Escola do Campo

MST realiza ato de reconstrução da Escola Popular Eduardo Galeano, em Minas Gerais

Escola do campo destruída durante despejo segue sendo reconstruída por muitas mãos, apoio e solidariedade internacionais, no acampamento Quilombo Campo Grande, Sul de Minas Gerais
Ato político-cultural de reconstrução da Escola Popular Eduardo Galeano. Fotos: Edvan Feitosa

Por Matheus Teixeira
Da Página do MST

Durante o último domingo (20), o MST organizou um ato político-cultural de reconstrução da Escola Popular Eduardo Galeano, destruída durante o despejo arbitrário acometido contra as famílias do Acampamento Quilombo Campo Grande, em Campo do Meio, Sul de Minas Gerais, em agosto de 2020 durante o pico da pandemia, a mando do governador Romeu Zema (Novo).

A escola que se ergue novamente é fruto da construção coletiva de trabalhadores e trabalhadoras que doaram dias de serviço destinados à reconstrução do prédio, e da solidariedade nacional e internacional de pessoas e entidades que reconhecem o papel da educação na vida e formação de novos sujeitos. Logo após o despejo, foi realizada uma campanha de solidariedade para reconstrução da Escola Popular Eduardo Galeano. Confira no vídeo.

A mobilização em torno da reconstrução da escola não se dá a partir do despejo em agosto de 2020, mas sim intensificar uma relação de parceria e solidariedade já existente na luta pela Reforma Agrária Popular, no Sul de Minas Gerais.

Para Esther Hoffman, da coordenação estadual do MST em Minas Gerais, “a solidariedade vem muito no sentido da luta de reconstrução do Quilombo, toda a mobilização em torno da escola, foi mais uma ação de solidariedade, um compromisso da luta de classe, organizada por indivíduos, coletivos, apoio internacional na arrecadação de recursos e doações de materiais, um compromisso individual e coletivo com a educação do campo e com a reforma agrária”.

Ato reafirmou o compromisso do MST com a Educação do Campo. Foto: Tatiana Plens

O ato político cultural que contou com participação de cerca de 700 pessoas, reafirmou o compromisso do MST e de todos aqueles que acreditam na qualidade e potencialidades da Educação do Campo, de seguir lutando para que todos os brasileiros tenham acesso à educação básica, de qualidade, e que nenhuma escola seja fechada.

A atividade contou com a presença do deputado estadual Luizinho (PT) e do prefeito de Campo do Meio, Samuel (PSD), ambos reafirmaram o compromisso de seguir lutando pela reforma agrária popular, acesso à terra, educação pública e repudiam a destruição de escolas. Além de artistas do campo da música como Aline Calixto, Zé Pinto, Guê Oliveira, Dandara, Fernando Guimarães, e o Coletivo Fuzuê, grupo de teatro universitário da Universidade Federal de São João del-Rei, que animaram a tarde do evento.

Escola Popular Eduardo Galeano

A escola que antes de destruída compartilhava saberes acadêmicos e populares a crianças, jovens e adultos, se ergue a cada dia com mais força, as trocas de sabenças agora se reafirma no método a alfabetizar, compreender o mundo e como as relações que o constituem são construídas. O espaço sempre teve como princípio a pedagogia da educação popular, agora mais que nunca incorpora os princípios da agroecologia e se tornará um polo de agroecologia regional.

“A reconstrução da nossa escola Eduardo Galeano é a realização de um grande sonho, sonho que não é só nosso, é do conjunto da classe trabalhadora. É um sonho que a gente vêm construindo a muitas mãos, há muito tempo”, conta Tuira Tule, da direção estadual do MST em Minas Gerais.

