Feira Nacional

4ª FENARA: Da ocupação de terra à produção de alimentos e a solidariedade

Com espaços de comercialização, alimentação, debates e atrações culturais a 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária, será de 11 a 14 de maio, no parque da Água Branca, em SP
3º Feira Nacional da Reforma Agrária. Foto: Rafael Stedile

Por Solange Engelmann
Da Página do MST

Está chegando a hora: após cinco anos longe dos paulistanos, faltam poucos dias para a população conferir as cores, os sabores, a cultura popular, reencontros e muita comida de verdade na 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária, que acontece de 11 a 14 de maio, no parque da Água Branca, em São Paulo.

A programação deste ano está cheia de novidades e conta com diferentes espaços entre comercialização, alimentação, debates e atrações culturais, com artistas populares como Zeca Baleiro, Jorge Aragão e Gaby Amarantos, entre outras surpresas. No espaço da Culinária da Terra serão servidos diversos pratos típicos com produtos das cinco regiões do país.

Já a venda de produtos da Reforma Agrária acontece todos os dias da feira, entre às 8h e 20h, nas barracas. Os produtos são, em sua maioria, cultivados em sistemas agroecológicos ou estão em processos de transição para a agroecologia.

“Essa Feira tem um toque especial porque estamos mobilizando 500 toneladas de alimentos. Serão mais de 60 caminhões de produtos dos vários cantos do Brasil. Desse total, cerca de 30 toneladas serão destinadas à doação”, explica Diego Moreira da coordenação do setor de produção do MST.

Ele também afirma que toda essa produção que a população terá acesso durante a Feira é resultado do histórico processo de luta do MST, que se inicia com a produção da terra improdutiva, que não cumpre a função social. “O resultado de quase 40 anos de história do MST foi fruto de ocupação de terra, então as famílias se desafiaram desde o início da década de 80 a ocupar os latifúndios improdutivos, transformá-los em assentamentos e em espaço de produção, pra enfrentar os dilemas da fome”, pontua Diego.

Confira abaixo, a entrevista completa sobre esse importante espaço de comercialização para a Reforma Agrária.

Diego Moreira do setor de produção do MST. Foto: Arquivo pessoal

Conta pra gente, quais as atrações e novidades da 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária, que acontece no parque Água Branca?

Diego Moreira: Estamos cheios de expectativas. Essa Feira tem um toque especial porque estamos mobilizando 500 toneladas de alimentos. Serão mais de 60 caminhões de produtos que sairão dos vários cantos do Brasil: assentamentos, ocupações, cooperativas e associações da Reforma Agrária do Brasil todo. Desse total cerca de 25 toneladas serão destinadas à doação, prática política importante do Movimento que humaniza e politiza a nossa base.

2º Feira Nacional da Reforma Agrária, Foto: Rica Retamal

Teremos centenas de pratos sendo servidos na Culinária da Terra, uma diversidade da culinária brasileira que se reproduz nos assentamentos e ocupações e também atrações culturais, como Zeca Baleiro, Jorge Aragão e outros artistas populares, comprometidos com a cultura popular brasileira. Também o café institucional, com os parlamentares, vereadores, deputados estaduais e federais, senadores e outras relações políticas institucionais. E o Ato em defesa da Reforma Agrária, que contará com autoridades do Estado brasileiro que atuam na defesa da Reforma Agrária e a Conferência sobre o alimento saudável e o direito à alimentação saudável.

Palco com apresentações culturais na 2º Feira Nacional da Reforma Agrária. Foto: MST

A programação da feira esse ano é bastante densa e contará com diferentes espaços: de comercialização, alimentação e atração cultural. Esperamos que todas e todos se sintam a vontade na nossa 4ª Feira Nacional, que sistematiza o que construímos de importante na implementação da Reforma Agrária Popular.

Qual a importância dos assentamentos do MST na realização da 4ª Feira Nacional?

Diego Moreira: Tem milhares de produtos que serão comercializados na feira, os alimentos que serão processados e produzidos também na Culinária da Terra, e essa riqueza cultural virá dos nossos territórios da Reforma Agrária, em especial dos assentamentos em que há uma produção muito grande e relevante.

Os assentamentos são a materialidade dessas várias expressões que estarão na nossa Feira, desde a produção, a culinária e também as várias expressões artísticas e, sem dúvida, as relações humanas de confraternização e de carinho.

Que cadeias de produção de alimentos o MST traz para a 4ª Feira Nacional?

Diego Moreira: Vamos ter contato durante a Feira com várias cadeias produtivas, organizadas desde os assentamentos, cooperativas até o processo de comercialização. Então, vamos perceber a presenças dos arrozes, em especial do nosso arroz orgânico, a diversidade dos feijões, que produzimos no Brasil todo.

Então, o nosso prato típico, com arroz e feijão estará presente na nossa Feira.

