Jornada de Lutas

Jornada Nacional de Lutas de 2023 reafirma necessidade da Reforma Agrária Popular

Balanço traz mobilizações e perspectivas da Jornada Nacional de Lutas de Abril, com 20 mil pessoas mobilizadas e abertura de diálogo com governos estaduais e federal
Com o lema “Reforma Agrária, contra a fome e a escravidão: por Terra, Democracia e Meio Ambiente!”, MST mobilizou 18 estados com ações pelo país. Foto: MST-SC

Por Fernanda Alcântara
Da Paǵina do MST

Após um ano cheio de desafios políticos em 2022 e passada a quarentena produtiva, intensificada ao longo da pandemia, o MST realizou este ano uma positiva Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária Popular do MST de 2023. Com novos desafios no horizonte, o Movimento dos Sem Terra foi às ruas lutar pelo fim do trabalho escravo e da fome e defender a Reforma Agrária, a democracia, a garantia de direitos básicos para os trabalhadores do campo e a defesa da soberania alimentar e da agroecologia.

Neste período, o MST reafirmou o lema “Reforma Agrária, contra a fome e a escravidão: por Terra, Democracia e Meio Ambiente!” deste ano, a partir de mobilizações e atividades que dão visibilidade à Reforma Agrária Popular e trazendo a denúncia das injustiças sociais e das violações dos direitos humanos no campo, contra o agronegócio e a exploração dos trabalhadores rurais.

Ao todo, os Sem Terra realizam mobilizações em 18 estados, com 20 mil pessoas mobilizadas e um retorno positivo em relação à retomada de políticas ligadas à Reforma Agrária.

Foi uma Jornada de muita luta, muita resistência, onde nós pudemos fazer negociação com os governos dos estados, com os novos superintendentes do Incra já nomeados pelo presidente e o Ministro do MDA. Reafirmarmos a luta em defesa da vida, em defesa da Reforma Agrária, contra todas as formas de opressão e violência e combate ao trabalho escravo, às queimadas e ao desmatamento”, relata Margarida da Silva, da coordenação nacional do MST.

Ocupações, atos políticos, plantio de árvores, doações, negociações e marchas foram realizadas este ano para ressaltar a importância da Reforma Agrária Popular e da agricultura familiar camponesa, como fundamentais para o desenvolvimento econômico e social do Brasil. Hoje, os Sem Terra estão na linha de frente produção de alimentos saudáveis, que gera empregos e renda no campo, a conscientização sobre a importância da preservação ambiental.

Sem Terra realizam ato para relembrar mártires do 17 de abril. Foto: AL-BA
Negociação com os governos dos estados, nos Incras e com o governo federal reafirmaram defesa da Reforma Agrária. Foto: Wellington Lenon MST-PR.

Após 27 anos do Massacre de Eldorado do Carajás, ocorrido no dia 17 de abril de 1996, tremulam mais viva do que nunca nossas bandeiras, ecoando a memória dos companheiros que tombaram na luta, e que inspiram a resistência ativa em nossos territórios.

“Fizemos a jornada de luta em vários estados do nosso país, com solidariedade, com marchas, ocupações de terra, com doações de alimentos, doações de sangue, feira, com plantio de árvores. Foi um jornada onde não só relembramos os 21 mártires do Massacre de Eldorado do Carajás, no Pará, mas trazemos viva a luta deles”, afirma Margarida.

Reforma Agrária Popular

Com a agricultura familiar camponesa sendo a principal responsável pela produção de alimentos no país, responsável por mais de 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros, é preciso sempre lembrar a necessidade de defender a pauta de uma produção feita de forma diversificada, utilizando técnicas agroecológicas e promovendo a preservação do meio ambiente.

Por isso, o MST entende que este é um momento importante de retomada da Reforma Agrária Popular na centralidade das discussões institucionais, para diminuir a fome no país. A Jornada de Lutas de Abril também foi marcada por ocupações de terra nos estados do Espírito Santo e de Pernambuco, com o objetivo de produção para garantir a segurança alimentar e a soberania do país.

Em um país com 33 milhões passando fome, toda terra pública deve estar voltada à produção de alimentos. As famílias que realizaram as ocupações não danificaram nenhuma estrutura do órgão e nenhum animal foi ameaçado. A presença das famílias Sem Terra naqueles territórios contribui para a preservação do bioma local, através da produção de alimentos saudáveis, preservação das nascentes, dos territórios e de reconstrução do solo.

Desde a posse do governo Lula, e mesmo antes, é recorrente a divulgação de material nas redes sociais e por parte da grande imprensa e de grupos que criminalizam ou hostilizam o MST. Mas hoje 450 mil famílias Sem Terra, que conquistaram a terra por meio da luta e organização dos trabalhadores rurais seguem lutando.

É importante ressaltar que a função social da terra é um princípio estabelecido na Constituição Federal brasileira de 1988, que determina que a propriedade da terra deve cumprir uma função social. Isso significa que a propriedade deve ser utilizada de forma produtiva, respeitando as normas ambientais e trabalhistas, e que a sua utilização deve beneficiar a coletividade.

