Com troca de membros da base do governo, CCJC rejeita relatório de denúncia contra Temer

Oposição denuncia estratégias do governo para blindar o presidente diante do conjunto de provas

 

Por Lizely Borges
Da página do MST

 

Marcada por denúncias da oposição sobre manobras do governo e tentativas para acelerar a votação e obstruir o debate em torno da denúncia de cometimento de crime de corrupção passiva pelo presidente Michel Temer (PMDB), a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara rejeitou, nesta quinta-feira (13), o parecer do relator, deputado Sérgio Zveiter (PMDB-RJ), pela admissibilidade da investigação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da denúncia realizada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. O relatório foi rejeitado por 40 membros do colegiado, em oposição a 25 votos de aceite ao parecer do peemedebista. A votação ainda registra uma abstenção.
 

O placar final foi avaliado pela oposição como artificial em razão das ações do governo e líderes da base para reverter o então desfavorável cenário para Temer. Nos últimos dias o governo temia não reunir os 34 votos contrários necessários para arquivamento do parecer de admissibilidade da denúncia. Para mudar este quadro, os líderes de partidos da base intensificaram substituições dos integrantes da Comissão. Embora a troca de membros de uma Comissão seja permitida pelo Regimento Interno da Casa, o alto número de mudanças evidencia uma ação articulada para obstruir o prosseguimento da denúncia. De um conjunto de 66 titulares do colegiado, 26 foram trocados pela base governista nos últimos dias.
 

“Se a gente não tivesse a trocas que ocorreram teríamos vencido. Foi uma votação manipulada pelo governo. O governo substitui membros para produzir este resultado falso graças a liberação de emendas parlamentares, dinheiro público e cargos nos ministérios, ao contrário do que o pais quer. É muito triste para o Brasil, causa indignação. Estamos envergonhamos do papel que governo e líderes partidários fizeram”, denuncia o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ). 
 

A denúncia foi presente também nas manifestações das demais legendas da oposição. O psolista Chico Alencar (RJ) destacou que o governo, ao assumir esta estratégia de rearranjo do colegiado, demonstra o interesse em silenciar a denúncia de crime, mesmo diante de indícios de materialidade e autoria. “Aqui se joga um jogo de cartas marcadas, um baralho viciado pelo toma lá da cá e compra de votos. (…) Com isso, a Câmara teve uma oportunidade de se aliciar com impunidade”

Diante da comemoração do resultado na sessão de hoje pelos partidos da base do governo, a deputada Maria do Rosário (PT-RS) questionou “O que eles estão comemorando? Eles comemoram a fome dos que sentem os mais pobres, eles comemoram a democracia que eles violam a cada instante, o dinheiro liberado para emendas”, diz. “É uma vergonha vê-los comemorando. Querem impedir que o povo brasileiro e o STF processem e julguem Michel Temer. Por que tanto medo? Por que não deixar que a denúncia chegue ao Supremo? ”, completou o colega de partido, Wadih Damous (RJ).

Mandado de segurança

No segundo dia de apreciação do parecer (11) pela CCJC, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, rejeitou o mandado de segurança de autoria do deputado Delegado Waldir (PR-GO) pela anulação da saída da Comissão. Pela ação do líder do partido, José Rocha (BA), o deputado perdeu assento na CCJC às vésperas de votação do parecer em razão de ser favorável à admissibilidade da denúncia. 
“Soube através da imprensa que fui tirado. Me venderam. Fui vendido. Nojento isso. É barganha, é barganha. Sabe o que é barganha para se manter no governo?”, manifestou-se o deputado Delegado Waldir (PR-GO) na semana passada.

Como o Partido da República (PR) compõe a base de governo, o deputado foi um dos parlamentares que sofreram represálias de seus próprios partidos por manifestar voto contrário à posição partidária. Para o caso do deputado, a ministra sustentou o indeferimento do mandato pelo argumento de que a decisão de substituição em Comissões é assunto do poder Legislativo, e desta forma “não compete ao Poder Judiciário (…) analisar o mérito de ato político conferido à autonomia de outro Poder estatal”.

