O legado de um comandante invicto

Fidel estaria de braços abertos para receber seu exército de batas brancas, que cumpriram seu mais nobre dever de salvar vidas aqui no Brasil, no Programa Mais Médicos
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Há dois anos perdemos a presença física do comandante Fidel.
Foto: Divulgação MST

 

Por Judite Santos
Da Página do MST

 

Neste 25 de novembro completam-se dois anos da partida física do comandante Fidel Castro. Prestamos nossa homenagem a este que foi sem dúvida, o maior dirigente revolucionário nessa quadra histórica em que vivemos.

Fidel Castro Ruz nasceu em 13 de agosto de 1926, no pequeno povoado de Birán, região oriental de Cuba. Seu pai havia sido recruta do exército espanhol na luta contra a independência de Cuba e depois retornou para instalar seu negócio e fazer sua vida na ilha, sua mãe era filha de camponeses pobres de Pinar del Río, região ocidental de Cuba. Don Angel Castro e Dona Lina Ruz se casaram em 1922 e tiveram 7 sete filhos, entre eles

Fidel e Raul Castro, que futuramente se tornaram os principais líderes da Revolução Cubana.
Desde jovem Fidel Castro começou sua vida política como líder na luta contra o regime ditatorial em Cuba, rebelando-se contra a ordem vigente e construindo na maioria oprimida – o sujeito social como protagonista do processo de libertação nacional.

Após o golpe de março de 1952, que levou ao governo o ditador Fulgêncio Batista, Fidel se dedicou a organizar um movimento clandestino com ideias revolucionarias. A única saída seria a tomada do poder.

O radicalismo do assalto ao quartel Moncada, em 26 de julho de 1953, evidencia o jovem Fidel determinado a organizar uma luta valente e audaciosa para libertar Cuba da tirania.

Além de denunciar os crimes cometidos contra os assaltantes do quartel Moncada, ele apresentou um consistente programa político do que viria a ser a Revolução Cubana. Fidel anunciou na época, “condenem-me, não importa. A história me absolverá”.

Após o fracasso do assalto ao quartel Moncada, Fidel cumpriu quase dois anos de reclusão, etapa onde pode amadurecer com uma firmeza inabalável os propósitos da Revolução. Saiu da prisão com a missão de fundar um movimento para dar continuidade ao processo revolucionário em Cuba, afirmando que a liberdade nada mais era do que o dever de seguir lutando. Assim, no dia 12 de junho de 1955, fundou o Movimento 26 de Julho, com a participação de Aydée Santamaría, Ñico López e outros revolucionários cubanos.

Logo parte para o exílio no México e ali começa a organizar um grupo de combatentes que voltariam à Cuba para implementar a luta guerrilheira. No México Fidel Castro conheceu Che Guevara e, desde então, tornaram-se amigos com profundo afeto entre si e compromisso com a transformação social.

Aos 30 anos de idade, Fidel Castro parte para Cuba, em um iate com 82 expedicionários a bordo, que desencadeiam a luta revolucionaria na Sierra Maestra, em dezembro de 1956. Surge assim, o Exército Rebelde que triunfa em pouco mais de dois anos, em janeiro de 1959.

Fidel Castro foi uma liderança que deixou a sua marca na história. Ferrenho defensor da bandeira anti-imperialista, como líder comunista jogou um papel fundamental e influente nos assuntos globais. Seu legado deve emanar na rebeldia, principalmente da juventude, em um período que vivemos a reascensão conservadora sob forte ameaça de uma nova forma fascista, com o aprofundamento da violência, perda da soberania e a crescente pauperização da classe trabalhadora.

Neste sentido, recordamos Fidel como:

Soldado das ideias 

Fidel foi um grande defensor da batalha das ideias, no momento mais difícil da Revolução Cubana. No chamado período especial, lançou o desafio da luta ideológica como forma de enfrentar o imperialismo. O debate massivo sobre os rumos da revolução, a defesa da ética revolucionária, bem como o caráter socialista baseado em princípios e valores éticos, foi o que garantiu a continuidade da unidade nacional e internacional em torno do socialismo.

