regra que colocou o Estado no mesmo patamar dos países europeus que estavam proibindo princípios ativos causadores de doenças como mutações genéticas, câncer, distúrbios no sistema nervoso e hormonal, entre outros problemas de saúde” afirma o deputado Zé Nunes.

Em dezembro do ano passado, a Frente Parlamentar Gaúcha em Defesa da Alimentação Saudável chamou às pressas uma reunião virtual que reuniu mais de 150 entidades e emitiram um documento pedindo a retirada do regime de urgência e ampla discussão com especialistas sobre essa matéria. Esse mesmo documento acabou recebendo o apoio de mais de 230 entidades ligadas à saúde, segurança alimentar, de produtores de alimentos, ambientalistas, universidades e especialistas.

Em fevereiro deste ano, os deputados Edegar Pretto e Zé Nunes foram recebidos pelo governador Eduardo Leite no Palácio Piratini, numa reunião com participação de representantes do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea RS) e Conselho Estadual de Saúde. Eles entregaram ao governador o documento com as assinaturas, pediram o fim da urgência e que o projeto fosse arquivado. Leite atendeu ao pedido para retirada da urgência com a garantia de seguir o debate aberto com o parlamento e com a sociedade, mas o projeto seguiu tramitando na Assembleia. Essas entidades continuam mobilizadas após a retirada do regime de urgência e agora novamente solicitam o arquivamento do PL 260.

A contrariedade do conjunto está na proposta do governo gaúcho, que altera a atual lei estadual, de autoria do então deputado Antenor Ferrari (MDB), aprovada em 1982 por parlamentares de todos os partidos. A lei impede que agrotóxicos banidos em países sedes dos fabricantes sejam aplicados nas lavouras do estado. A flexibilização da lei de controle dos agrotóxicos no RS é rechaçada pelas entidades e movimentos. O argumento é que desde sua aprovação, na década de 1980, a lei estadual ganhou repercussão nacional e mundial por ser a primeira lei de controle de aplicação de venenos agrícolas e insumos químicos, por agricultores, na produção de alimentos em países considerados de terceiro mundo.

Presidente da Comissão de Segurança e Serviços Públicos e coordenador da Frente Parlamentar Gaúcha em Defesa da Alimentação Saudável, o deputado Edegar Pretto lembra que, somente nos últimos dois anos, quase mil novos agrotóxicos foram registrados no país, o que motivou críticas de diversos setores do campo da saúde, nutrição e meio ambiente.

“Não podemos ir na contramão mundial. Ao propor alterar a legislação, o PL 260 representa um gravíssimo retrocesso na proteção ao meio ambiente, saúde e produção de alimentos”, avalia Pretto.

Pelos dados oficiais, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Em 2011, a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida divulgou que cada brasileiro consumia cerca de 5,2 litros de agrotóxico por ano. Para chegar ao número, a organização não-governamental dividiu o número de 1 bilhão de litros de pesticidas vendidos a cada ano pela população brasileira na época, de 192 milhões. Em 2013, foram 495,7 mil toneladas de pesticidas vendidos, enquanto em 2017 o número chegou a 539,9 mil toneladas. Em 2016, superou 541,8 mil toneladas vendidas. Hoje, o país consome mais de 550 mil toneladas de veneno por ano, e há levantamentos que consideram a utilização de produtos de forma clandestina, totalizando mais de 800 mil toneladas de agrotóxicos por ano.

Para o deputado Jeferson Fernandes a pauta “é uma questão de saúde pública. Flexibilizar o uso de agrotóxicos ainda mais, é envenenar a mesa e o corpo das pessoas que consomem esses produtos. Precisamos de mais agroecologia e diminuição do uso de produtos tóxicos na alimentação. Pauta este assunto é nossa responsabilidade”.

O prosseguimento da tramitação do PL 260, que pode alterar a lei atual, gerou centenas de manifestações. Pessoas têm enviado e-mails e mensagens de WhatsApp aos deputados e deputadas, pedindo que votem contra o projeto. As bancadas do PT e PSOL já se posicionaram contrárias ao PL, pelos impactos que representa à saúde e ao meio ambiente. Outras ações também estão sendo realizadas para sensibilizar a sociedade e alertar sobre os riscos do projeto, como reuniões virtuais de mobilização com setores técnicos, acadêmicos, profissionais da saúde, agricultores ecologistas e ambientalistas. Alguns ativistas da Frente Cidadã Contra os Agrotóxicos protestaram em frente ao Palácio Piratini e Assembleia Legislativa, com faixas e vestidos com macacões e máscaras. Os ativistas também fazem intervenções em feiras, como a Feira Ecológica do Bom Fim, e conversam com consumidores.

O evento, em formato virtual por conta da pandemia, contará com a participação da Dra. Larissa Mies Bombardi, da Universidade de São Paulo (USP). Em março deste ano, após diversas intimidações, Larissa saiu do país para proteger sua vida e a de seus filhos. As perseguições passaram a acontecer após maio de 2019, quando Larissa publicou na Europa a versão em inglês do atlas Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia. Outro convidado confirmado é o Dr. Wanderlei Antonio Pignati, médico, professor e pesquisador do Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT).

Também foram convidadas representações de órgãos como a Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (Seapdr), Casa Civil, Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), Fepam, Superintendência do Ministério da Agricultura (Mapa), Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público Estadual (MPE), Tribunal de Contas do Estado (TCE), Emater, Federação das Associações dos Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), associações regionais de municípios, Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), movimentos de defesa do Meio Ambiente, Comissão de Direito Ambiental (CDA) da OAB/RS, Federações da agricultura, Universidades, Conselhos de Saúde, Meio Ambiente e Direitos Humanos, Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável (Consea-RS), e entidades e instituições que realizam pesquisa e trabalho na área.

A audiência poderá ser acompanhada ao vivo pela TV Assembleia, canal 11.2, e pelo canal do parlamento no YouTube.

*Editado por Fernanda Alcântara