Estudo

“A crise econômica, social, ambiental, política e agrária não são por acaso”

Durante participação em Seminário, Delwek Matheus, do MST, reforça a necessidade de um modelo de economia que não favoreça e dependa do agronegócio
Foto: Reprodução

Por Filipe Augusto Peres
Da Página do MST

Ocorrido nesta última quinta-feira (4/8), por iniciativa do Conselho Estadual de Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo (CONDEPE), o Seminário São Paulo de Todos os Direitos teve como objetivo refletir a atual situação das políticas de Direitos Humanos e propor política públicas de promoção da cidadania para quem for governar o Estado de São Paulo pelos próximos 4 anos.

Intitulado de “Seminário Direitos Humanos, Questões Agrárias e Meio Ambiente” foi o segundo de uma série de dezesseis espaços que ocorrerão até o dia 25 de agosto.

Mediado por Maria de Fátima da Silva, conselheira e vice-presidenta do CONDEPE, o seminário desta sexta-feira contou com as participações de Delwek Matheus, dirigente nacional do MST; Francisco de Assis Campos (Tito), da Comissão Pastoral da Terra (CPT); Cássia Fellet, do Fórum Popular da Natureza; Oriel Rodrigues Morais, membro da Rede Nacional dos Advogados e Advogadas Quilombolas (RENAAQ), integrante da assessoria jurídica da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ) e doutorando em Direito Agrário pela Universidade Federal de Goiás (UFG); José Justino Desidério filho (Zezinho), da Federação da Agricultura Familiar de São Paulo (FAF); e Susana Prizendt, da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, do Movimento Urbano de Agroecologia (MUDA) e da Articulação Paulista de Agroecologia.

Delweck Matheus, do MST pelo setor de produção, afirmou ser o momento de se fazer o debate sobre os direitos humanos e, principalmente, sobre a questão agrária. Para ele, o país atravessa um período em que, possivelmente, estarão colocados na política dois projetos bem diferentes, onde a participação popular no processo de disputa política e de construção de um possível novo governo será primordial. O dirigente nacional pediu que se faça uma profunda reflexão sobre a crise econômica, social, ambiental e política que o país atravessa.

Primeiro é preciso a gente, de fato, fazer uma reflexão profunda da crise que nós temos hoje, e que essa crise é a crise econômica, social, ambiental e política, principalmente no caso da reforma agrária. Ela tem uma causa, não é por acaso, é o modelo de desenvolvimento capitalista que a gente vive hoje, o qual tem o modelo de economia que favorece e depende do chamado agronegócio, organizado a partir do interesse do capital financeiro internacional.”

O militante do MST lembrou a perda de direitos em relação aos direitos do campo durante o governo Bolsonaro. Essas perdas geraram também uma profunda crise ambiental no país.

“Nós tivemos um grande retrocesso na luta pela terra nesses últimos 3, 4 anos. Eu imagino que a gente voltou 40 anos atrás em termos de perdas de direitos, somente no campo, e da mesma forma uma crise ambiental profunda devido a esse modelo capitalista.”

Ele afirmou também ser de extrema importância retomar os direitos fundamentais da população, principalmente o acesso à alimentação.

“A questão fundamental no centro do debate é exatamente a questão do direito dos seres humanos a questões básicas como trabalho, renda, moradia, saúde, educação, mas, fundamentalmente, a comida. Nós estamos em um grau de degradação social, de desigualdade, que leva milhões de pessoas a passarem fome, passarem necessidade de alimentação. A gente chega no extremo quando as pessoas, o ser humano não tem alimentação.”

Luta pela Reforma Agrária

Para Delwek, o grande debate que está em pauta é a retomada do processo da luta pela reforma agrária no Brasil e a criação de melhores condições socioeconômicas, culturais e políticas no campo.

Ele criticou o forte retrocesso ocorrido em São Paulo com as aprovações dos PLs 410 e 277, legalizando a grilagem de terras no Estado. “É primordial mudar a situação fundiária no país. Sem reforma agrária não se modificará a correlação de poder.”

“É necessário retomar o debate da propriedade da terra, da função social da terra e mexer na estrutura fundiária. De certa forma, os órgãos de Estado, e principalmente o ITESP (Instituto de Terras do Estado de São Paulo) tem que se colocar. A sua função principal é fazer a arrecadação de terra, principalmente pública, para fazer assentamento.”

Delvek também chamou atenção para a necessidade de recuperação dos assentamentos de reforma agrária, a criação de novos e a implementação de políticas públicas voltadas ao fortalecimento da produção de alimentos orgânicos, agroecológicos que cheguem à classe trabalhadora, além de preservarem o meio ambiente

“Nós tivemos muitas perdas de direitos no campo. E isso levou a um estado de degradação das condições de produção de viver no campo, no assentamento. A gente precisa reorganizar os assentamentos levando em consideração vários aspectos que a gente acabou perdendo, desde condições do solo, crédito, assistência técnica, condições de mercado, vender a produção. Em um segundo patamar, uma discussão para os novos assentamentos. A gente tem necessidade de fazer novos assentamentos.”

E seguiu:

“Dentro dessa perspectiva, nós estamos colocando a necessidade para a gente pensar políticas públicas voltadas para a questão do fortalecimento da produção de alimentos, principalmente alimentos orgânicos, agroecológicos, políticas públicas que valorizem essa produção e coloque-as à disposição da população enquanto alimento.”

Por fim, o dirigente falou da importância de se fortalecer a organização do MST, suas cooperativas, pensando, também no desenvolvimento de agroindústrias.

“Até porque, hoje, dado o grau de desenvolvimento humano, a gente precisa ter produtos com qualidade, mas produtos beneficiados. As nossas agroindústrias cooperativadas serão fundamentais para que, de fato, se valorize a produção. Agregar valor à produção e ao mesmo tempo criar condições de fazer com que essa produção se transforme em alimento saudável, colocando-o à disposição da população.”

A Fome não espera

Caso o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva (Lula) seja eleito, Delvek trouxe à tona a necessidade de se pensar um plano de emergência, logo que o governo assuma, que combata a fome que atinge mais de 33 milhões de brasileiros, atualmente.

“Pensar políticas públicas para criar as condições de produzir e esses alimentos no campo, ou seja, criar condições para a agricultura familiar, para as comunidades tradicionais, os assentamentos. Ter condições de produzir com crédito, com assistência técnica e, principalmente a política pública de aquisição e distribuição desse alimento. Nós precisamos criar uma logística para que esses alimentos cheguem nessa população mais carente”, finalizou.

Assista o Seminário na íntegra:

*Editado por Wesley Lima