Para os tempos atuais, é fundamental pensar na batalha ideológica como forma de enfrentar o rebaixamento da luta política que a direita ultraconservadora está tentando nos impor. É necessário que os instrumentos da classe trabalhadora, como partidos, sindicatos e movimentos sociais, tenham em conta a disputa pelo conteúdo ideológico na luta de classes em seus programas para o próximo período.

Fidel foi capaz de elaborar um pensamento crítico que transformou Cuba numa sociedade altiva e disposta a levar adiante a construção de uma nova sociabilidade. O silêncio que reinava em meio a uma multidão durante as longas horas de discursos na Praça da Revolução era uma prova do seu papel como educador do povo. 

Comandante das massas

 

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Fidel Castro sempre teve um vínculo indissolúvel com as massas. Foi um educador com brilhante oratória e enorme capacidade de dialogar com os setores populares. Entregou-se sem limites à causa da Revolução.

Che Guevara, ao despedir-se em 1965, antes de partir para Bolívia, chamou-o de brilhante estadista ao reconhecer o papel de comandante em chefe num dos momentos mais difíceis de Cuba: a crise dos misseis. Nas palavras de Che “vivi dias magníficos e a teu lado, senti o orgulho de pertencer ao nosso povo nos dias brilhantes, embora tristes, da crise caribenha. Raramente um estadista foi mais brilhante do que você naqueles dias. Orgulho-me, também, de ter te seguido sem vacilar, identificado com tua maneira de pensar e analisar os perigos e os princípios”. 

Os ideólogos da burguesia quiseram atribuir a Fidel um status de assassino, ditador e outros tantos atributos para desconstruir a sua imagem, mas a história demonstrou seu exemplo desde o líder guerrilheiro ao extraordinário estadista carregado de valores humanos como a humildade e o carisma enquanto essência da sua personalidade. Desde jovem soube agregar a militância, construiu a unidade em torno de uma ideia e de um objetivo: salvar Cuba da tirania. 

Quando nos deixou, uma multidão saiu às ruas dar o ultimo adeus àquele que foi artífice da dignidade humana em Cuba. A Caravana da Liberdade, de janeiro de 1959, foi reeditada no sentido inverso até chegar novamente no berço da revolução, em Santiago de Cuba, “onde, como no resto do país, recebeu o testemunho de amor dos cubanos”, como discursou Raul Castro, no dia 03 de dezembro de 2016, na última cerimônia de despedida de Fidel.

Mas não foi somente Cuba que chorou sua partida, nós também choramos, o mundo chorou e não foi um lamento de tristeza, choramos a alegria de haver tido a oportunidade de viver este tempo histórico e conhecido a grandeza deste ser humano. Cada confim deste planeta demonstrou com um gesto simbólico de lealdade e num eco que vinha desde Cuba, também gritamos juntos: “yo soy Fidel”!

Estrategista radical 

Desde o assalto ao quartel Moncada, Fidel Castro demonstrou ter a convicção de que a luta para derrotar o inimigo tinha que ser longa e radical. A tomada do poder era um requisito indispensável para a transformação de Cuba, ele se propunha ir ao “assalto aos céus”, a partir do mundo colonizado chamado América Latina, como nos disse Fernando Martínez Heredia. 

Depois veio o desembarque do iate Granma, surpreendido pelas forças do exército que quase acabou com a epopeia dos jovens revolucionários, e, logo, Sierra Maestra, onde provou sua capacidade como estrategista no Exército Rebelde. Cada combate, cada vitória assegurava que o caminho elegido levaria mais cedo ou mais tarde ao triunfo revolucionário.

Não foram dias fáceis para o Movimento 26 de julho, os meses de guerrilha na Sierra Maestra, somada à luta clandestina de milhares de operários, campesinos e estudantes na cidade, tornou possível a vitória estratégica. E após, cinco anos e cinco meses e cinco dias, do Moncada, num 1° de janeiro de 1959, o Exército Rebelde triunfou em Cuba. A luta estava só começando…

Fidel dirigiu a Revolução Cubana durante mais de 50 anos, sempre com a capacidade de olhar para frente, saber escutar e conversar. A revolução foi sem dúvida uma obra coletiva, mas sem a direção de Fidel e seus companheiros possivelmente não teria chegado aonde chegou. Içar a Revolução Cubana como parte fundamental do movimento revolucionário mundial foi um dos seus maiores méritos. 

