Carestia

Entenda o que é inflação e os fatores que contribuem para o seu aumento

Economista Ana Giorgina é supervisora técnica do Dieese na Bahia e explica o assunto
Consumidor sente todos os dias o aumento nos preços: inflação mantém ritmo de alta. Foto: AFP

Por Gabriela Amorim
Do Brasil de Fato

Você sabe o que significa inflação e por que ela aumenta ou diminui? Para explicar essa e outras questões, o Brasil de Fato entrevistou Ana Giorgina Dias, economista e supervisora técnica do escritório regional do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) na Bahia.

Brasil de Fato Bahia: O que é a inflação e como ela é calculada?

Ana Giorgina Dias: A inflação é a alta generalizada de preços. Na verdade, inflação é um índice. Todos os meses os institutos de pesquisa que fazem o cálculo da inflação se dirigem a diversos locais de compra, diversos locais que vendem produtos e serviços e, a partir de uma amostra, todos os meses eles retornam para verificar se os preços aumentaram ou diminuíram em relação ao mês anterior. Então, na impossibilidade de ir em todos os lugares, de pesquisar todos os preços, como eu disse antes, existe uma amostra.

Essa amostra é uma tentativa de capturar, da forma mais fiel possível, o consumo das famílias, de acordo com as faixas de renda. Por isso que tem diferença entre os índices. O próprio IBGE tem o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). A diferença entre os dois é basicamente a renda: enquanto o INPC pesquisa preços para preços entre 1 e 8 salários mínimos, o IPCA calcula entre 1 e 40 [salários mínimos].

Contexto: Por que os preços não param de subir?

E a diferença basicamente é que o INPC foi criado lá em 1979 para balizar as negociações salariais dos trabalhadores, e o IPCA é índice oficial de inflação adotado pelo governo. Então, basicamente o cálculo é feito assim: todos os meses esses locais são visitados, os produtos que fazem parte da mostra de diversos grupos diferentes de bens e serviços são pesquisados e aí é apurado se há uma elevação geral nos preços ou uma tendência maior de elevação do que de queda, que é a inflação, ou se predominantemente os preços caíram, que seria a deflação.

Ana Giorgina destaca o impacto da inflação para os trabalhadores que têm menor renda ou que estão desempregados. Foto: Reprodução

Ela também influencia nos valores de aluguel e financiamentos, por exemplo? 

Sim, a inflação, na verdade, não é uma medida homogênea. Embora nós tenhamos diversos índices, esses índices são elaborados metodologicamente de forma diferente para capturar movimentos diferentes entre esses bens, produtos e serviços na economia. Normalmente, o índice que reajusta o aluguel é o IGP-M, que é um índice diferente dos que eu falei anteriormente.

Porque basicamente o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), todos os meses pesquisado pela FGV, mede diversos movimentos na economia, não só os preços para consumidores. Ele tem o Índice Nacional da Construção Civil (INCC), por isso até que ele é usado para aluguel; ele tem o Índice de Preços no Atacado; e o Índice de Preços ao Consumidor. Ele é um conjunto de três experiências, por isso que ele é utilizado para, por exemplo, calcular as variações de preços de aluguel, porque ele leva em consideração preços da construção civil.

Como ela influencia no poder de compra dos trabalhadores e trabalhadoras?

A inflação tem um impacto gigantesco no orçamento, na renda, na vida das pessoas de um modo geral, sobretudo dos trabalhadores. A gente ressalta os trabalhadores, porque nós, normalmente, temos correções salariais muito limitadas no tempo, geralmente uma vez a cada ano, na data-base. O salário mínimo também, uma vez, todo janeiro.

Então, se a gente tem uma tendência de elevação da inflação, uma inflação em alta, isso significa dizer que, como meu salário é reajustado em poucos momentos, ou em um único momento no ano, e há casos em que nem acontece o reajuste, então, quanto mais os preços se elevam, mais o meu poder de compra fica reduzido.

Porque basicamente minha renda permanece a mesma, em termos nominais, quer dizer, quanto eu recebo todo mês, mas, em termos reais, de fato quanto compra, isso vai reduzindo mês a mês — dia a dia, na verdade —, à medida que a inflação vai aumentando. Então, por isso que o impacto é enorme. O impacto para a sociedade como um todo, mas sobretudo para os trabalhadores; e mais ainda para os trabalhadores que têm menor renda ou que se encontram desempregados.

Combustíveis voltaram a puxar alta dos preços. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

BdF BA: O que faz a inflação crescer tanto como nesse momento?

Nesse momento, especificamente, a gente tem um conjunto de fatores atuando para que a inflação se eleve. Primeiro de tudo, nós temos uma alta nos preços, sobretudo dos insumos. Isso é uma questão que não está localizada apenas no Brasil.

Internacionalmente, nós estamos em um momento em que o preço de algumas matérias-primas e de insumos têm se elevado bastante por diversos fatores, inclusive, pelo próprio impacto da pandemia, uma vez que a cadeia de produção acabaram se desorganizando um pouco. E por outros motivos também, a gente poderia dizer, no caso do petróleo, que a gente tem uma guerra que afeta um dos maiores produtores, que é a Rússia e acaba tendo impacto no preço do petróleo.

Para nós aqui no Brasil, além da guerra, e muito antes da guerra até, tem uma outra questão que é o fato de a Petrobras ter adotado uma forma de colocar seus preços que chama “política de paridade de importação” (PPI).

Por essa forma de formar seus preços, a Petrobras decidiu acompanhar as variações no preço do petróleo do mercado internacional. Então, por exemplo, nesse momento, temos o petróleo em alta, inclusive por conta da guerra, significa dizer que a tendência dos preços do petróleo e sobretudo dos derivados aqui no Brasil se elevem também.

Fora isso, nós também estamos importando uma quantidade de derivados de petróleo. E como nossa moeda é desvalorizada em relação ao dólar, que é a moeda do comércio internacional, significa também que a gente paga o custo do câmbio nesses preços. E eu estou falando muito de combustíveis, porque esses são itens bastante importantes na produção, seja como insumo — caso dos transportes tanto de passageiros quanto transporte de mercadoria.

A própria questão da geração de energia elétrica, tem vários momentos em que as termelétricas, majoritariamente movidas a diesel, precisam ser ativadas. Então, o combustível acaba tendo um peso grande.

Mas também, exatamente como efeito dessa alta no preço de produtos primários, nós aqui no Brasil somos exportadores de alguns desses produtos, sobretudo, os agrícolas, como esses produtos têm tido alta de preços no mercado internacional e uma maior demanda, já com problema de oferta de alguns produtos no mercado, e também pelo fato de a nossa moeda estar desvalorizada em relação ao dólar, nossas exportações ficam mais atraentes ao mercado internacional, porque a desvalorização do real tornam o nosso produtos mais baratos, mas também, para os exportadores, até para aproveitar esse efeito do câmbio, mas, sobretudo, pela alta na cotação dos produtos, tem sido mais vantajoso, exportar do que vender internamente.

Então, produtos, por exemplo, como a soja, que o Brasil está entre os maiores produtores, nós somos produtores e exportadores de soja, mas em alguns momentos, nós precisamos importar soja para fazer óleo. Isso é um dos motivos que explica por exemplo a alta grande nos preços do óleo de soja. Isso também tem acontecido com a carne bovina, com proteína animal de modo geral, e outros produtos como café. Isso também é um efeito. Na verdade, então, é um conjunto de muitos fatores que tem feito nossa inflação, nesse momento, subir tanto.

Edição: Elen Carvalho/ Brasil de Fato