E neste sentido, a Reforma Agrária Popular também tem um papel fundamental na preservação ambiental, já que as famílias assentadas têm uma forte relação com a terra e utilizam técnicas de agricultura sustentável, promovendo a conservação dos recursos naturais.

Por isso, Margarida comenta sobre os compromissos firmados pelo Governo Federal acerca de medidas para a Reforma Agrária e produção de alimentos no país. “Em Brasília, fizemos audiência com o Ministro do MDA, Paulo Teixeira, e com o presidente Nacional do Incra, César Aldrighi. Também tivemos reunião com o presidente da Conab, onde se garantiu e de imediato R$ 500 milhões para o PAA, como termo de adesão para as entidades apresentar projeto, onde os assentados e quem tiver Adap da agricultura familiar, possa acessar esse programa tão importante de combate à fome em nosso país.”

Negociações com o MDA e outros ministérios abriram importante diálogo com o Governo Lula. Foto: MST-DF

Ela também ressalta que R$ 1,8 milhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento para o PNAE e estruturação do MEC foram conquistas com os atos políticos realizados nesta Jornada. “Tivemos, por exemplo, reunião também com a Anater, com o MEC; nesta, o Ministro da Educação, Camilo Santana, se comprometeu em erradicar o analfabetismo em nosso país, com programas de escolarização e alfabetização, e ressaltamos a importância do Pronera, como um programa nacional na Reforma Agrária, pra escolarização, alfabetização, mas também para nível superior”.

Confira abaixo as atividade desenvolvidas pelos estados:

Amazônica

Na região Amazônica, a Jornada é marcada pela Brigada Nacional Oziel Alves, realizada no estado do Pará. O lançamento foi realizado no Internacional de Luta pela Reforma Agrária, 17 de abril, o Movimento Sem Terra, a curva do “S”, no Pará, local onde aconteceu o Massacre de Eldorado do Carajás. A brigada leva o nome do jovem e militante Oziel Alves Pereira, um dos 21 mortos Se Terra assassinados no Massacre.

Mística das castanheiras, monumento em homenagem aos mártires de Eldorado do Carajás no local do Massacre. Foto: Mariana Castro

Ainda no estado do Pará, foi realizada VII Feira da Reforma Agrária Popular “Mamede Gomes de Oliveira”. No estado também houve audiência pública sobre a pauta da Reforma Agrária e atividade de Plantio de Árvores, além do lançamento de uma Liga Antifascista de futebol Ulisses Manaças.

No Tocantins, a Jornada foi marcada pela denúncia de violência contra a liderança da Articulação Camponesa no estado. Em nota, Movimento repudiou o espancamento e ameaça de morte por pistoleiros contra Valdinez dos Santos; fato que ocorreu em 17 de abril, no marco dos 27 anos do Massacre de Eldorado do Carajás. Durante a Jornada de Lutas, o MST e diversos movimentos populares se reuniram com o Secretário de Cidadania e Justiça do Governo do Tocantins.

No Maranhão, também houve manifestação na sede estadual do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Nordeste

No Ceará, trabalhadores Sem Terra realizam protesto na frente do Incra. Em manifestação realizaram na segunda (17), as famílias do MST cobram a reestruturação do Incra, com desapropriações, infraestrutura até a retomada do Pronera.

Cerca de 300 militantes de diversas regiões do Rio Grande do Norte realizaram na segunda-feira (17), uma caminhada até o INCRA. Na terça, houve uma audiência da direção do MST no RN com o superintendente do Incra, Lucenilson Ângelo e demais da equipe, sobre a desapropriação de terras para as famílias acampadas, como também o cadastramento e acompanhamento das famílias assentadas.

Em Pernambuco, o Movimento Sem Terra realizou nove ocupações. Sete delas ocorreram no dia anterior ao começo da Jornada, mobilizando cerca de 2.280 famílias em todo o estado. As áreas reivindicadas para Reforma Agrária no estado estão localizadas nos municípios de Timbaúba, Jaboatão dos Guararapes, Tacaimbó, Caruaru, Glória do Goitá, Goiânia e Petrolina. Já nesta segunda (17), houve a nona ocupação no estado, com a ocupação da Fazenda Santa Maria, em Sanharó, com 370 famílias.

Em Alagoas, movimentos ocuparam no a sede estadual do INCRA para exigir a exoneração do superintendente. No dia 17, houve uma ação de plantio de árvores, visando a denuncia sobre a degradação ambiental provocada pelo agronegócio, que vem ameaçando os biomas brasileiros. No dia 18, representantes de diferentes movimentos do campo de Alagoas foram até Brasília realizar uma agenda de negociações com Ministro Paulo Teixeira, do Ministério do Desenvolvimento Agrário.

