Universidade homenageia lutas camponesas no Pará

Por Evandro Medeiros* Nos dias que antecedem a data em que ocorreu o Massacre de Eldorado dos Carajás, na tentativa de contribuir para o debate e reflexão sobre a atual conjuntura sócio-ambiental na região sul e sudeste do Pará e objetivando fortalecer a memória e consciência das lutas camponesas ocorridas na região, será realizada no período de 12 a 16 de abril a Semana Camponesa do Campus Universitário de Marabá [UFPA], organizada por professores e militantes das organizações sociais locais que atuam no Fórum Regional em Educação do Campo.

Por Evandro Medeiros*

Nos dias que antecedem a data em que ocorreu o Massacre de Eldorado dos Carajás, na tentativa de contribuir para o debate e reflexão sobre a atual conjuntura sócio-ambiental na região sul e sudeste do Pará e objetivando fortalecer a memória e consciência das lutas camponesas ocorridas na região, será realizada no período de 12 a 16 de abril a Semana Camponesa do Campus Universitário de Marabá [UFPA], organizada por professores e militantes das organizações sociais locais que atuam no Fórum Regional em Educação do Campo.

O evento, por meio da apresentação de documentários e palestras, pretende debater a realidade que emerge dos processos sociais ocorridos nos últimos 30 anos a Amazônia Oriental, em especial o sul e sudeste paraense, que tem sido palco de uma intensa disputa por terra e a apropriação dos recursos naturais, tendo como sujeitos mais significativos desse processo de um lado trabalhadores rurais na condição de camponeses desterrados, e do outro lado, setores do capital – pecuaristas, madeireiros e empresas mineradoras. Nesse período histórico se observou como de maneira trágica, violenta e altamente impactante os interesses dos setores do capital foram prevalecendo tendo como patrocinador o próprio Estado e em detrimento das demandas e direitos dos camponeses e outros setores populares.

Para além de grandes áreas de floresta devastadas para consumo da madeira, produção de carvão, formação de pastos e exploração mineral, neste processo a apropriação e concentração de terras pelos setores do capital fomentou também a violência contra os trabalhadores rurais e outros lutadores sociais envolvidos na luta por reforma agrária, na defesa dos direitos humanos e críticos ao projeto de desenvolvimento em curso na região. Entre as centenas dos mortos em meio aos conflitos agrários no sul e sudeste do Pará, estão as vitimas dos massacres de camponeses [Massacre da Fazenda Ubá – 1985, Massacre da Fazenda Princesa – Massacre de Eldorado dos Carajás – 1996], dos assassinatos de lideranças camponesas e sindicalistas [Expedito Ribeiro, João Canuto, Onalicio Barros, José Dutra da Costa, etc] e dos assassinatos de defensores de direitos humanos e religiosos [João Batista, Paulo Fonteles, Irmã Adelaide, Padre Josimo, Irmã Doroth, etc].

Nas duas ultimas décadas, em decorrência da luta camponesa e, infelizmente, a custa de muito sangue derramado, foram criados na região diversos projetos de assentamento de reforma agrária, onde vivem hoje aproximadamente 67 mil famílias assentadas, desenvolvendo estratégias de re-existência camponesa voltadas a democratização da terra, a garantia do a acesso a direitos sociais, a produção agrícola diversificada, ao uso sustentável dos recursos naturais, a criação de mecanismos de organização político, econômico e cultural de suas comunidades.

Muitos assentamentos tem se destacado por conta de suas experiências de produção agroeológica; atuação de cooperativas de assistência técnica; práticas de beneficiamento e comercialização; elevação da renda das famílias camponesas; qualificação técnica e política dos trabalhadores rurais; organização de escolas com currículos diferenciados; criação de rádios comunitárias; etc.

