Mentiras

Mulheres Sem Terra rebatem fala de Bolsonaro no Jornal Nacional

Em nota, camponesas repudiam comentário, principalmente ao mencionar que “teria pacificado o MST com a titulação de terras e que as mulheres foram as maiores beneficiadas”
Jornada de Luta das Mulheres Sem Terra 2022. Foto: Acervo MST

Da Página do MST

Nós, Mulheres Sem Terra, nos expressamos conjuntamente enquanto Setor de Gênero do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em repúdio ao pronunciamento feito por Jair Bolsonaro, em cadeia nacional televisiva, durante o Jornal Nacional da Rede Globo, nesta segunda-feira (22).

Principalmente, em relação à fala em que ele menciona que “teria pacificado o MST com a titulação de terras e que as mulheres foram as maiores beneficiadas.”

Frente a isso, denunciamos que o governo Bolsonaro sucateou o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra); paralisando as políticas de Reforma Agrária, não assentando nenhuma família Sem Terra no país em mais de três anos de governo e, ainda, potencializou os conflitos e o aumento da violência no campo, além de estimular o desmatamento e a destruição do meio ambiente. 

Ou seja, suas ações não trouxeram qualquer benefício às mulheres, muitos menos às mulheres camponesas, pelo contrário, impactaram profundamente sobre suas vidas, aumentando as ameaças à sua segurança alimentar e física.

Sobre a titularidade e as mulheres

A titulação de terra, da qual Bolsonaro se referiu durante a entrevista, está longe de representar uma política de Reforma Agrária. Trata-se de uma ação de privatização, que tem como foco o desmonte da luta pela terra e da permanência nela, desvinculando as famílias de programas de benfeitorias, crédito e formação e abandonando-as à própria sorte, para enfrentar o assédio do agronegócio sobre os territórios.

Diante de todos esses ataques, lembramos ainda, de uma conquista importante que as mulheres assentadas tiveram durante o governo de Lula e Dilma do Partido dos Trabalhadores (PT), foi justamente ter o nome das mulheres na titularidade conjunta no acesso à terra e como beneficiária assentada da Reforma Agrária.

Política de Bolsonaro impacta profundamente sobre as vidas das mulheres Sem Terra, aumentando as ameaças à segurança alimentar e física. Foto: Geanini Hackbardt

Com a titularidade conjunta, em caso de separação familiar ou mudança no núcleo familiar, o lote passa a ficar preferencialmente com as mulheres, principalmente, porque em uma sociedade machista como a nossa, a questão dos cuidados com os filhos recai com muita força, geralmente sobre as mulheres.

A partir dessa conquista, as mulheres Sem Terra tiveram o direito do acesso à terra garantido em lei. O que foi fundamental para diminuir os índices de violência doméstica, e dos casos de machismo contra as companheiras. Portanto, essa foi uma política estruturante e bem importante dos Governos Lula e Dilma.

Mas, com a imposição da titulação por Bolsonaro houve um grande recuo sobre esses direitos conquistados pelas mulheres Sem Terra, por quê? Se na condição anterior elas estavam mais empoderadas, porque a titularidade conjunta representou uma política estruturante que teve efeito positivo em todos os assentamentos, a titulação tem efeito inverso disso, retirando a condição de protagonista das trabalhadoras Sem Terra, em relação à terra que elas conquistaram na luta conjuntamente com o companheiro e a família.

Feira da Reforma Agrária. Acervo MST

Isso porque com a titulação de Bolsonaro, em caso de separação familiar ou qualquer mudança no núcleo familiar, logo se impõe a questão da venda da terra e 50% para cada um. Então, assim se diminui novamente o empoderamento das mulheres camponesas e o próprio direito das crianças, adolescentes e dos jovens em permanecer na terra conquistada a partir da luta conjunto do MST.

Antes dessa política de titulação de Bolsonaro, a terra conquistada a partir da luta pela Reforma Agrária ficava com a mulher, e as crianças, adolescentes e os jovens, que também tinham o direito garantido de permanecer nessa terra futuramente. Por isso, a política de titulação desse governo é um ataque aos direitos das mulheres e da juventude, justamente ao contrário do que Bolsonaro tentou propagandear em sua fala no JN.

Legado de lutas do MST

Ainda assim, diante dos ataques das políticas de Bolsonaro e da incitação pública de violência contra as e os Sem Terra, seguindo nosso legado histórico, mantivemos as lutas de enfrentamento e resistência, denunciando a violência no campo e contra as mulheres, realizamos ocupações de terra, marchas, atos, além de prestar nossa solidariedade ativa com a classe trabalhadora durante este grave momento de crises que se aprofundam no Brasil.

E  pautamos a construção de políticas públicas, que de fato correspondam às necessidades dos povos Sem Terra e dos demais povos do campo, das águas e das florestas.

Durante este últimos anos, mais do que nunca, nosso princípio de solidariedade nos impulsionou a organizar a produção de alimentos e sua doação, atendendo à população que está em situação de vulnerabilidade e fome. Processo este conduzido, em grande parte, pelas Mulheres Sem Terra.

Por isso, afirmamos mais uma vez que Bolsonaro mente inescrupulosamente diante da população brasileira, pois, como diz o poeta Pedro Tierra: “A liberdade da Terra e a Paz no campo têm nome: Reforma Agrária”. E nós, mulheres e homens Sem Terra, seguiremos em luta até que ela se efetive.

Setor de Gênero do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
23 de agosto de 2022

*Editado por Solange Engelmann