Plantio no 17 de abril pelo MST AL. Foto: Mykesio Max

A Jornada de Lutas na Bahia foi marcada pela doação de sete toneladas de alimentos ao programa Bahia Sem Fome, no dia 17, além de um ato político realizado na Assembleia Legislativa da Bahia – ALBA, com produtos dos assentamentos e acampamentos do estado e também um café agroecológico. A atividade contou com a participação de cerca de 400 militantes do MST, além de parlamentares, secretarias do governo, representantes de movimentos populares e outras amigas e amigos do MST. A Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto realizou, nesta segunda (17), o plantio de 21 árvores como parte da Jornada.

Cerca de 700 Sem Terra marcharam entre os dias 16 e 17 de abril do distrito de Mata Redonda, município de Alhandra, até a sede do INCRA, na capital do estado da Paraíba. Ao todo, foram 41 km percorridos entre asfalto, rodovias, avenidas e ruas, colorindo o caminho com as cores e símbolos do MST.

Houve ainda manifestação na sede estadual do INCRA de Sergipe, no dia 17, além de uma ação de solidariedade com um mutirão de doações de sangue.

Centro-Oeste

No Mato Grosso, cerca de 100 trabalhadores e trabalhadoras Sem Terra acamparam na sede estadual do INCRA. Também houve no estado uma ação de solidariedade de alimentos da agricultura familiar camponesa, com doação de 800 kg de alimentos produzidos nos assentamentos e acampamentos das regiões do MT. Os alimentos foram doados para trabalhadores e trabalhadoras terceirizados/as do INCRA/MT, Ministério Público Estadual e para famílias do bairro Jardim Eldorado. No total, mais de 150 famílias receberam alimentos da Reforma Agrária.

No Distrito Federal, a ação política ficou por conta da abertura nacional da 10ª Jornada Universitária por Reforma Agrária, realizada nesta segunda (17), no campus Planaltina, com mística e mesa de abertura transmitidas ao vivo pela TV UnB. Com o lema “Reforma Agrária Popular: Em Defesa da Natureza e de Alimentos Saudáveis!”, a JURA comemora 10 anos de experiências.

Sudeste

Em São Paulo, as ações se concentraram em torno do Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis. Neste 17 de Abril, os agricultores e agricultoras do assentamento Conquista, em Tremembé, realizaram o plantio em uma unidade demonstrativa de Agroecologia. Foram plantados o ipê rosa, importante espécie para a recuperação de solo degradado. Em Ribeirão Preto, 21 mudas de árvores são plantadas pelo MST Ribeirão Preto no Centro de Formação Sócio-Agrícola Dom Hélder Câmara.

No Rio de Janeiro, cerca de 200 Sem Terra realizaram uma marcha no centro da cidade, da Igreja da Candelária até o prédio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e acompanharam a posse da nova superintendente do Incra no estado, Maria Lúcia Pontes, no dia 18 de abril. Também no dia 17 foi realizada uma manifestação na sede estadual do INCRA em Belo Horizonte, Minas Gerais.

Sem Terra em manifestação em frente ao Incra em Belo Horizonte. Fotos: Maria José

Mais de 200 famílias do MST ocuparam área do governo do Estado no Espírito Santo. A área, hoje monocultura de eucalipto, vem sendo grilada há mais de três décadas, nos municípios de Serra, Aracruz, Linhares, São Mateus e Conceição da Barra, chegando no total de mais de 11 mil hectares. Essas áreas podem assentar mais de mil famílias e a empresa, denunciada também por entidades ambientalistas, é responsável por expandir suas plantações industriais de eucalipto no Brasil sobre florestas e populações que dependem das florestas.

Sul

O MST no Paraná doou 30 toneladas de alimentos a comunidades de Curitiba e Região Metropolitana. Na terça-feira (18), famílias realizaram uma audiência de negociação em conjunto com a presença de autoridades do governo federal, estadual e municipal, para apresentação da pauta de reivindicações. A programação contou com o Seminário “Monumento Antonio Tavares: diálogos sobre memória, patrimônio e direito à terra”, para debater os aspectos históricos, arquitetônicos, culturais e simbólicos que envolvem o Monumento Antonio Tavares. Na quarta-feira (19), aos pés do Monumento Antônio Tavares, localizado às margens da BR-277, na altura do KM 108, o MST e organizações sociais rememoraram a luta pela Reforma Agrária no estado e os trabalhadores mortos pela violência de governos autoritários.

Ocupação do INCRA no Rio Grande do Sul. Foto: Maiara Rauber

No Rio Grande do Sul, as famílias Sem Terra realizaram manifestação e apresentaram diversas pautas e demandas no dia 17. No dia seguinte, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra retomou o diálogo com o então superintendente substituto Vitor Py Machado do INCRA, em Porto Alegre.

No dia 17, Santa Catarina também fez manifestação na sede estadual do INCRA e, na terça (18), a emória dos mortos foi revivida por meio do Plantio de Árvores em Florianópolis/SC. O local trata-se de uma área pública, que a prefeitura já tentou direcionar para a especulação imobiliária, mas que hoje comportam as 513 árvores plantadas pelo Movimento, doadas pela Apremavi.


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*Editado por Solange Engelmann