Jornada da Natureza

Conheça 3 experiências de cuidado com a natureza e bens comuns nos territórios do MST

Neste 21 de setembro, Dia da Árvore, confira experiências do MST, em três estados, na coleta de sementes, Sistemas Agroflorestais e de ensino e experimentação nas Escolas do Campo

Foto: Coletivo de juventude do Abril Vermelho

Por Solange Engelmann
Da Página do MST

No decorrer de todo o mês de setembro, as famílias do MST realizam um conjunto de ações de denúncia em relação ao projeto de destruição do agronegócio e na defesa da “Reforma Agrária Popular para cuidar da Natureza”, bem como divulgam experiências produtivas e de recuperação do meio ambiente, nos assentamentos, acampamentos, escolas, cooperativas e espaços da Reforma Agrária em todo país.

As ações integram o Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis, com experiências voltadas à produção de alimentos saudáveis, ao cuidado com a natureza, os bens comuns e o enfrentamento às mudanças climáticas. Essas ações projetam a importância da Reforma Agrária Popular para a recuperação ambiental e produção agroecológica em equiílbrio com o meio ambiente, para a mudança do modelo de produção predatório e causador da crise ambiental do agronegócio que causa destruição, adoecimento e ameaça à vida de todos os seres.

Ana Cristina da Costa Feitos, agrônoma e da coordenação da frente de produção do setor de Produção MST no Ceará, resalta que a ações de cuidado com a natureza durante todo o mês de setembro, atua no apoio e fortalecimento à recuperação ambiental e combate à fome, a partir da promoção da agroecologia e a luta pela Reforma Agrária, que vem sendo realizadas pelo Movimentos nos territórios de Reforma Agrária.

“As experiências de recuperação ambiental em áreas degradadas dos assentamentos, resultado da exploração predatória do solo pelo modelo de produção anterior à Reforma Agrária, têm proporcionado às famílias assentadas uma nova perspectiva de vida mais saudável. A recuperação de árvores importantes para a alimentação dos animais domésticos e a recomposição da fertilidade do solo possibilitam assim, retomar a produção em áreas revitalizadas, garantindo alimentos mais saudáveis, fortalecendo a segurança alimentar das famílias e a defesa de seus territórios”, resume.

Confira experiências do MST na recuperação e preservação ambiental nas cinco regiões do país:

1. Rede de Coletores de Sementes em São Paulo

Foto: Acervo de imagens dos coletores

Neste mês de setembro, em Lagoinha, no estado de São Paulo, as famílias camponesas do assentamento Agroecológico Egídio Neto, estão na temporada de coleta de sementes de plantas nativas para, em seguida, iniciar o plantio com foco na restauração ecológica nas áreas das famílias coletoras. As famílias são ligadas à Cooperativa Rede de Coletores de Sementes do Vale do Paraíba (Coopere).

A atividade que faz parte do Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis do MST e, conforme o camponês do assentamento, Tiago Ribeiro Coutinho, essa ação das famílias coletoras é fundamental para a recomposição da vegetação nativa e vida silvestre, a ampliação da área de coleta no futuro, além da melhoria da qualidade de vida e fortalecimento da soberania das comunidades.

“Esta ação, ligada ao Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis é por nós denominada de Reservas Populares do Patrimônio Natural e contribui para o fortalecimento da agroecologia, atrelado ao projeto de Reforma Agrária Popular que une o ser humano à natureza. Convocamos toda a companheirada e as diversas comunidades Brasil afora para fazerem o mesmo: semear, cuidar e zelar pela natureza é tarefa de todas e todos. Avante para uma vida mais saudável e feliz!”

Trabalho cooperado

A Coopere é formada por trabalhadores, camponeses, agroflorestores, que produzem sementes florestais nativas e crioulas, atuando na restauração ecológica e agricultura de regeneração em convivência com a Mata Atlântica e Cerrado. Os coletores vivem nos assentamentos de Reforma Agrária, em bairros rurais, e área urbana na região do Vale do Paraíba. E os trabalhos envolvem diretamente 75 pessoas que atuam como coletores e coletoras, distribuídas em 40 unidades familiares, em cinco núcleos territoriais com abrangência em 10 municípios do Vale do Paraíba.