Neste mesmo período ampliaram-se em escala muito maior as atividades produtivas e de exploração dos recursos naturais pelos setores do capital na região: as madereiras, após o esgotamento das florestas ao logno da PA 150, migraram e intensificaram sua ação na chamada região da Terra do Meio [São Félix do Xingu, Pacajá, Anapu, etc]; com florestas transformadas em pastos consolidaram-se latifúndios como empresas pecuaristas [vide o Grupo Santa Barbara, ligado ao banqueiro Daniel Dantas]; multiplicaram-se o numero de mineradoras estrangeiras atuando na região, as áreas de exploração mineral e os tipos de minério explorados [ferro, níquel, cobre, ouro, bauxita, etc]; duplicou-se o numero de siderúrgicas instaladas para produção de ferro gusa e em conseqüência disto surgiram empreendimentos do agronegócio no ramo do cultivo de matéria prima para produção de carvão, ocupando-se extensas áreas de terra com o monocultivo de eucalipto. Atualmente a empresa mineradora Vale, com apoio do governo do estado, iniciou um processo de instalação de um empreendimento para verticalização do beneficiamento de ferro orçado em 20 bilhões de reais.

Constitui-se assim sob a batuta do capital da mineração um projeto de desenvolvimento que, de certa forma, parece caminhar para a hegemonização da sociedade regional. Tal projeto demanda o controle do Estado para manutenção do status quo e para constituição de condições logísticas favoráveis a sua consolidação, como a geração de energia e, assim, a construção de novas hidrelétricas na região. Novos-velhos impactos: áreas de florestas, reservas indígenas, comunidades ribeirinhas e cidades que margeiam rios serão alagadas; as populações das cidades crescendo vertiginosamente; as áreas urbanas se ampliando de forma desordenada; ampliação das contradições sociais e situações de exclusão diversas; agravamento dos conflitos na cidade e no campo. Em meio a isto tudo, sobre o discurso da preservação do progresso se criminalizam – por meio da mídia e de instrumentos jurídicos – os sujeitos e organizações sociais que se coloquem críticos a implementação deste projeto de desenvolvimento e suas conseqüências.

Faz-se urgente neste contexto fomentar o debate sobre algumas questões como: Que elementos caracterizam a conjuntura atual de desenvolvimento capitalista em curso na região e suas contradições, limites e possibilidades? Como mineração e agronegócio confluem neste processo de desenvolvimento e que impactos geram sobre a realidade das populações camponesas e os assentamentos da reforma agrária? Quais os desafios e possibilidades postos as organizações sociais representantes dos setores populares diante de tal contexto?

Estas são questões que se pretende debater durante a Semana Camponesa do Campus Universitário de Marabá [UFPA]. O evento será aberto a comunidade em geral, em especial educadores e educandos das escolas de Marabá, membros dos movimentos e organizações populares e comunidade acadêmica. Em um momento posterior deseja-se levar a mesma proposta de programação aos bairros, escolas e comunidade dos municípios da região, na tentativa de mobilizar e sensibilizar a sociedade regional para tal realidade e suas contradições.

Confira abaixo a programação completa da Semana Camponesa.

PROGRAMAÇÃO

INSTALAÇÃO “ROMPENDO CERCAS”
Núcleo de Arte-Educação do Sul e Sudeste do Pará [NAEESSP]
Núcleo de Estudos e Extensão em Educação do Campo [NECAMPO]
Local: Tapiri – Campus I

PROJEÇÃO DE FILMES E DEBATES
Local: Auditório – Campus I
Horário: 18h30m

Dia 12/04

Filmes: “Carajás XXI [prelúdio]”
Debate: “Mineração e Questões Agrárias no Sul e Sudeste do Pará”
Raimundo Gomes [CEPASP/VIA CAMPESINA]
Fernando Michelotti [UFPA]

Dia 13/04

Filme: “Agricultura Familiar: Luta pela terra e Diversificação Produtiva”
Debate: “Territorialização Camponesa e Assentamentos da Reforma Agrária no Sul e Sudeste do Pará”
Bruno Malheiros [UFPA]
Caludionisio Araújo [COPSERVIÇOS]

Dia 14/04

Filme: “Nas Terras do Bem Virá I”
Debate: “Caso Dorothy Stang e Criminalização dos Movimentos Sociais”
José Batista Afonso [CPT]
Jorge Luiz Ribeiro [UFPA]

Dia 15/04

Filme: “Mulheres, Mães e Viúvas da Terra”
Debate: “Participação da Mulher na Luta pela Terra”
Maria Joel [FETAGRI]
Rosemary Bezerra[CPT]

Dia 16/04

Filme: “Nas Terras do Bem Virá II”
Debate: “Massacre de Eldorado dos Carajás e Perspectivas da Luta pela Terra Hoje”
Charles Trocate [MST]
William Assis [UFPA]

*Coordenador do NECAMPO – UFPA