Eleições 2022

46 camponeses querem ocupar os parlamentos estaduais e federal

Representantes de povos do campo defendem reforma agrária, direito à terra, comida de verdade e direitos humanos; candidatos representam todas as regiões e se alinham em na proteção de comunidades tradicionais; luta política dentro e fora das eleições ocorre há décadas
Na Marcha das Margaridas, camponesas reúnem forças para influenciar a política. Foto: Pedro França/Agência Senado

Por Luma Prado e Nanci Pittelkow
Do De Olho nos Ruralistas

Representantes do campesinato, incluindo ribeirinhos, pescadores, sem-terra e populações tradicionais, lançaram candidaturas para conquistar espaços na política institucional, na eleição de 2 de outubro. Para o terceiro episódio do De Olho na Resistência especial eleições foram identificadas 46 chapas reunindo 32 homens e 14 mulheres de todas as regiões do Brasil, sendo uma chapa coletiva feminista. Estão distribuídas por 17 estados, em todas as regiões, e no Distrito Federal. 

As pautas camponesas incluem reforma agrária e direito à terra, comida de verdade, combate à fome, produção sem veneno e fortalecimento da agricultura camponesa . “A gente luta diariamente contra o agronegócio, contra o capitalismo que vem desenfreado trazendo doenças e alimentos com veneno”, conta o professor Rafael Chapéu de Couro, candidato a deputado estadual pelo PT-PB. “Por tudo isso é importante ter representantes na Câmara, nas Assembleias Legislativas, em todas as instâncias do nosso país”, completa.

As candidaturas do campo reúnem acampados e assentados do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), camponeses ligados à Comissão Pastoral da Terra (CPT), integrantes do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), do Movimento pela Soberania Popular Frente à Mineração (MAM), trabalhadores rurais e militantes. Veja no mapa interativo abaixo os candidatos em seus estados.

Candidatos defendem Agroecologia contra o agronegócio

As candidaturas ligadas ao MST têm como objetivo eleger bancadas que defendam reforma agrária, moradia e alimentação digna. Todos saem pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e apoiam a eleição de Lula. Já o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) não tem candidaturas próprias, mas apoia aliados, como a quilombola e pescadora Eliete Paraguassu. 

Assim como os candidatos indígenas e quilombolas, os camponeses defendem o ambiente e a proteção da vida. “Continuando a lógica atual não há desenvolvimento, é o fim da Amazônia”, diz a ribeirinha Carmen Foro, candidata a deputada federal pelo PT-PA. “Eu quero fazer a defesa que eu faço a minha vida inteira, como agricultora, e precisamos de parlamentares comprometidos não só com os seus bolsos, mas com a vida”, explica.

Produção agroecológica está na pauta camponesa. Foto: Juliana Barbosa/Divulgação

Se eleitos, os candidatos do campo pretendem ampliar a resistência que já alimenta a defesa de seus territórios. “Somos cercados por plantadores de soja, a Suzano, a pecuária, as barragens” conta Vânia Ferreira, militante do MST e candidata a deputada federal PT-MA. “No meio disso tudo estão as comunidades camponesas, os assentados, os quilombolas, os povos indígenas, quebradeiras de coco, as comunidades e povoados, trabalhadores rurais e os pequenos agricultores e agricultoras do nosso estado”, enumera. 

Além de defender suas comunidades, representantes de povos tradicionais querem levar suas propostas de desenvolvimento para o país. “Nossa resistência está na construção de experiências concretas de promoção de educação e pesquisa em agroecologia”, conta Alexandre Pires, candidato a deputado estadual pelo PSOL-PE. “São experiências protagonizadas principalmente por mulheres e por jovens, de tecnologias sociais que contribuem para o uso sustentável e eficiente dos nossos bens comuns, da nossa água, das nossas sementes crioulas”, detalha.

Veja mais propostas e candidaturas no terceiro vídeo do especial sobre Eleições do De Olho na Resistência:

Política é território camponês há décadas

A história da luta camponesa é bem maior que a via eleitoral. Maria Margarida Alves, por exemplo, foi uma mulher pioneira no sindicalismo rural na Paraíba e marcou a trajetória de camponeses que hoje buscam se eleger. “Eu era adolescente quando conheci Margarida em um comício na minha comunidade”, lembra Vânia Ferreira. “Foi a primeira vez que ouvi falar de Reforma Agrária e direitos trabalhistas.”

Movimentos do campo lutam por mais políticas públicas. Foto: Divulgação

O professor Rafael também foi marcado pelos movimentos sociais do campo. “A minha avó, Dona Helena, era uma líder camponesa da Comissão Pastoral da Terra (CPT)”, conta. “Desde criança a via atuando como líder dos trabalhadores, religiosa e catequista”.

Já na política institucional os camponeses estão presentes desde ao menos a década de 1960. José Porfírio de Souza é considerado o primeiro deputado camponês, eleito deputado estadual pela coligação PTB-PSB no estado de Goiás, em 1963. Com o golpe de 1964, teve seu mandato cassado, foi preso e permanece desaparecido. 

O advogado Francisco Julião não era camponês, mas representava as Ligas Camponesas e defendia a reforma agrária, pelo Partido Socialista Brasileiro. Foi cassado e preso em 1964. Como mostram dois dos episódios do programa De Olho na História, o golpe de 1964 foi dado contra o campo e contra sua organização política.

Mesmo assim, houve resistência. Militantes históricos do MST, como Adão Pretto e Marcon, do PT-RS, e Valmir Assunção, do PT-BA, são alguns dos nomes que ocuparam cadeiras nos parlamentos estaduais e federal na Nova República. Entre as mulheres, Luci Choinacki foi a primeira mulher agricultora eleita na história de Santa Catarina nos anos 90.

Propostas unem eleições e manutenção da luta

Mulheres camponesas se organizam para participar da política. Foto: Divulgação

Para quem é do campo, as eleições são uma continuidade do dia a dia. “Produzir alimentos saudáveis é um ato político. Assim como defender a saúde pública de qualidade, a democratização do acesso à terra, o direito ao trabalho, ao lazer, ao esporte”, afirma Vânia Ferreira, do PT-MA. “Precisamos ter vozes do campo, da periferia, das mulheres, defendendo nosso projeto de vida”.

“É importante votar em parlamentares para as assembleias legislativas, câmara e senado em pessoas que estejam comprometidas com as causas populares”, diz Alexandre Pires, do PSOL-PE. “Comprometidos com a agroecologia, agricultura familiar e camponesa, combate aos agrotóxicos e aos transgênicos, contra o latifúndio e contra essa lógica que oprime, que escraviza e que violenta as pessoas, e sobretudo as mulheres.”

Nos próximos programas serão abordadas as bancadas da comida de verdade, do ambiente, da cultura e diversidade. (Colaborou Natalie Hornos)