Sem-teto conseguem na Justiça ficar em terreno de Naji Nahas

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Sem-teto conseguem na Justiça ficar em terreno de Naji Nahas

14/01/2005

Por Fernanda Sucupira
Fonte Agência Carta Maior

Desde fevereiro do ano passado, trabalhadores sem-teto ocupam um terreno de quase 1,4 milhões de metros quadrados, na cidade de São José dos Campos, em São Paulo. Atualmente, moram na fazenda Pinheirinho, como ficou conhecido o lugar, mais de 7 mil pessoas, o correspondente a 1,4 mil famílias. Cerca de 2,6 mil sem-tetos são crianças de zero a 10 anos. Em setembro de 2004, um juiz da 18a Vara Cível de São Paulo determinou a reintegração de posse do terreno, em decisão favorável à massa falida da empresa Selecta Comércio e Indústria, do megaespeculador Naji Nahas. Em dezembro, foi ordenada a retirada dos sem-teto do local, operação que estava marcada para a próxima terça-feira (18). Depois de manifestações e recursos na justiça, o movimento conseguiu, nesta quarta-feira (12), a suspensão da reintegração de posse e, portanto, da ordem de desocupação do Pinheirinho. A empresa deve recorrer da decisão.

Os advogados do movimento dos sem-teto afirmam que havia irregularidades no processo que, na verdade, seria da competência da 6a Vara Cível de São José dos Campos, onde já foi julgado. Como a Selecta já havia perdido a ação na cidade em que ocorre o conflito, entrou com outra exatamente igual na 18a Vara Cível de São Paulo, em que tramita o processo de falência da empresa. “Um juiz de falências da capital é incompetente para decidir uma questão de posse em São José dos Campos”, argumenta Antônio Donizete Ferreira, um dos advogados do movimento.

Ainda sem a decisão favorável, na segunda-feira (10) cerca de 1,2 mil sem-teto do acampamento Pinheirinho ocuparam as duas pistas da Via Dutra por uma hora, exigindo a suspensão da retirada do acampamento do Pinheirinho. Foi uma resposta à notícia de que a polícia militar havia preparado uma verdadeira operação de guerra para executar a desocupação do terreno, com direito a tratores, caminhões, helicópteros e tropa de choque. Os hospitais haviam sido avisados para aumentar o número de médicos de plantão na terça-feira, e os bombeiros estavam em estado de alerta.

Os sem-teto já haviam decidido resistir à tropa de choque e muitos até ameaçavam colocar fogo no próprio corpo. “As pessoas estão totalmente desesperadas. Não têm emprego, nem para onde ir, por isso não querem sair daqui de maneira nenhuma. O meu maior medo é que ocorra uma carnificina, pois as pessoas estão dispostas a lutar até a morte. Percebemos que o único caminho é o enfrentamento”, afirma o coordenador geral do movimento, Valdir Martins, conhecido como Marrom.

Os sem-teto exigem que a prefeitura desaproprie o terreno. Eles argumentam que ele não cumpre sua função social desde a década de 70, sendo que o déficit habitacional da cidade já chega a 22 mil habitações. Além disso, os proprietários não pagam o IPTU do terreno desde 1983, quando passou a ser considerado urbano. A dívida com a prefeitura de São José dos Campos já chega a R$ 5 milhões, o que corresponde ao valor venal da área. Agora, o movimento pretende entrar com ação de improbidade administrativa contra a prefeitura, por não cobrar essa dívida. “Queremos que ela use esse terreno para construir um bairro, com infra-estrutura para os sem-teto, e não uma favela. Ou eles ficam do lado dos pobres ou do lado do Naji Nahas, não há meio termo nessa história”, acredita Ferreira.

A atitude da prefeitura desde a ocupação do Pinheirinho tem sido de desmerecer e atacar o movimento dos sem-teto, chegando a oferecer passagens de volta para o local de origem para aqueles que não são de São José dos Campos. Foi aprovada, no ano passado, uma lei municipal, que retirou os benefícios sociais – como leite e cestas básicas – das famílias carentes que estão no acampamento. De autoria do então presidente da Câmara dos Vereadores, Walter Hayashi (PSB), ficou conhecida como “lei da fome”. “Além disso, a prefeitura vem negando qualquer tipo de ajuda. No final do ano passado, choveu muito e caíram vários barracos, mas ninguém nos socorreu. Ficamos sem água e quando pedimos ajuda para a defesa civil eles afirmaram que a prefeitura não deixa. Os secretários também foram proibidos de ir lá no Pinheirinho”, denuncia Marrom. Segundo ele, o movimento aceita fazer um acordo, desde que a prefeitura apresente outras soluções que não deixem o pessoal na rua.

A vitória parcial do movimento foi muito comemorada pelos sem-teto. “Havia uma ansiedade muito grande por parte do nosso pessoal. Passamos o Natal e o Ano Novo preocupados com o pedido de desocupação, correndo atrás de muita coisa. Não tivemos tempo de comemorar nada”, lamenta Marrom. Ele conta que a notícia foi recebida com muita festa, lágrimas e abraços entre os sem-teto.