O trabalho da Rede de Coletores do Vale do Paraíba, ligado à Coopere até o momento resultou na produção de 10 toneladas de sementes florestais nativas e de adubo verde. Somando mais de 130 espécies nativas de arbóreas, arbustos e herbáceas nativas, utilizadas na recomposição vegetal do bioma Mata Atlântica e cerrado regionais.

Fotos: Acervo de imagens dos coletores

A partir de diálogos e ações no território em torno da agroecologia, realizados desde 2019, foi possível avançar na integração entre agricultores e os profissionais da restauração ecológica, que atuam na semeadura direta, de uma técnica denominada, “Muvuca de Sementes”. Em seguida, foram desenvolvidas experiências com sementes florestais nativas para a composição dos plantios por “Muvuca de Sementes” na região, fomentado por parceiras entre o MST e projetos de pesquisa, que estimularam a ação, coleta e produção dos coletores, estimulando uma articulação nacional entre Redes de Sementes de base comunitária.

“A sequência dos trabalhos, busca pelo aprimoramento dos processos, e o estabelecimento de laços de confiança entre os trabalhadores, possibilitou a estrutura de produção coletiva que se estabeleceu, e até os dias atuais, tem aumentado seu número de pessoas atuantes e o volume de sementes e espécies produzidas. A formalização da cooperativa e a recém conquista da casa de sementes trazem enormes conquistas para a classe trabalhadora do campo na região, e os ganhos também podem ser medidos nas árvores e plantas que hoje tem sido melhor utilizadas e valorizadas pelas comunidades em seus sistemas agroalimentares, bem como a geração de trabalho e renda no campo”, aponta Tiago da Coopere.

Todo o trabalo realizado na cooperativa ocorre de forma associada e coletiva entre os coletores, com autonomia no planejamento do processo produtivo, a gestão, assistência técnica, e a comercialização. Diante disso, Tiago explica que “As aproximações junto a iniciativas semelhantes em outras regiões, e a demanda por formação de novos coletores, aliado a demanda de sementes para atender a restauração ecológica tem propiciado intercâmbio da COOPERE com outros grupos de coletores, agricultores e iniciativas socioambientais pela articulação da agroecologia e restauração ecológica num projeto de soberania popular e do bem viver.”

2. Sistemas Agroflorestais no Pará

No assentamento Abril Vermelho, município de Santa Bárbara do Pará, no Estado do Pará, atualmente cerca de 90 famílias assentadas do MST estão organizadas em torno de processos de formação em agroecologia e implementação de Sistemas Agroflorestais (SAF’s). O trabalho vem sendo desenvolvido há cerca de 16 anos, desde a conquista do assentamento, mas tem se intensificado a partir dos últimos cinco anos, como parte do Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis, com experiências de recuperação da biodiversidade de Bioma Amazônico, com reconstituição florestal, recuperação de nascentes de água e produção de alimentos diversificados em parceria com a floresta.

Sistemas Agroflorestais, assentamento Abril Vermelho, PA. Foto: Coletivo de juventude do Abril Vermelho

O latifúndio, que antes abrigava o monocultivo de dendê, após ser transformado em assentamento, em 2009, hoje conta com uma diversidade de Sistemas Agroflorestais, com técnicas ecológicas e agroecológica de manejo e produção de alimentos. “Em controversa aos antigos monocultivos desenvolvidos no território, como o monocultivo de dendê, hoje na transformação de Sistemas Agroflorestais Agroecológico contribuiu em todo o processo de formação e organização dos viveiros e na produção das mudas e distribuição para as famílias, para que elas ressignifiquem o território, numa outra ótica de organização, produção e desenvolvimento cultural e produtivo”, ressalta o camponês Raimundo Nonato Filho, assentado no assentamento Abril Vermelho.

O assentamento Abril Vermelho conta com 396 famílias assentadas em uma área de 6.668 hectares de terra e está localizado na região metropolitana de Belém, no Pará, a 40 quilômetros da capital. O assentamento abriga grande parte das famílias Sem Terra sobreviventes do Massacre de Eldorado do Carajás, que ocorreu 17 de abril, de 1996, quando a Polícia Militar do Pará assassinou brutalmente 21 trabalhadores Sem Terra, durante uma marcha por terra, na curva do “S, em Eldorado dos Carajás.

