MST realiza II Seminário regional de saúde e qualidade de vida do Pontal do Paranapanema em São Paulo
Por Gerson de Souza
Da Página do MST
Com o objetivo de discutir os impactos dos agrotóxicos na saúde foi realizado no último dia 4 de agosto em Sandovalina, município do estado de São Paulo, o II Seminário Regional de Saúde e Qualidade de Vida do Pontal do Paranapanema.
Concomitantemente aconteceu a Conferência Livre do Campo – etapa preparatória da 1ª Conferência Nacional de Vigilância em Saúde, que acontecerá entre os dias 21 e 24 de novembro em Brasília. A atividade contou com a participação de cerca de 250 pessoas, entre assentados/as, acampados/as, agentes comunitários de saúde, conselheiros/as municipais, pesquisadores, estudantes, profissionais da assistência técnica e da área da saúde em geral.
O evento foi uma iniciativa do MST em parceria com o Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST), Coletivo CETAS de Pesquisadores da UNESP de Presidente Prudente, Colegiado de Desenvolvimento Territorial (CODETER), Diretoria Regional de Saúde (DRS XI), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Universidade do Oeste Paulista (UNOESTE), ITESP, entre outras instituições. A organização contou ainda com o apoio dos mandatos dos deputados estaduais Carlos Neder e Márcia Lia e do deputado federal Nilto Tatto.
A realização do II Seminário, sob o contexto da retirada de direitos e de desmonte das políticas públicas pelo governo ilegítimo e golpista, afirmou a importância do Sistema Único de Saúde e seu fortalecimento no diagnóstico, acompanhamento e tratamento das ocorrências de doenças relacionadas aos efeitos danosos dos agrotóxicos sobre a saúde da população do campo e da cidade.
Reforma Agrária com saúde e qualidade de vida
Essa foi a tônica da fala do Deputado Federal Nilto Tatto. O parlamentar apresentou os retrocessos orquestradospelo Executivo e Legislativo, sobretudo através da bancada ruralista, que quer, entre outras coisas, acabar com as restrições ao uso dos agrotóxicos, propondo a alteração do termo “agrotóxico” para “defensivo fitossanitário”. Ele denunciou também o completo esvaziamento das funções do Ministério do Meio Ambiente e dos órgãos de regulamentação, pesquisa e controle público sobre os venenos dentro do Estado brasileiro. Outro tema abordado por Tatto – que se soma às preocupações dos assentados do Pontal do Paranapanema – é a exploração comercial do gás de xisto que, comprovadamente, contamina o subsolo, as águas do lençol freático e dos reservatórios, podendo comprometer o abastecimento hídrico de toda a região.
A representante do Fórum Paulista de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos, Telma Nery, chamou atenção para o fato do Seminário ser realizado em Sandovalina, onde o índice de anomalias e má-formação por nascidos vivos é um dos mais altos do estado de São Paulo e está muito acima da média brasileira.
Além disso, ela apontou que o Brasil se destaca por se sobressair negativamente em vários indicadores, como os relacionados à presença altíssima do glifosato na água e do 2,4-D – que é 300 vezes maior do que o recomendado por órgãos internacionais. Isso tem acarretado impactos sobre a saúde da população, como o aumento dos casos de câncer .
A farmacêutica Eliane Gandolfi, da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (CVS-SES), discutiu sobre os efeitos da pulverização aérea e exposição aos agrotóxicos na saúde da população., que vão desde irritação na pele e nos olhos à problemas mais graves nos sistemas imunológico, neurológico e hepático. Gandolfi falou também sobre o empenho do grupo de vigilância sanitária para construção de uma política de toxicovigilância sanitária e epidemiológica para o estado de São Paulo e ressaltou que este tema só chama a atenção quando traz problemas para a produção. “A questão da pulverização na cana não é pensada para ser fiscalizada, a pulverização não é legislada na lei sobre os agrotóxicos, mas sim a partir de uma normativa do Ministério Público”.
