Dirigente do MST defende programa unitário para tirar país das crises

Durante congresso da CUT, em Porto Alegre, João Pedro Stedile apontou os principais desafios da classe trabalhadora na atual conjuntura.

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Por Catiana de Medeiros
Da Página do MST

As saídas para as crises existentes no Brasil e o papel da classe trabalhadora para enfrentar as tentativas de golpe foram destacados pelo dirigente nacional do MST, João Pedro Stedile, na última sexta-feira (21), durante o 14º Congresso Estadual da Central Única dos Trabalhadores (CECUT), em Porto Alegre (RS).

De acordo com Stedile, nos últimos dois anos o Brasil ingressou em um processo de crise que hoje envolve a economia, a política e a sociedade brasileira.

Para ele, a crise econômica é fruto da dependência estrutural que a economia tem do capitalismo internacional e da influência que as empresas transnacionais têm sobre a economia brasileira.

“A burguesia controlou a taxa de juros e de câmbio para viabilizar o seu processo de acumulação. E, mesmo com a crise, muitos capitalistas internacionais continuaram ganhando dinheiro e lucros continuaram sendo enviados para o exterior, tornando mais grave a situação, pois em vez da nossa riqueza ser reinvestida no Brasil e alimentar nossa economia, bilhões de dólares foram transferidos para o exterior, das filiais para as matrizes”, explica.

Segundo Stedile, na visão de vários economistas, a crise econômica instalada no Brasil deve durar pelo menos mais dois anos, uma vez que houve queda considerável do nível de investimentos do setor.

“Se não há investimento produtivo, não tem como criar expectativa da volta do crescimento à curto prazo”, argumenta.
 

Crise política

Conforme o dirigente do MST, a crise política na qual vive o Brasil é consequência de um “sistema político-eleitoral perverso”, que prioriza interesses empresariais e é defendido pela burguesia.

“Sabemos que as dez maiores empresas elegeram 70% do parlamento brasileiro. Hoje não existe mais partido, o que existe é a bancada da Monsanto, do Bradesco, da Odebrecht. E os eleitos por essas empresas não se sentem comprometidos com o programa de seu partido, mas primeiramente com quem financiou as suas campanhas”, denuncia, ao acrescentar que se não houver uma profunda reforma política, a cada dois anos o país viverá uma Lava Jato.

“A situação da Lava Jato faz com que a burguesia, nos seus meios de comunicação, utilize critérios moralistas tentando achar culpados. E aí, quando aparece alguém do PT é a semana inteira; quando aparece alguém do PP são 30 segundos, e os tucanos, que pegaram mais dinheiro na Lava Jato, não aparecem. O problema é o sistema político-eleitoral brasileiro que a burguesia não quer denunciar porque para ela não é favorável uma reforma política”, diz.

Crise social

Stedile afirma que, além da econômica e política, o Brasil vive uma crise social, o que foi o substrato para as mobilizações ocorridas em junho de 2013 no país.

“Muitos temas denunciados pela gurizada que saiu às ruas não foram resolvidos. Pelo contrário, aumentou a falta de moradia nas grandes cidades, reduziu o acesso à universidade e ainda existem problemas no transporte público, que exige pesados investimentos, sobretudo, públicos, já que a iniciativa privada não tem interesse em investir devido a demora para obter rentabilidade. Há uma crise latente para a nossa juventude, sobre a qual a sociedade brasileira não tá dando resposta. E isso, dia mais ou dia menos, vai estourar”, alerta.

Saídas às crises

O dirigente do MST apontou saídas distintas defendidas por diferentes setores da sociedade para o enfrentamento das crises existentes no Brasil, que vão desde à volta ao neoliberalismo, à tentativa de impeachment até a construção de um programa unitário que avance econômica, social e politicamente.

A proposta da burguesia seria a retomada do neoliberalismo por meio da Agenda Brasil. Essa proposta prevê o realinhamento da economia brasileira à norte-americana, redução do papel do Estado e corte de custos de mão de obra.

“A burguesia não pode fazer a disputa ideológica às claras e dizer à sociedade que as suas propostas representam a retomada do neoliberalismo, isso porque esse programa já foi derrotado quatro vezes nas eleições. Então ela tenta viabilizar o seu programa pelos espaços institucionais, onde têm hegemonia. Aí essas propostas entram na pauta do Congresso Nacional e do Poder Judiciário, inclusive, tentam influenciar no governo Dilma através de seus ministros burgueses, mudando o nome neoliberalismo para Agenda Brasil”, acrescenta.

Golpe

Segundo Stedile, quem defende o golpe como solução às crises é a pequena burguesia, conhecida como classe média, que representa entre 5% e 10% da população brasileira.

“O impeachment, apoiado pelo senador Aécio Neves (PSDB), não resolveria os problemas do Brasil, pelo contrário. A viabilização jurídica de um golpe contra a presidente Dilma só agravaria e traria uma quarta crise: a institucional. Hoje, nem a substituição da presidente pelo vice Michel Temer (PMDB) e nem uma nova eleição resolveriam as três crises que vivemos. O que precisamos é construir blocos históricos de classes que apresentem alternativas de programas”, orienta.

Programa unitário

Para o dirigente do MST, são grandes os desafios da classe trabalhadora diante dos problemas do país, e nem todos os seus setores ainda perceberam a gravidade das crises.

“Há entre nós leituras reducionistas que acham que o único problema é derrubar a Dilma. Mas, a médio e a longo prazo, o nosso problema é mais estratégico: é desenvolver um programa unitário que tire o país da crise do ponto de vista econômico, social e político, e debatê-lo com a sociedade para que ela entenda o momento que estamos vivendo”, ressaltou. 

Stedile também defende a criação de um movimento de mobilização de massas que “tire o povo do sofá” e provoque a correlação de forças a favor da classe trabalhadora, além de um núcleo político que seja capaz de alinhar as mudanças necessárias para o país. 

“Falta à Dilma um núcleo político que a cerque e faça avaliações corretas da correlação de forças, do que está acontecendo. Dá dó de falar com aqueles ministros. O Levy [Joaquim Levy, ministro da Fazenda], além de ser neoliberal, não tem visão de Brasil. O que ele está fazendo, reduzindo os problemas da economia brasileira como se fossem apenas questões de Orçamento, é um desastre. Espero que Dilma veja logo para trocá-lo o quanto antes”, declara.

Manifesto

O dirigente do MST adianta que economistas devem lançar nos próximos dias um manifesto com propostas alternativas à política econômica, e abordou a necessidade de investimentos para retomar o crescimento do Brasil.

“Existem questões estruturais da economia que levarão muito tempo para serem resolvidas até ocorrer a retomada de investimentos produtivos. Mas existem questões práticas e imediatas que precisam do mínimo de discernimento, como essa, de diminuir a taxa de juros, não cortar gastos sociais e financiar indústrias para que haja crescimento econômico, emprego e distribuição de renda no país”, conclui.

A conjuntura nacional e os apontamentos para enfrentar as crises e nortear novos rumos ao país foram expostos por Stedile junto ao diretor do Instituto Lula, Paulo Vannuchi, durante o 14º Congresso Estadual da Central Única dos Trabalhadores (CECUT). Aproximadamente mil pessoas acompanharam a atividade, realizada no salão de eventos da Paróquia Pompéia, no bairro Floresta.