Também cadeias importantes, como o leite e derivados que produzimos através das nossas cooperativas, os derivados da cana-de-açúcar, derivados de milho, os cafés, o cacau, a mandioca. Teremos inúmeras cadeia produtivas importantes que estruturam a produção dos assentamentos e as linhas principais das cooperativas. Além dos in natura, produção de hortifrúti, a produção que no dia a dia vai pras feiras nos municípios, estados, vai pra alimentação escolar, pro mercado convencional e que marca presença na nossa 4ª Feira.

Feijões produzidos dos assentamentos na 3ª Feira Nacional da Reforma Agrária. Foto: Matheus Alves/Levante

Qual a importância da cooperação e das cooperativas do MST para chegar até a Feira e nas relações humanas entre quem produz os alimentos?

Diego Moreira: São centenas de cooperativas organizadas pelo país, desde a região Sul à região Amazônica, Nordeste, Sudeste, Centro-Oeste. As cooperativas fazem parte da ação do MST em organizar a produção e o trabalho a partir da cooperação.

Ao produzir alimentos em contato com a terra, com a natureza, respeitando ensinamentos milenares, que a natureza nos permite, mas também respeitando as relações humanas que os/as trabalhadores/as estabelecem entre si e com a comunidade. Então, a cooperativa tem o papel de organizar a cooperação nas suas diferentes dimensões e produzir alimentos saudáveis que possam chegar até a mesa dos trabalhadores/as da Reforma Agrária, mas em especial dos trabalhadores/as do campo.

O alimento que além de ter um valor econômico agregado, também tem um valor social agregado, e político-ideológico muito grande porque é fruto dessas relações humanas diferentes, sem trabalho escravo, sem exploração de um sobre o outro e acima de tudo, respeitando o meio ambiente e a vida.  

Como o trabalho do MST na implantação da agroecologia nos territórios da Reforma Agrária e o Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis podem ser percebidos na Feira?

Diego Moreira: O nosso movimento também tem como princípio, trabalhar a mudança da matriz tecnológica, resgatando essa ciência popular que é a agroecologia, tentando massificá-la, como um exercício permanente nas relações sociais de produção.

Foto: MST/ES

Como uma das dimensões da agroecologia o Movimento tem trabalhado com o Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis, que enfrenta de forma prática esse passivo da destruição ambiental, protagonizada por parte do agronegócio no ultimo período. Então, o MST vem colocando pra si a responsabilidade de recuperar nascentes, as matas ciliares, as áreas de preservação permanente e implementar a agrofloresta, que possibilite produzir.

Além de plantar árvores em cada bioma e região do país, também produzir alimentos saudáveis nesse manejo permanente com as árvores, nativas, frutíferas, as madeiráveis. E garantir que além de ir melhorando e retomando a nossa biodiversidade, mas também produzir alimentos pra enfrentar os dilemas da fome no país. Na Feira vamos ter um grande viveiro, e essas dimensões estarão presentes também como um aspecto fundante da construção da Reforma Agrária Popular.

Que políticas públicas são importantes para avançar na produção de alimentos saudáveis no país e replicar experiências de feiras como estas?

Diego Moreira: A nossa Feira também terá espaços institucionais, em que teremos diálogos com prefeituras, governos de estados, governo federal e esse diálogo voltado para o fortalecimento e a retomada de políticas públicas, pra produção de alimentos nos assentamentos de Reforma Agrária. Precisamos fortalecer as cooperativas e a cooperação, as associações, ou seja, todas as formas de cooperação que organizam a base assentada, da agricultura familiar camponesa pra produzir alimentos.

Pra isso precisamos de políticas públicas, desde o fortalecimento do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNEA), o fortalecimento da Conab [Companhia Nacional de Abastecimento] como uma empresa pública estatal, que precisa ter uma política nacional de abastecimento e que esse estoque de alimentos possa nos ir levando pra uma segurança e soberania alimentar, o que não existe hoje. Então, a Feira também terá esse caráter de propor e exigir, nas diferentes esferas do Estado brasileiro que hajam políticas públicas, que enfrentem de fato o tema da fome e do desabastecimento nacional.

O que a Feira tem a ver com as ocupações de latifúndios improdutivos do MST?

Diego Moreira: A nossa Feira também tem esse significado de explicitar pra sociedade brasileira, pras autoridades, pro governo brasileiro que só existe produção, doação de alimentos, porque houve ocupação de terra. O resultado de quase 40 anos de história do MST foi fruto de ocupação de terra, então as famílias se desafiaram desde o início da década de 80 a ocupar os latifúndios improdutivos, transformá-los em assentamentos e em espaço de produção, em especial de alimentos, pra enfrentar os dilemas da fome, que em cada tempo volta a rondar os acampamentos e a sociedade brasileira.

Aqueles e aquelas que apoiam o Armazém do Campo, apoiam o arroz orgânico, apoiam a doação de alimentos saibam que tudo isso só é possível porque teve ocupação de terra, que transformou aquelas áreas improdutivas em assentamentos.

A Feira explicita isso, da ocupação à produção e as ações de solidariedade, esse é o itinerário que nos trouxe até aqui.

*Editado por Fernanda Alcântara