Jorge Machado, especialista da Fiocruz, afirmou que a integração da política de vigilância com o SUS é fundamental a partir do envolvimento dos diferentes setores e com a participação comunitária na saúde. Ou seja, é necessária uma ação territorial que articule o trabalhador, a saúde ambiental participativa e integrada na comunidade. “Uma forma de vigilância popular da saúde no território com o objetivo da redução de riscos, informação, análise, difusão e intervenção”, ressaltou o pesquisador.
Dando continuidade aos debates, Rosane Ferraz e Mécia Rodrigues Batata, representantes do Grupo de Vigilância Sanitária (GVS XXII), falaram sobre o Projeto Piloto para a construção do “Protocolo Clínico para o trabalho pesado e a céu aberto”. A proposta engloba os trabalhadores agrícolas e urbanos mais expostos aos riscos, pois trabalham sob duras condições climáticas, sofrem forte desgaste físico e não são enxergados pela rede de saúde. O Protocolo deve orientar o sistema de saúde para o estabelecimento do nexo causal do processo trabalho-doença – ainda está em fase piloto em alguns municípios – e visa integrar os serviços de saúde municipal e as redes de média e alta complexidade para o tratamento médico-hospitalar.
Para Kelli Mafort, da Direção Nacional do MST, é fundamental discutir a questão dos agrotóxicos e da saúde num momento como esse, pois nos remete a discutir o controle territorial do país e a Reforma Agrária; discutir a saúde e a defesa da vida como contrapontos ao modelo do agronegócio, que tem a produção voltada para a exportação e para os interesses do capital; uma produção que gera mortes, doenças e intoxicação. Mafort apontou ainda que a Jornada Nacional de Lutas iniciada no dia do 25 de julho – Dia do Trabalhador Rural – teve como foco essa disputa de modelo. Com o lema “Reforma Agrária nas Terras dos Corruptos”, a jornada realizada em todo o país denunciou que a grilagem e concentração de terras também são frutos da corrupção no país, e as áreas que não cumprem sua função social devem ser destinadas para a Reforma Agrária.
“Defender a Reforma Agrária nesse momento é defender os territórios. Estamos sofrendo vários retrocessos no campo agrário com o processo de desestruturação de políticas como o PAA (Programação de Aquisição de Alimentos); retrocessos para os assentamentos – como o bloqueio dos SIPRA’s- e para a Reforma Agrária – como a aprovação da Medida Provisória 759 que perdoa a sonegação da dívida do agronegócio. Mas também estamos sofrendo retrocessos gravíssimos na pauta indígena e quilombola, que são a base fundamental para construir a agroecologia e os fatores essenciais para a defesa ambiental e da saúde”.
Conferência Livre do Campo
Na segunda parte do Seminário foi realizada a Conferência Livre do Campo, como parte preparatória da 1ª CNVS. Os pesquisadores Raul Guimarães e Diógenes Rabello apresentaram o panorama do contexto regional a partir de pesquisa desenvolvida pelo Coletivo CETAS de Pesquisadores da FCT/UNESP.
Daniela Buossi Holfs, do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e do Trabalhador do Ministério da Saúde. apresentou os eixos temáticos da Conferência Nacional e a orientação para os debates nos grupos de trabalho.
A Plenária Final deliberou que as propostas discutidas nos grupos pelo II Seminário serão encaminhadas juntamente com uma Moção à Comissão Organizadora da 1ª Conferência Nacional de Vigilância em Saúde. Também foi aprovada a criação do Fórum Permanente Regional de Saúde e Qualidade de Vida e do Comitê Regional de Combate aos Agrotóxicos.
[1] Desde 2012 está disponível a página do Observatório de Saúde Ambiental . Apesar de não estar atualizado, expõe os dados sobre o uso e consumo de agrotóxicos e análises epidemiológicas sobre as notificações do estado paulista a partir dos dados do DATASUS, o que é um alerta para todos nós sobre a relação do uso intenso dos agrotóxicos com os problemas de saúde pública.