Cultura

Parabéns aos 134 anos do filósofo popular Mestre Pastinha

“Com a força e a representatividade”, Pastinha é referência ancestral
Foto: Reprodução

Por Wesley Lima
Da Página do MST

Nascido no dia 5 de abril de 1889, em Salvador, na Bahia, Vicente Ferreira Pastinha, conhecido como Mestre Pastinha, foi filho do espanhol José Señor Pastinha e da baiana Eugênia Maria de Carvalho. Pastinha foi apresentado a capoeira quando ainda era uma criança e deixou sua marca não somente na história dessa expressão popular brasileira, mas também para toda cultura afro-brasileira em geral.

Quando adulto, Mestre Pastinha foi responsável pela difusão da capoeira Angola, dando valor ancestral e visibilidade popular. Essas duas dimensões são extremamente importantes, porque a capoeira sofria um enfraquecimento pela emergência e popularização da Capoeira Regional. Por isso, fundou o Centro Esportivo Capoeira Angola (CECA), localizado no Largo do Cruzeiro de São Francisco, a primeira escola de capoeira Angola.

João Bob Roceiro é professor, militante do MST e capoeirista, membro da Escola de Capoeira Angoleiros do Sertão, em São Paulo. Ao olhar para trajetória, referência cultural e ancestral do Mestre Pastinha, ele afirma que sua importância é gigantesca. “Ele é a principal referência histórica da capoeira Angola no Brasil. Quando se fala em capoeira Angola você já pensa no Mestre Pastinha. Provavelmente ele não era o único. Ele sempre falou de outros capoeiristas e mestres angoleiros, como o Mestre Valdemar. Porém, ele se tornou essa principal referência ancestral”.

Ele explica que a partir dos ensinamentos do Mestre Pastinha, outros mestres foram dar seguimento para essa categorização da capoeira Angola, com o objetivo de trazê-la à atualidade “com a força e a representatividade”. E continua: “talvez uma das questões que diferencia o Pastinha de outros mestres de capoeira, de outros angoleiros, seja a sua capacidade de desenvolver uma escola de capoeira, com um método de ensino e metodologias de trabalho para ensinar a capoeira Angola”.

João Bob Roceiro. Foto: Arquivo Pessoal

Outra questão apontada pelo capoeirista foi a capacidade do Pastinha formar discípulos, com destaque para o Mestre Curió, Mestre Boca Rica, Mestre João Grande e Mestre João Pequeno. “Talvez essa seja uma das principais diferenças do Mestre Pastinha dos demais e talvez seja essa a importância principal dele que o transformou nessa figura ancestral da capoeira Angola”, reforça.

Ele conta ainda que esse resgate a partir dos anos 90 demonstra uma importância social, pois “como disse o Mestre Felipe de Santo Amaro, acredito que isso seja uma verdade, ‘a capoeira angola vive no corpo do capoeirista’”, destaca João Bob.

Capoeira Angola e Regional

Pensando nessas questões, é importante diferenciarmos a capoeira de Angola da Regional. A Angola é o estilo original que era praticado pelos pretos escravizados. Essa maneira de jogar capoeira é caracterizada por ser mais lenta, composta de movimentos furtivos e executados de modo rasteiro.

Já a capoeira Regional é o estilo contemporâneo, que possui atributos de outras artes marciais em sua prática. Esse estilo foi criado pelo Mestre Bimba e difundiu-se rapidamente pelo mundo, aumentando o número dos adeptos da capoeira em vários países.

João Bob explica que não é simples essa diferenciação. “Se a gente perguntar para dez capoeiristas, teremos dez respostas diferentes”, diz.

“A diferença principal para mim é que a capoeira Regional é mais marcializada, ela vem do contato com as artes marciais, uma luta, os golpes, a criação do Mestre Bimba, foi trabalhado como uma arte marcial mesmo. E a capoeira Angola, em um contraponto, foi constituída como uma manifestação cultural, que abrange mais elementos que a marcialidade. Tem a marcialidade, enquanto luta na capoeira Angola, mas ela também se disfarça de dança, ela também é um jogo. A questão da musicalidade, da instrumentalização, dos toques, é tão importante quanto fazer um jogo ou lutar de forma elegante, eficaz e bonita. Isso marca a diferença dela para capoeira Regional.”

Através da valorização da capoeira Angola, Mestre Pastinha tornou-se uma referência de homem negro que elevou a cultura de seu povo para patamares de reconhecimento no Brasil e no mundo, foi uma importante referência para um processo de educação inclusiva que respeita a diversidade e a individualidade. Foi um exemplo de generosidade, sabedoria, humildade, assim como todo grande mestre.

Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade

Atualmente, a Capoeira é Patrimônio Cultural, reconhecida em 2008 pelo Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A história de vida e os ensinamentos de Mestre Pastinha, junto com a de outros mestres, que tenham sido seus alunos ou não, da Capoeira Angola ou Regional, motivou outras pessoas a praticar a capoeira, que se disseminou pelo país e pelo mundo, tornando-se um dos maiores símbolos da cultura brasileira.

Seis anos depois do título dado pelo Iphan, em 2014, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) conferiu à Roda de Capoeira o título de Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade.

*Editado por Fernanda Alcântara