Maternidade sem terra
Rafaela Ferreira
Do Coletivo Magnífica Mundi
Caminhando pela plenária do Pavilhão do Parque, pergunto a Vivi – quem me indicou a possível e futura fonte para entrevista – como ela é. Ela me responde “Baixinha, de cabelo liso e comprido, usando blusa branca”. Com tais informações, começamos a caçá-la no mar de mulheres que inunda o I Encontro Nacional de Mulheres Sem Terra, em Brasília.
Depois de fracassar na busca, outra pessoa me ajuda na procura por Deny Vasconcelos. Enfim, encontrada. As informações passadas sobre ela pareciam justas para mim – com exceção da blusa branca que foi mascarada por uma de frio marrom. Peço para ela dez minutos para preparar os equipamentos da entrevista. Na volta, a perco novamente. Mas, depois de uma breve procura, Deny – que me encontra e não o contrário – acena para mim.
Voltara com um leve tom de batom rosa na boca. Paciente, Deny espera minha colega e eu ajeitarmos os equipamentos de filmagem. Finalmente começamos a imersão na vida de Vasconcelos. As informações iniciais são as mais básicas: De onde é? Seria assentada ou acampada? Com simpatia, Deny me responde com um sorriso: mora no Acampamento Chico Mendes, em Benevides, um município do estado do Pará.
Sentadas entre algumas tendas brancas do I Encontro, Deny responde minha primeira pergunta, depois de um longo suspiro dado por ela. O que é ser mulher dentro do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra? Depois da pausa, veio o sorriso, e, em seguida, a resposta. Ela me disse que ser mulher no movimento é conhecer seus direitos. A faixa que cobria seus olhos foi tirada, disse ainda.
Porém, ela lembra que o conhecimento também trouxe perseguição. A líder do acampamento relata que, dentro do Chico Mendes, sofre com um grupo de pessoas, por não ter tanto bens materiais, o que faz com que pensem menos dela.
“Me acham fraca por ser mulher e mãe solo”, me disse ela em seguida. Não foi a primeira vez que tinha mencionado a maternidade, mas foi a frase que estreou o pensamento patriarcal que é o relacionar a maternidade com fraqueza e falta de habilidades de liderança.
Deny se descreve como uma pessoa muito família. Reparo que a menção a sua mãe já tinha se repetido algumas vezes durante a entrevista, então, pergunto se essa seria uma fonte de inspiração. Sem hesitar, Deny me responde em bom som: “Ela é tudo”. Foi devido a uma visita a mãe, há 6 anos atrás, que Vasconcelos ingressou no movimento.
Deny também menciona seus filhos ao falar de cada detalhe da sua vida. Entre uma pergunta e outra, ela conta como o grupo é unido, o que a faz lembrar que seus filhos não são criados apenas por ela. O acampamento ajuda na criação, redefinindo, para ela, o que é viver a maternidade.
Durante esta conversa, com um olhar nostálgico, Deny relembra um conselho dado por seu eterno comandante – como ele dizia – “Deny, estuda!”. Ainda lembrando do passado, a líder conta como colocava dificuldades nesse conselho. Não sabia como faria isso tendo seus filhos.
Foi a parceria das companheiras que a incentivou. “Não sou só eu quem educa meus filhos”, me contou ela novamente. “Se você for mãe, eles vão ajudar”. A frase fez ainda mais sentido quando Deny começou a contar sobre sua vinda do Pará à Brasília, para o I Encontro Nacional, em que, devido a uma semana ruim de serviço com as hortaliças, ficou sem dinheiro para a viagem.
“Oito reais e uma criança”. Foram as palavras para descrever a situação dela e de sua filha de 6 anos. Porém, foi com ajuda e apoio das companheiras que Deny tomou a decisão de vir para o evento.
A entrevista acaba. Ao desligar o microfone, Deny parecia feliz. Pode parecer devaneios de uma pós entrevista, porém, enquanto Deny caminhava de volta entre aquelas tendas brancas, ela não me parecia nem um pouco baixinha.
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Este perfil faz parte do especial “O que é ser mulher Sem Terra”. Leia mais perfis aqui:
*Edição: Ednubia Ghisi