Viveiro de mudas, assentamento Abril Vermelho, PA. Foto: Coletivo de juventude do Abril Vermelho

Raimundo explica que o produto mais cultivado nos SAF’s e comercializado pelas famílias assentadas é o açaí, mas também são produzidas outras frutas regionais, como o cacau, bacabí, rambutã, cupuaçu, banana, abacaxi, biribá, laranja, limão, castanha do Pará, piquiá, jatobá, jambo, abacate, mamão, acerola, tangerina, entre outros, que são entregues para programas governamentais como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), além da comercialização em feiras e mercados locais.

A implantação de SAF’s contempla sistemas em vários estágios, alguns mais antigos, formados há seis anos, por exemplo, e outros mais recentes com novas técnicas, tecnologias e processos de formação. Quanto às culturas, em algunas sistemas predomina a produção do açaí, cupuaçu e cacau, com maior produtividade; porém, também existem sistemas com plantas nativas que compõem o bioma amazônico, como castanha, pequi, jatobá e outras variedades; além de SAF’s iniciais, com as chamadas “culturas de lavoura branca”, como milho, feijão, mandioca, banana, que integram o hábito alimentar das famílias e contribuem no sombreamento, na cobertura do solo.

“Então a gente tem incidido com esse processo de formação para transformar os sistemas produtivos agroflorestais para uma dinâmica agroecológica. A base de formação ecológica é fundamental e necessária, quanto mais SAF’s diversos, mais resistentes às adversidades climática. Também tem dado retorno e intensificado a produção dos alimentos, do consumo humano para alimentar a família e o que sobra para o mercado. Os SAF’s também vêm apresentando uma melhoria na qualidade da diversidade e no uso alternativo de insumos não químicos”, conclui Nonato Filho.

3. Cuidado com a natureza em Escolas do Campo no Ceará

O trabalho de recuperação ambiental e implantações de sistemas produtivos agroecológicos, em consórcio com a natureza, nas áreas de assentamentos, acampamentos, escolas, centros de formação, cooperativas, associações, entre outros territórios do MST, também dependem de processos educativos e experimentais desenvolvidos nas Escolas do Campo, espalhadas por todo o país. No estado do Ceará o setor de educação do MST vem realizado um trabalho nesse sentido, em parceria com o Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis e escolas de ensino médio e profissional do campo.

Escola Florestan Fermandes, no assentamento Santana Monsenhor Tabósa. Foto: MST CE

A assentada, que vive no assentamento Bernardo Marin dois, em Ruça e integra o setor de educação do MST no CE, Maria de Jesus dos Santos, explica que entre as escolas as escolas envolvidas, cerca de 2.060 estudantes e 68 turmas de cursos no estado, em que se desenvolve um trabalho unificado nos Projetos Político Pedagógico, voltado para a agroecologia, com campo experimental agroecológico para atividades de ensino nessa área, que também conta do apoio e orientação de técnicos agroecológicos.

“Temos plantado centenas de árvores do nosso bioma Caatinga. Árvores que também são guardadores de água, que compõem o nosso bioma, a partir de um viveiro de mudas em cada escola. Estas árvores são plantadas no campo experimental, e depois distribuídas no território. Nós também temos participado de momentos nas cidades, na feira estadual que acontece no nosso Centro Frei Humberto, todo segundo sábado a Feira Cultural da Reforma Agrária e em outras atividades do MST, nas Escolas do Campo, no fortalecimento da agroecologia e na produção de alimentos saudáveis. Porque Reforma Agrária Popular é defender a natureza.”

Plantio de mudas na Escola Florestan Fernandes, no assentamento Santana Monsenhor Tabósa. Foto: MST CE

As atividades práticas e de ensino, na área da agroecologia e preservação da natureza, nas Escolas do Campo no CE ocorrem semanalmente, em viveiros instalados nessas escolas, com a participação dos educandos e educandas e das comunidades rurais no entorno.

*Editado por Leonardo Correia