“O MST é contra uma nova eleição, porque ela legalizaria o golpe”, afirma dirigente

Nei Zavaski, da coordenação do MST-MG, fala sobre os desafios da política atual
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Nei Zavaski/Reprodução

 

Por Rafaella Dotta
Do Brasil de Fato

Nei Zavaski, da direção estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Minas Gerais, fala nesta entrevista sobre um possível cenário de novas eleições gerais, o papel dos movimentos sociais diante do golpe e qual deveria ser a posição do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel. A entrevista foi realizada durante a Marcha pela Democracia, organizada pela Frente Brasil Popular, que saiu de Ouro Preto no dia 21 de abril e chega em Belo Horizonte no dia 26.

Parlamentares e setores de alguns partidos começam a sugerir que a convocação de nova eleição para a presidência pode ser uma boa saída para a crise política do país. Qual a avaliação do MST sobre isso?

O MST é contrário à realização de novas eleições hoje, mesmo que sejam eleições gerais, porque ela legaliza o golpe. Não é que novas eleições gerais sejam um golpe, mas elas dariam legalidade ao que já está acontecendo no Congresso hoje, um processo que é totalmente ilegítimo e corrupto. Isso seria admitir o inadmissível, que é a retirada de uma presidenta eleita no meio do mandato, sem nenhuma base legal. Nós já votamos em 2014, a eleição já aconteceu. Não foi eleita só a presidenta, foi eleito um projeto político que está sendo interrompido antes de ser efetivado. Ao se quebrar isso, não tem mais regra o jogo. Qual a estabilidade política e jurídica que o país teria caso isso aconteça?

Como a sociedade pode enfrentar essa crise de representação?

As instituições políticas do Brasil estão deslegitimadas. O Congresso não representa a população brasileira principalmente por causa do financiamento de campanha. Quem está representado no Congresso é o poder econômico, disso não há dúvida. A forma de resistência é a resistência popular. Essa é o único jeito de impedir o golpe e manter a ordem democrática no Brasil.

O que o MST pretende fazer se for consumada a deposição da presidenta?

A efetivação do golpe coloca, não só pro MST, mas para o conjunto da classe trabalhadora e das forças progressistas, um período de médio e longo prazo de luta e enfrentamento. O golpe traz um novo patamar na luta de classes no Brasil. E os movimentos populares têm que aprofundar o processo de luta, principalmente na resistência à perda de direitos. Essa é a linha do MST para o próximo período, não deixar um governo ilegítimo governar.

Como esse golpe, dado a nível nacional, pode prejudicar Minas Gerais?

Minas Gerais é um dos estados centrais onde foi derrotado o projeto neoliberal, representado aqui pelo PSDB. Outros estados que têm um importante poder econômico são dirigidos pelo projeto neoliberal. Minas Gerais é bola da vez. Uma vez efetivado a nível nacional, aqui será o próximo passo. Seja por qual via isso se der, as forças reacionárias que estão agindo para a derrubada da presidenta vão agir também no nosso estado.

Como essa marcha pode pressionar pra que esse golpe não aconteça em Minas?

O elemento central é consolidar um outro jeito de fazer política no país. Para o conjunto da sociedade só se faz política de dois em dois anos. Mas neste caso, estamos em marcha passando nas cidades, conversando com as pessoas e debatendo política no período não eleitoral. Isso acende uma luz no fim do túnel de uma outra possibilidade de fazer política e construir a democracia. Porque quem marcha sabe aonde quer chegar. A marcha faz parte de um processo de lutas nacionais, como o acampamento da resistência que já estão acontecendo no país, o acampamento da Legalidade no Rio Grande do Sul, que remonta a resistência contra o golpe sobre Jânio Quadros em 1964. O conjunto delas podem sim criar um caldo que impeça o golpe.

Qual posicionamento o MST espera do governador Fernando Pimentel?

O conjunto dos movimentos da Frente Brasil Popular espera que o governador Pimentel assuma um protagonismo na resistência ao golpe, que ele possa se sustentar na base social que derrotou o projeto neoliberal. Que ele seja o “bigode” do Leonel Brizola, pelo menos. Mas é importante dizer que a nossa posição dos movimentos não depende da decisão do governador. Ele acumula forças se tomar essa decisão. Mas a decisão já está tomada, que é a de resistência, e vai se efetivar com luta.

Como Pimentel poderia assumir esse protagonismo de resistência?

Para resistir ao golpe, ele precisa intensificar a construção de um projeto democrático popular para Minas. Isso significa transferência das terras devolutas para a Reforma Agrária, pagamento de todos os direitos do funcionalismo público, ação efetiva na Reforma Urbana com um plano de zerar o déficit habitacional no estado, mecanismos de sair da crise cobrando mais de quem tem mais. Com isso ele ativa a base social que o elegeu e contrapõe o projeto que se implementaria a partir do golpe, que é a retirada de direitos das camadas mais pobres. Mas é preciso contrapor com ação e não só com falas. Minas Gerais tem que ser uma grande trincheira de resistência.

Qual a avaliação do governo estadual até agora?

O governo estadual está se prendendo às mesmas amarras que levou o governo federal à condição em que ele está agora: tentar criar um pacto impossível entre a classe dominante e os trabalhadores. Isso é um problema, porque esse setor em determinado momento vai querer voltar a ser ele efetivamente que vai governar. Então não existe pacto possível. O governo de Minas Gerais precisa confiar no projeto que o elegeu e nele não havia espaço para conciliação. E o MST tem confiança na força social, que vai ser capaz de resistir ao golpe e construir esse projeto para o estado.