Retaliações e ameaças
 

Desde que foi proferido, na segunda-feira (10), o parecer de admissibilidade da denúncia, Zveiter vem sofrendo pressão do partido que integra, o PMDB. Durante apreciação do relatório o parlamentar foi ameaçado de sofrer expulsão. “Entendo que ele não tem condições de ficar no partido”, manifestou-se o vice-líder da bancada do PMDB, Carlos Marun (MS). A posição das lideranças é de que o conjunto de parlamentares da sigla deveria atuar para blindar Temer.

A conduta do parlamentar não é alvo único de críticas. A atuação do Ministério Público (MP) e da Procuradoria Geral da República (PGR), por terem papel importante na construção da denúncia, recebeu duras críticas da ala governista durante as sessões na CCJC.

“O relator foi chamado de despachante do MP. Tenta-se agredir o relator, justo aqueles que estão de joelhos para o Palácio do Planalto, que seguramente está orquestrando uma ação de precificar os deputados. Temer já utiliza o estado em benefício próprio, não apenas nos R$ 500 mil [valor da propina mensal da JBS], mas na tentativa de se salvar. Então eu pergunto, que governabilidade é essa? ”, critica a deputada diante dos argumentos do governo que o seguimento da ação pelo STF deve ferir a governabilidade do país. 

Liberação de emendas
 

Outra denúncia presente nas manifestações da oposição durante as sessões foi a de que para conseguir quórum mínimo para rejeição da denúncia contra Temer pela CCJC o governo liberou um grande montante de emendas. Apenas no mês de junho, período de intensificação da crise envolvendo Temer e aliados, foram liberadas R$ 529 milhões em emendas parlamentares. Até o mês anterior foram transferidos o total de R$ 959 milhões, de acordo com o levantamento da Reuters no sistema de gastos orçamentários.
 

Gerenciadas pelo governo federal, a liberação de emendas à senadores e deputados federais é uma maneira de manter fidelidade da base de governo ao Executivo. A distribuição dos maiores montantes evidencia o uso político no gerenciamento dos recursos públicos. O presidente da CCJC, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG) recebeu R$ 2,7 milhões. Já o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a quem Temer nomeou e “leal” na semana passada, recebeu R$ 3 milhões em emendas. A senadora Marta Suplicy (PMDB-SP), que desempenhou importante papel da aprovação da reforma trabalhista concluída nesta semana, recebeu o vultuoso valor de R$ 9,4 milhões. 
 

Como a continuidade das investigações sobre a denúncia contra Temer é de interesse público, com 85% de aprovação pelos entrevistados pela Pesquisa DataPoder, os parlamentares problematizaram que o uso do recurso público liberado nas emendas contraria o próprio interesse público. “Usam do dinheiro público para contrariar o interesse público. Que vergonha usar o que é do povo para dar um tapa na cara do povo”, denuncia Molon.
 

Votação pelo Plenário

Ainda que a oposição tenha sofrido uma derrota na CCJC, os parlamentares defendem que o tempo conta a favor do seguimento da investigação. “O tempo fala contra Temer porque durante todo este período [de recesso parlamentar] teremos novas denúncias de Funaro [doleiro Lúcio], Cunha [Eduardo, ex-presidente da Câmara] e Rocha Loures [assessor de Temer, envolvido no recebimento da propina]. Janot deve apresentar nova denúncia contra Temer sobre obstrução de justiça, e posteriormente organização de quadrilha”, aponta o deputado Ivan sobre denúncias futuras. Ele ainda estaca a pressão popular que deputados governistas devem sofrer no período “Quando os deputados forem para suas bases vão ser pressionados. 85% dos brasileiros querem a saída imediata de Temer”, diz em referência à pesquisa de popularidade do presidente.
 

Diante da rejeição ao parecer do deputado Sérgio Zveiter, a CCJC votou aprovou o relatório do deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG). O novo parecer recomenda a rejeição pelo Plenário da denúncia contra Temer. Com decisão final sobre a autorização de investigação da denúncia pelo STF, o parecer deve ser votado pelo Plenário em data a ser definida pelo presidente da Câmara e líderes dos partidos.

 

Editado por Geanini Hackbardt