Parte do prédio da escola sendo reconstruído. Fotos: Edvan Feitosa

Tuira explica ainda, que junto aos movimentos populares da região, a ideia é que a escola seja o polo de agroecologia da região sul e sudoeste de Minas Gerais, para que o espaço possa fortalecer as politicas públicas em agroecologia, e seja o pivô de outras, fortalecendo assim as denuncias ao agronegócio, de trabalho análogo a escravidão de forma intensiva na região sul mineira. Em contrapartida, ela acredita que seja esse também o espaço de anúncio do projeto de desenvolvimento à partir da agroecologia, onde o ser humano tenha centralidade junto à natureza.

Escola Eduardo Galeano antes e após o despejo de 2020. Fotos: MST MG

Histórico

Desde 2012 o Setor de Educação do MST através de parceria com o Instituto Federal do Sul de MG (IFMG), consolidou e formou duas turmas de técnicos em agropecuária, construindo de acordo com a educação popular. O curso funcionava na metodologia de alternância, dividido entre tempo escola e tempo comunidade, onde os educandos realizavam atividades no espaço da escola, um prédio que foi abandonado quando a Usina Ariadnópolis e faliu.

Desde o ano de 2014, o setor de educação trabalhou para abrir formalmente a Escola Popular Eduardo Galeano com objetivo de atender agricultores familiares do entorno, crianças, assentados e acampados da Reforma Agrária. A escola foi toda reformada e reconstruída através de mutirões da comunidade e campanhas de arrecadação de materiais. Como dona Ricarda sempre diz, “o espaço havia se transformado em um curral, nós reformamos toda a estrutura, plantamos sementes de esperança”.

Em 2016, a escola popular foi oficializada como uma escola estadual, atendendo adolescentes de 11 a 14 anos e adultos, chegando a possuir quatro turmas em funcionamento, com destaque para turma de educação de jovens e adultos, (EJA), que possuía a grade curricular voltada para os moldes da escola do campo. Além de alfabetizar adultos e idosos que puderam escrever suas primeiras palavras, como José Rodrigues de 75 anos, uma das 14 famílias despejadas em 2020, mediante a ação de reintegração de posse, de forma ilegal e arbitrária.

O representante da empresa do autor da ação contra o MST esteve junto ao fiscal, oficial de justiça no ato de vistoria e demarcação da área a ser reintegrada, mostrando novamente o poder do agro mediante a justiça. Em 2019, Zema ordenou a suspensão das aulas no Quilombo Campo Grande quando assumiu o cargo, em reunião com a comunidade, alegou cortes de gastos, mostrando que desde o início de seu governo a educação do campo não seria prioridade.

Escola sendo esvaziada no dia do despejo. Foto: Arquivo MST

Na manhã do dia 12 de agosto de 2020 a escola foi invadida por policiais militares vindos de diversas regiões do estado, onde foi ordenado que no prazo de uma hora a escola fosse esvaziada. Iniciaram-se as intimidações contra as crianças, trabalhadores e trabalhadoras que ali estavam. Com medo de perder os livros, mesas, fogão, geladeira e todo o material de secretaria que ali estavam, um mutirão foi organizado para retirar todos os pertences antes que a escola fosse demolida.

Despejo iniciado após mais de 36 horas de resistência das famílias acampadas, mobilização a nível internacional em defesa do Quilombo Campo Grande, muitas lágrimas e tristeza somadas ao enorme sentimento de indignação. A comunidade não acreditava que o espaço físico seria destruído, pois a estrutura também tinha uma importância histórica para toda a população de Campo do Meio. O que não impediu o avanço das tropas e tratores blindados que destruíram para além do prédio da escola, casas, lavouras e toda infraestrutura construída pelas 14 famílias despejadas, que viram o esforço de anos vindo ao chão.

“A justiça é como uma serpente, só morde os pés descalços” Eduardo Galeano

A escola popular recebe o nome e homenageia um dos grandes intelectuais da esquerda que contribuíram na compreensão das mazelas do continente, analisando a América Latina desde sua origem. Eduardo Galeano (1940-2015) foi um escritor e jornalista uruguaio, autor do livro “As Veias Abertas da América Latina”, uma obra que exerceu profunda influência no pensamento de esquerda latino-americano.

*Editado por Solange Engelmann