Reforma Agrária Popular

MST em PE produz arroz agroecológico e recupera área de monocultivo de cana-de-açúcar

Em cada campo foram cultivadas quatro variedades de arroz, a ideia é estocar grãos colhidos e em 2024 comercializar
O assentamento Maré é um dos quatro locais que desenvolvem a experiência . Foto: MST em PE

Por Pedro Stropasolas
Do Brasil de Fato

De vez em quando dava vontade até de chorar de emoção”

“Há motivo de muita alegria. Eu nunca tinha pego um pé de arroz. Pessoalmente, só via pela televisão, e poder estar cultivando é só alegria mesmo”, define a agricultora Joelma Albuquerque, do assentamento Maré, em Aliança (PE), que participa de uma iniciativa que busca transformar o deserto da cana-de-açúcar em produção de alimento saudável. 

Em julho deste ano, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) iniciou uma experiência de produção de arroz agroecológico em Pernambuco. A iniciativa nasceu de uma parceria entre o movimento e o governo do estado, por meio do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA).

“Quando cheguei aqui há 18 anos, eu não conhecia nada de cultivo e plantação. Hoje, tudo o que eu sei foi através do movimento, do MST”, lembra o agricultor Leodilson Soares, também do Maré, que participa da produção. 

O assentamento Maré, na Mata Norte, é um dos quatro assentamentos que fazem parte da produção experimental do arroz agroecológico. A emoção para as famílias do MST é grande. Muitas delas estão conhecendo o cultivo de de arroz pela primeira vez 

“De vez em quando dava vontade até de chorar de emoção, que a gente nunca esperava, e particularmente eu, nunca esperava estar numa plantação dessa de arroz”, conta Leodilson.

O assentamento que fica no município de Aliança é uma das áreas com a produção mais avançada e organizou em novembro a primeira festa da colheita do grão fruto da parceria. Os outros assentamentos contemplados estão na região da Mata Sul, na região Metropolitana, e no Sertão.

Em cada campo experimental foram cultivadas quatro variedades de arroz. O cereal foi plantado em fileiras contínuas em sistemas de sulco com uma profundidade de cerca de 3 centímetros. O tempo do plantio da colheita é de 120 dias. E a ideia é estocar os grãos colhidos para que em 2024 se inicie a comercialização. 

“A primeira questão da adaptação do arroz, tipo arroz A-502 e o esmeralda foram os que mais se adaptaram aqui. É um experimento, uma parceria com o governo do estado, através do IPA, e com o MST para as áreas de assentamentos de reforma agrária”, explica Fernando Lourenço, da direção nacional do MST em Pernambuco. 

“Foi um hectare só de experimento dessas quatro variedades, para ver a adaptação de cada um deles. Isso, no próximo período sendo mecanizado, o governo investindo com mecanização e também com o adapto da área, o solo, a adaptação, a gente vai ter uma renda boa. E a nossa intenção é vender para a Conab [Companhia Nacional de Abastecimento], vender para o governo do estado e o governo federal”, detalha Fernando. 

Em visita a comunidade no dia da nossa reportagem, o técnico da Conab Herivelton Marculino conheceu o cultivo e constatou que a produção do MST é promissora. 

“Já percebemos que tiveram expressividade melhor em termos de produção e já observando aqui rapidamente percebemos que houve uma boa adaptação, depois quando colher a gente vai ter que analisar a questão de produtividade, qual foi o que produziu mais, os resultados a nível qualitativo”, afirma o técnico.

Hoje, em Maré, são 60 famílias vinculadas à associação do assentamento, produzindo macaxeira, batata, coco, milho, feijão e hortaliças. A venda se dá em feiras livres e por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Com o arroz, a região ganha um incremento na busca por remodelar uma região marcada pelo desmatamento e pela exploração do trabalho nos canaviais.

“Hoje a importância do arroz aqui na nossa comunidade é porque queremos acabar com esse [monocultivo] de canas-de-açúcar, que são muito produtivas aqui. Queremos tirar esse cultivo e colocarmos outro cultivo dentro da nossa terra”, explica a assentada e presidenta da Associação Miguel Arraes (PE), Jaqueline Valeria. 

“Nós estamos nas maiores regiões. Esses assentamentos aqui, que antes eram os engenhos da cana-de-açúcar, hoje são assentamentos com um projeto de Reforma Agrária Popular. Podemos sair da cana-de-açúcar e produzir alimentos saudáveis, sair da monocultura, da escravidão para o povo brasileiro, principalmente para quem mora aqui na Zona da Mata. Nós queremos mudar essa rotina para os filhos, para os netos e produzir alimentos da agricultura familiar, com esse experimento, arroz orgânico, a hortaliça e outros produtos. A terra tem como desenvolver qualquer tipo de lavoura que a gente plantar”, conta Fernando sobre a região e a necessidade de transformação por meio da agroecologia e da luta pela terra.

Edição: Rebeca Cavalcante