 

Anti-imperialista convicto

Fidel sempre soube que o maior inimigo de Cuba era o imperialismo. Ainda na Sierra Maestra, em 6 de junho de 1958, escreveu à Celia Sánchez uma carta onde expressava que seu verdadeiro destino seria a luta contra o imperialismo.  E assim, a bandeira anti-imperialista tem sido uma constante na política revolucionária cubana.

Quando os Estados Unidos perceberam que havia uma Revolução embaixo de seu nariz, tentaram de todas as formas esmagá-la. A invasão de Playa Girón, ou Bahia dos Porcos, como é conhecida, foi um dos episódios mais radicais depois do triunfo revolucionário e marcou um momento importante na história da Revolução: foi a primeira derrota imperialista na América Latina.

Este episódio levou Cuba ao seu caminho sem volta, quando Fidel declarou o Caráter Socialista da Revolução, em 16 de abril de 1961.

Fidel foi um dos maiores anti-imperialistas da historia contemporânea. Criticou veementemente todas as formas de opressão, as guerras e as formas de ingerência praticada pelos EUA, durante mais de meio século até os últimos dias da sua vida, afirmando sempre que a soberania nacional é intangível e não se negocia.

 

Este maestro ensinou que é imprescindível o anti-imperialismo como palavra de ordem do campo popular para guiar os processos de mudanças sociais, principalmente na América Latina.

 

Internacionalista 

Com o mesmo espírito em que Fidel se tornou anti-imperialista  convicto, também se tornou um impulsionador e dirigente internacionalista, afinal, para combater o capitalismo na sua forma  imperialista, é preciso travar uma luta de caráter internacional.

O internacionalismo cubano é baseado na solidariedade entre os povos. Foi com este sentido de solidariedade humana que Cuba enviou ajuda a outros povos do mundo na luta contra o colonialismo e a agressão imperialista, sobretudo no continente africano.

A Revolução Cubana foi fundamental para a derrota do regime racista do apartheid Sul-africano, participando decisivamente no processo de independência de Angola e da Namíbia. Sem a participação de meio milhão de cubanos sob comando de Fidel Castro na Operação Carlota, não teria sido possível a vitória de Angola, em 16 anos de guerra pela integridade territorial.

Para Fidel Castro, “solidariedade não é dar o que nos sobra e sim o que nos faz falta”, dessa maneira, o abnegado povo cubano apresentou ao mundo as qualidades humanas forjadas pela Revolução. Desde combatentes, médicos, professores, técnicos e muitas outras profissões, com Fidel sempre à frente, Cuba provou que era possível combater o criminal bloqueio econômico imposto pelos EUA e multiplicar-se de maneira fraterna e solidária no mundo, levando apoio e solidariedade aos povos mais necessitados.

Cuba também abriu as portas para milhares de estudantes do mundo inteiro sem cobrar-lhes um centavo, a maioria proveniente dos países mais pobres. Hoje continuam enviando médicos e profissionais da saúde para prestar serviços em diferentes partes do mundo.

Certamente, Fidel estaria de braços abertos para receber seu exército de batas brancas, que cumpriram seu mais nobre dever de salvar vidas aqui no Brasil, no Programa Mais Médicos, e os chamaria novamente de “verdadeiro guardião da saúde e da vida, prestes a marchar para qualquer país onde seja necessário, e convencido de que um mundo melhor é possível”.

Estes internacionalistas, médicos extraordinários, agora retornam à sua pátria com o dever cumprido e um profundo sentimento em deixar um país onde a política do ódio prevaleceu ao amor pela vida. Não temos dúvidas de que estes estarão dispostos a sair pelos rincões do mundo cumprir outras missões humanitárias.

 
É importante sempre, ao evocarmos o legado de Fidel Castro, considerar o momento histórico em que vivemos: não basta exaltar as qualidades extraordinárias deste comandante exemplar, precisamos traduzir Fidel para a nossa realidade e agarrar as suas contribuições como instrumento da nossa ação. 

Homenagear Fidel é reivindicá-lo enquanto autoridade moral na luta pelo socialismo!

 

 

*Editado por Solange Engelmann.