A quarentena, o Fascista e a violência contra as mulheres

Artigo lembra a importância da iniciativa do MST contra o vírus e violências
Campanha “Mulheres Sem Terra: Contra os vírus e as violências

Por Coletivo Nacional de Gênero do MST
Da Página do MST

Não morrer dos vírus nem dos covardes!

A quarentena, deveria ser uma condição possível a todas/os com foco em salvar as vidas das pessoas de forma geral, no entanto, a necessidade dela mostra duas questões prementes de serem enfrentadas. A primeira delas é que o isolamento social se tornou um direito apenas de um setor da sociedade com emprego formal e condições econômicas, não sendo a realidade de mais de 40% da população que vivem em trabalho informal. As parcas ações estatais aprovadas não foram suficientes para garantir a permanência da classe trabalhadora em casa.

A segunda questão tão trágica quanto a impossibilidade de ficar em casa é o desvelamento de que para as mulheres a casa, o lar, é o lugar mais inseguro do mundo. É onde, nós mulheres, corremos mais risco. Isso porque 76,4% das mulheres que sofreram violência denunciam que o agressor era alguém conhecido, quase sempre de dentro de casa. Mulheres pretas e pardas são mais vitimadas do que as brancas; as jovens, mais do que as mais velhas.

Um levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em parceria com a empresa Decode, feito a pedido do Banco Mundial, revela aumento de 431% em relatos de brigas de casal por vizinhos em redes sociais entre fevereiro e abril deste ano. A mesma instituição registra que os casos de feminicídio cresceram 22,2%, entre março e abril deste ano, em 12 estados do país, comparativamente ao ano passado.

No início da quarentena o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro divulgou o aumento de mais 50% dos casos de violência no Estado. Já em São Paulo, entre 19 de março e 13 de abril houve uma aumento de mais de 50% de feminicídio dentro de casa, em comparação ao mesmo período do ano passado, de acordo com os dados da Secretaria de Segurança Pública. Os índices assustadores se repetiram no Rio Grande do Norte no Distrito Federal.

No entanto, por mais que estes números em si já sejam preocupantes, outras formas de violências não estão contabilizadas nesse cálculo, como a jornada de trabalho com os afazeres domésticos e processos de cuidados, mesmo antes da pandemia as mulheres já dedicavam o dobro ou triplo de tempo que os homens.

Os dados coletados pela Fiocruz entre 24 de abril a 8 de maio revelam as mudanças na rotina, no trabalho, no estado de ânimo e também nos aspectos socioeconômico das mulheres. Foram relataram mais problemas no estado de ânimo: as que se sentem tristes ou frequentemente deprimidas foram 50% das entrevistadas, enquanto para os homens esse percentual chegou a 30%. O índice de quem disse ter se sentido ansioso ou nervoso no período foi de 60% para as entrevistadas, chegando a 43% no segmento masculino. A explicação está, entre outros fatores, no excesso de trabalho que cabe a elas durante a pandemia: 26,4% delas afirmam que o trabalho doméstico aumentou muito, percentual mais de duas vezes maior que o dos homens, 13,1%.

Importante marcar que o estado brasileiro na figura do presidente Jair Bolsonaro, reconhecidamente misógino e complacente com a violência, tendo sido ele mesmo agressor em algumas situações apresentou como solução para a violência o fim da quarentena, pois sendo assim a saída dos homens para o trabalho, e também a organização financeira reduziria os casos, ou seja, a melhor proposta deste governo para as mulheres é morrerem, seja pelo vírus seja pela violência doméstica.

A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, segue a linha de defesa do governo, pregando o fim da quarentena ou a quarentena vertical, o uso da cloroquina, mas sem anunciar ações efetivas de enfrentamento ao aumento da violência doméstica. O que não de se estranhar considerando que na realidade esse aumento ficou pronunciado na quarentena, mas já vinha ocorrendo pois em 2019 houve um aumento de 7,2% no feminicídio em comparação com 2018.

Ou seja, mesmo o ministério tendo no nome a mulher e a família, não é efetivamente este o foco de atuação, visto que em reunião ministerial, um ministro propõem incentivar turismo sexual, e a ministra da família diz que aceita se não for fazer lavagem de dinheiro.

Sem poder contar com a atuação estatal diversas organizações tem desenvolvido ações para enfrentar esta realidade, desde ações de solidariedade em doação de alimentos, como as desenvolvidas pela Periferia Viva, a Nós por Nós, mas também para enfrentar a violência, a partir de chamadas distintas a atuação tem como foco não morrer nem pelo vírus, nem pelos covardes, é nessa construção que o MST lança a Campanha Mulheres Sem Terra: Contra os Vírus e as violências.

A campanha tem se constituída em 03 eixos.

No primeiro aborda a violência contra as mulheres, mas também contra outros sujeitos vulnerabilizados como as crianças, as LGBT, e as/os idosas/os; com perspectiva de prevenção, com campanhas de esclarecimentos e formação em áreas de assentamentos e acampamentos – adequadas aos tempos de distanciamentos social. Mas também incentivando a construção de redes de solidariedade para acolhimento de é vitima, temos certeza que a construção de territórios de resistência necessita enfrentar todas as formas de violência.

No segundo busca debater a divisão sexual do trabalho, compreendendo que a sobrecarga das mulheres com o trabalho reprodutivo, e a invisibilidade deste estão nas raízes da opressão e exploração das mulheres, e no campo essa invisibilidade estende-se para o trabalho nos quintais e no roçado.

No terceiro eixo abordamos a produção, entendendo que não se produz alimentos saudáveis com relações doentes, nossos territórios devem enfrentar o uso de agrotóxicos, repensar as relações com a natureza e as relações humanas, a construção da agroecologia requer necessariamente que reconstruamos nossa experiência no processo de produção e reprodução da vida.

Por fim, o MST propõe a construção de novas relações humanas a partir do romper de cada cerca, nos acampamentos e assentamentos. E nesta semana lança o Plano Emergencial da Reforma Agrária. As mulheres Sem Terra, somam-se ao coro antifascista, anunciando que a saída para transformar nossas vidas é tomar tudo aquilo que nos é de direito, a começar pela democracia e pela terra. Assim torna-se fundamental a nossas vidas minar toda forma de retrocesso imposta pela violência da reedição de um passado sangrento. Convocamos a todas as mulheres deste Brasil a levantar a voz mais uma vez para gritar ele não! Ele nunca! Pela vida de todas as mulheres fora Bolsonaro e Reforma Agrária já.

#FiqueEmCasaMasNãoEmSilêncio

#MulheresSemTerra

#ContraosViruseEasViolências

*Editado por Fernanda Alcântara